Transportes

Secretário de Estado das Finanças recusa ideia de que TAP tenha capital a mais para favorecer venda a privados

Secretário de Estado das Finanças recusa ideia de que TAP tenha capital a mais para favorecer venda a privados
Antonio Pedro Ferreira

João Nuno Mendes, considera que os números da TAP mostram que a companhia não foi sobrecapitalizada com os 3,2 mil milhões de euros dos contribuintes. Secretário de Estado do Tesouro assegura que não houve qualquer intenção de ir contra os acionistas privados quando o Governo decidiu avançar para ajuda de emergência, que acabaria por levar ao plano de reestruturação

O secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, rejeita a ideia, sugerida pelo deputado do PCP Bruno Dias, de que a TAP tenha sido capitalizada em excesso para que venha a favorecer o privado que vier a adquiri-la.

“Não julgo que a empresa esteja a ser sobrecapitalizada. Foi o suficiente para ser uma empresa sustentável. Não de opção política sobre a sua privatização”, respondeu o governante, que desde 2020 está no Ministério das Finanças, na sua audição desta sexta-feira, 2 de junho, na Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à TAP. João Nuno Mendes é também coordenador do grupo que liderou as negociações com a Comissão Europeia de ajuda de emergência de Estado à companhia.

Segundo explicou o governante, a dívida líquida atual da TAP encontra-se nos 2,8 mil milhões de euros, com o resultado operacional (EBITDA, resultado antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) a rondar os 700 milhões de euros. “Já começa a ser uma estrutura financeira mais razoável” do que a anterior à pandemia, frisou João Nuno Mendes.

Após a injeção dos 3,2 mil milhões de euros dos contribuintes, os capitais próprios – a diferença entre o ativo, o que detém, e o passivo, o que deve, – fixaram-se em cerca de 400 milhões de euros. “Isto demonstra que não há uma sobrecapitalização”, defendeu João Nuno Mendes.

“O objetivo da Comissão Europeia na negociação era precisamente para que essa sobrecapitalização não acontecesse, mas que conseguisse resistir”, disse João Nuno Mendes, lembrando que “durante dez anos não se pode colocar mais um euro em matérias de ajudas do Estado” na companhia aérea.

Para João Nuno Mendes, a capitalização serviu apenas para dar sustentabilidade à empresa, já fragilizada e que precisou de apoio para enfrentar o “abalo” da pandemia, e não engordá-la para uma futura venda, segundo respondeu ao deputado do PCP Bruno Dias.

Reestruturação inevitável

Antigo presidente da Águas de Portugal, João Nuno Mendes subiu a secretário de Estado do Tesouro em junho de 2020, quando João Leão substituiu Mário Centeno como ministro das Finanças. Mas no mês anterior esteve a trabalhar já sobre o assunto TAP, integrando o grupo de trabalho para encontrar uma solução para as ajudas de Estado à companhia aérea, que, como referido pelo governante, tinha já uma situação financeira desequilibrada, devido ao excessivo endividamento, e precisava de ajuda para evitar “um cataclismo” devido à covid-19.

A ajuda seria um auxílio de emergência, para seis meses, que, não sendo reembolsado, obrigaria depois a um plano de reestruturação. Havia a “convicção” de que “o plano de reestruturação era inevitável” devido à “escassa base de capital da empresa”.

Quando integrou o Governo, João Nuno Mendes ficou como secretário de Estado das Finanças, pelo que aí não ficou com a tutela da TAP (que estava no Tesouro, com Miguel Cruz, ouvido na terça-feira na CPI). Nuno Mendes depois voltou a ter, durante oito meses, a tutela da TAP quando acumulou as Finanças e o Tesouro, já com Fernando Medina.

Estado “agiu de boa fé” quando avançou para o plano de reestruturação


João Nuno Mendes assegura que não houve qualquer intenção de ir contra os acionistas privados por parte do Governo quando decidiu avançar com o empréstimo de emergência inicial de 1,2 mil milhões de euros, que acabaria por levar ao plano de reestruturação, e por fim à diluição da participação de David Neeleman e Humberto Pedrosa.

O sentimento generalizado era que seria necessário avançar para o plano de reestruturação, afirma João Nuno Mendes, coordenador do grupo de trabalho que estava a preparar a ajuda de Estado ao TAP. E explica porquê: "Acreditamos que as ajudas Covid representariam um valor mais baixo do que seria necessário".

A "escala de alavancagem da TAP era tal", afirma, que "não era compatível com as ajudas Covid", cujo valor era mais reduzido. A TAP, recorde-se, foi a única companhia aérea europeia cujas ajudas de Estado foram dadas ao abrigo agressivo plano de reestruturação e resgate.

Admite, porém, que a Direção Geral da Concorrência Europeia (DGComp) nunca recusou a modalidade de apoio ao abrigo das ajudas Covid.

Ao deputado do Bloco de Esquerda, Pedro Filipe Soares, que insistiu com João Nuno Mendes para que esclarecesse se os privados concordaram com o modelo de ajuda escolhido, o secretário de Estado afirmou que se tornou claro que uma ajuda de emergência era "o mais rápido", a TAP estava com problemas de tesouraria, e era preciso arranjar dinheiro com urgência.

"Não faço um trabalho com uma pré-encomenda"

"Os privados não que tem de aderir ao que o Estado propõe", afirma João Nuno Mendes, esclarecendo que a proposta do Estado "foi feita de boa fé", em acordo com a TAP e a opção foi "feita por acreditar que era aquele o caminho".

"O Estado não pode ficar refém [dos interesse dos privados", defendeu ainda. E frisou: "Sinto-me inteiramente confortável com as decisões que foram tomadas".

Pedro Filipe Soares insiste na questão de saber qual foi a adesão dos privados ao modelo da ajuda negociado com Bruxelas, e se isso não levaria inevitavelmente à nacionalização da companhia. "Eu não faço um trabalho com uma pré-encomenda", reage João Nuno Mendes. E explica: "A necessidade de um plano de reestruturação [dada a dimensão da ajuda precisa] está demonstrada... Nunca houve nenhuma pressão do primeiro-ministro, do ministro das Finanças ou do ministro das Infraestruturas para avançar para um plano de reestruturação". Foram as circunstâncias que determinaram o acesso ao plano de emergência", frisou. E acrescentou. "Havia uma urgência porque a tesouraria da TAP estava a acabar."

"Ficou claro que os acionistas privados não estavam disponíveis para acompanhar qualquer esforço do Estado", acabou por responder.

"Tínhamos crescentemente a certeza que o plano de reestruturação era inevitável pela escala da necessidade de capital e a dimensão dos capitais próprios negativos na TAP SGSP", frisou. E disse que ficou com a convicção que o plano de reestruturação era "a única" forma de salvar a TAP.

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