Nem a tentativa de piscar o olho à esquerda feita por Carlos Moedas no dia um da nova vida em Lisboa chega para convencer o Bloco a sentar-se à mesa. Esta tarde, na sede nacional do partido, Catarina Martins lamentou uma das “más notícias” da noite eleitoral: “o facto de a direita ter ganho a Câmara de Lisboa”. E se na noite eleitoral já tinha sido taxativa, no momento em que se começava a desenhar a vitória da coligação do PSD e do CDS em Lisboa, agora foi só repetir. “Em relação a Lisboa, o Bloco já tinha afirmado que não faz coligações com a direita.”
A líder do partido estava ali também para agradecer as poucas vitórias do partido nestas autárquicas. Em Lisboa, os bloquistas conseguiram segurar um vereador, resultado que traziam da última eleição, com a cabeça de lista Beatriz Gomes Dias a ocupar esse espaço. É uma autarquia onde a esquerda, apesar da maioria de votos, perde a liderança, facto a que “não será indiferente”, considera Catarina Martins, “os problemas próprios do PS em Lisboa nos últimos meses”, mas também a “instrumentalização de fundos e políticas públicas da campanha nacional” feita por António Costa, que deu em “resultados opostos aos que o PS esperava”.
O Bloco de Esquerda até manteve os lugares nas duas cidades mais importantes em que estava no executivo camarário: além de Lisboa, Almada. Mais do que isso, conseguiu pela primeira vez em 22 anos de existência ficar com um assento no Porto e desequilibrar as contas de Rui Moreira, que perdeu maioria e já sabe, como Carlos Moedas, que não pode contar com o BE. “Rui Moreira vai finalmente ter oposição no Porto, que já estava a faltar há muito tempo”, insistiu Catarina Martins, como fez ao longo de toda a semana de campanha no norte do país.
Em Almada, a música é outra. Inês de Medeiros segurou a autarquia para o PS, saiu reforçada, e “tem agora de escolher”, avisa o Bloco. Ou repete a coligação de bloco central de há quatro anos ou aceita coligar-se à esquerda. Da rua da Palma os braços estão abertos. “O Bloco terá a disponibilidade que sempre disse que teria. A eleição da Joana Mortágua é a possibilidade de um fio à esquerda para a câmara de Almada.”
Chega vs Bloco? É a prova “da radicalização da direita”
Seja pelas vitórias à esquerda, seja pelas da direita, a justificação que o Bloco encontra para um resultado que lhe deu menos mandatos e menos votos é a “muita polarização” em alguns concelhos. “Naqueles concelhos em que foi possível explicar o que o Bloco de Esquerda queria, nomeadamente no Porto (...) ou em Almada, que determinaria o rumo do concelho, foi possível manter a vereação. Noutros concelhos, em que havia muita polarização, houve movimentos independentes que saíram de partidos que estavam na câmara, em disputas intensas, e nesses cenários o BE não conseguiu eleger”, lamentou a coordenadora do partido.
Na leitura dos bloquistas, que passaram de 12 vereadores para quatro, o “mau resultado” não belisca o partido a nível nacional. Não só porque é habitual o Bloco ter diferenças significativas entre eleições locais e nacionais como porque a nova distribuição em nada muda a “exigência” com que o partido vai para a negociação do Orçamento do Estado.
Faltava apenas falar sobre o Chega, que na primeira corrida autárquica superou largamente o Bloco em número de vereadores, mas também no total de votos a nível nacional. Aliás, mesmo que tivesse mantido o resultado de 2017, o Bloco ficaria atrás do partido de André Ventura. Para a líder bloquista, esse é apenas mais um sinal da “radicalização da direita”, porque os votos no Chega não foram roubados ao Bloco, mas ao PSD. “O Chega cresceu onde o PSD tem resultados mais fracos”, justificou Catarina Martins, acrescentando ainda que o Chega teve a “capacidade de cooptar algum voto que estava organizado em concelhias que já tinham implantação autárquica”, exemplificando com o Seixal, onde o Chega ganhou um vereador e o Bloco perdeu o que tinha.
A mesa nacional do partido reúne no próximo sábado para fazer uma análise aos resultados da noite eleitoral.
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