A greve decretada pelo Sindicato Ferroviário da Revisão e Comercial Itinerante (SFRCI), que entrou esta sexta-feira numa nova fase com a previsão de perturbações significativas na circulação de comboios até 6 de agosto, gerou esta manhã supressões e atrasos na circulação de comboios na região de Lisboa. E a circulação do Metro de Lisboa na linha Verde, que liga as estações do Cais do Sodré a Telheiras, esteve interrompida devido a problemas de sinalização.
Num aviso publicado pelo Metro de Lisboa na sua página da Internet, que se manteve até por volta das 10h30, podia ler-se que “devido a avaria na sinalização, a circulação está interrompida. De momento, não é possível prever a duração da interrupção”. Posteriormente o aviso era de que “existem perturbações na circulação. O tempo de espera pode ser superior ao normal”, que era comum também à linha Azul, que liga a estação de Santa Apolónia à estação da Reboleira, na Amadora.
A conjugação das perturbações nestes dois meios de transporte gerou grandes filas para os autocarros da Carris no Cais do Sodré, assim como para os táxis e para os carros das plataformas Uber e Bolt, cujos motoristas eram intimados por um elemento da Polícia Municipal a não se acumularem junto às paragens dos autocarros.
A 10 dias da Jornada Mundial da Juventude, os problemas verificados esta manhã eram vistos como uma antecâmara do que se espera para o evento católico que trará o Papa Francisco a Portugal. “Se isto fosse na primeira semana de agosto, não sei como seria”, comentava um dos motoristas que transportavam os muitos passageiros que se acotovelavam num dos pontos nevrálgicos da rede de transportes da cidade, pois concentra os comboios da linha de Cascais, os barcos para Cacilhas e para o Montijo, a linha Verde do Metro, vários autocarros e uma paragem de táxis.
Serviços mínimos nos comboios de 31 de julho a 6 de agosto
Sem resolução à vista, a greve dos revisores e trabalhadores de bilheteiras continua prevista até 6 de agosto. O tribunal arbitral que analisou o conflito entre a CP e o SFRCI, do qual têm resultado várias greves parciais, analisou o pedido de arbitragem obrigatória para determinação de serviços mínimos e considerou que eles fazem sentido relativamente aos comboios regionais e de longo prazo.
“Trata-se de uma greve prolongada (entre as 0h do dia 21 de julho e as 24h do dia 6 de agosto de 2023), por períodos diferenciados, estruturada de forma complexa e disruptiva (do ponto de vista organizacional) com impacto na circulação de comboios. A greve decretada terá, previsivelmente, um elevado impacto de desestabilização organizativa”, lê-se na decisão com a data de 18 de julho.
“Os seus efeitos ultrapassam os resultantes de uma greve parcial no que respeita aos comboios de longo curso e aos regionais, não tendo, todavia, mesmo impacto na circulação de comboios urbanos”, explica o tribunal arbitral. “O facto de não haver greves noutros meios de transporte durante o mesmo período reduz o impacto desta greve nas necessidades sociais impreteríveis da população que tem de se deslocar. Tal circunstância associada à natureza parcial da greve torna desproporcional a fixação de serviços mínimos no que respeita à circulação de composições urbanas. Todavia, no que respeita aos comboios de longo curso e regionais, o impacto da greve na liberdade de circulação carece de uma ponderação mais detalhada”.
O tribunal arbitral lembra que “entre o período de 1 a 6 de agosto vai ocorrer, em Lisboa, a Jornada Mundial da Juventude. Neste contexto, estima-se a afluência de um número verdadeiramente excecional de pessoas, o que coloca sob enorme pressão a rede de transportes com constrangimentos muito significativos. Tal circunstância extraordinária leva a que esta greve seja suscetível de afetar necessidades sociais impreteríveis da população no que respeita ao seu direito de deslocação, direito fundamental de todos os cidadãos, nos termos do art. 44.º da Constituição da República Portuguesa, assim como outros direitos relacionados”, como à saúde ou ao trabalho.
“Justifica-se por isso a fixação de serviços mínimos que salvaguardem tais necessidades sociais impreteríveis, em respeito dos princípios da necessidade, da adequação e da proporcionalidade”, diz o tribunal arbitral. E eles serão aplicados aos comboios regionais e de longo curso.
Tribunal diz que proposta da CP é “desproporcional”
A CP apresentou uma proposta de serviços mínimos “que fixa o número de composições a circular para os comboios regionais e de longo curso em 50% na primeira semana, em 100% na segunda semana para os de longo curso e em 80% para os regionais no mesmo período”. O tribunal arbitral diz que “a proposta de serviços mínimos da empresa é manifestamente desproporcional, pois corresponderia, na segunda semana, nas composições de longo curso e regionais, a um esvaziamento do direito de greve não autorizado pela Constituição”.
Nesse sentido “entre 31 de julho (data em que a movimentação de pessoas no contexto da JMJ se prevê aumentar de forma exponencial) e 6 de agosto, a circulação de 50% das composições de longo curso e 35% das composições regionais será suficiente para assegurar as necessidades sociais impreteríveis ligadas ao direito de deslocação e direitos relacionados, sem afetar o núcleo essencial do direito à greve ou restringir o mesmo para além do necessário à salvaguarda das necessidades sociais impreteríveis. A concretização de tal percentagem deve ser efetuada pela empresa, tendo por parâmetros as condições de segurança dos utentes e as previsões de maior afluência ao transporte ferroviário”, determina o tribunal arbitral.