Sistema financeiro

Dois bancos da Califórnia bateram as asas e provocaram uma tempestade nas ações da banca do outro lado do mundo

Dois bancos da Califórnia bateram as asas e provocaram uma tempestade nas ações da banca do outro lado do mundo
Milos Bicanski/Getty

As ações dos bancos europeus estão a negociar em forte queda esta sexta-feira. E porquê? Dois bancos da Califórnia, um pequeno o outro nem por isso, estão com problemas

Dois bancos norte-americanos que forneciam serviços para empresas tecnológicas, o Silvergate Capital e o Silicon Valley Bank, estão em maus lençóis. O primeiro anunciou a sua liquidação depois de pressão dos reguladores para descontinuar o serviço de corretagem de criptoativos, o seu principal negócio. O segundo é um banco especializado em crédito e operações de capital de risco a empresas do setor tecnológico sediadas no vale epónimo de São Francisco.

Mas aquilo que à primeira vista parece ser um problema exclusivo do sistema financeiro norte-americano está a provocar na manhã desta sexta-feira, 10 de março, enormes quedas nas ações bancárias europeias.

Nem o BCP, a única cotada do setor que restou no principal índice português, o PSI, afundava-se quase 4%. Todos os bancos cotados no subíndice Stoxx Banks, que segue as 21 maiores financeiras europeias, negociavam em queda, com “pesos-pesados” como o Deutsche Bank, Société Générale, e Santander a darem trambolhões de 7,3%, 4,8% e 4,7%, respetivamente.

O que sucedeu com o Silvergate Bank está enquadrado na crise do setor dos criptoativos depois de um ano de 2022 marcado por desvalorizações pronunciadas e por falências de empresas emblemáticas do setor. O banco, fundado em 1988, entrou em força no mercado dos criptoativos em 2013 ao começar um serviço de corretagem que permitia a grandes clientes comprar e vender ativos digitais como Bitcoin.

Em 2022, a perda acelerada de valor de criptoativos, e a diminuição dos volumes transacionados, fez com que se começasse a temer pela qualidade do balanço do banco e pela capacidade de gerar receitas. O colapso da corretora FTX em novembro selou o destino do Silvergate: depósitos começaram a voar: no último trimestre de 2022 foram retirados 8 mil milhões de dólares (7,6 mil milhões de euros) em depósitos. A situação de liquidez do banco ficou seriamente comprometida.

No dia 2 de março, o banco anunciou que teve de vender obrigações que detinha como reservas de capital com perdas para garantir liquidez imediata para o pagamento de dívidas, e solicitou o adiamento da data de apresentação dos resultados, alegando dificuldades operacionais e manifestando dúvidas sobre a viabilidade do negócio, segundo a Reuters.

Na quarta-feira, 8 de março, o banco anunciou que iria fechar e pagar o que devia aos depositantes. O setor “cripto”, que dependia em grande parte dos serviços financeiros deste banco, tinha perdido uma das entidades que garantia um serviço essencial de “ponte” entre a finança tradicional e criptográfica. No último trimestre do ano, o Silvergate reportou mil milhões de dólares em prejuízo.

Entretanto, outro banco da região veio juntar-se ao ramalhete - e este dedicado a outro setor que está a passar por uma crise inédita, o da tecnologia. Dados da Reserva Federal dos Estados Unidos punham o Silicon Valley Bank, no final de 2022, como o 16.º maior banco dos Estados Unidos em montante total de ativos consolidados, com 209 mil milhões de dólares (198 mil milhões de euros). Grande parte das empresas tecnológicas norte-americanas - que têm sido fortemente penalizadas em bolsa desde 2022 e que, ante a queda da rendibilidade, têm despedido milhares de trabalhadores - recorre e depende dos serviços deste banco, também financiador de empresas em fase inicial, de maior risco de crédito.

Na quarta-feira, o banco anunciou que precisaria de efetuar um aumento de capital de 1,75 mil milhões de dólares (1,66 mil milhões de euros), segundo a Reuters. O banco vendeu obrigações soberanas norte-americanas com uma rendibilidade muito abaixo da que hoje é paga pelo tesouro dos Estados Unidos; e ficou com um “buraco” no balanço de 1,8 mil milhões de dólares (1,7 mil milhões de euros) que esperava colmatar com esta emissão de novas ações. As ações afundaram desde então. Na quinta-feira, a queda das ações do banco superou os 60%, com notícias a darem conta de que personalidades influentes como o magnata Peter Thiel, fundador do Pay Pal e da sociedade de capital de risco Founders Fund, aconselharam empresas a retirarem os seus fundos do banco.

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