Impostos

Governo quer que o Fisco comece a cobrar IMI às barragens já este ano

Barragem de Miranda. Foto: Movhera
Barragem de Miranda. Foto: Movhera

Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais já assinou despacho que ordena à AT que avalie as hidroelétricas e lhes cobre IMI, decisão que também pode levar à cobrança de outros impostos na venda das barragens da EDP à Engie

O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Santos Félix, instruiu a Autoridade Tributária (AT) para avançar com uma reavaliação das barragens de forma a poder, ainda este ano, iniciar a cobrança de IMI - Imposto Municipal sobre Imóveis, de acordo com um despacho daquele governante assinado esta sexta-feira.

O despacho já foi enviado à AT e partilhado com os municípios do Alto Douro que fizeram um requerimento ao secretário de Estado dos Assuntos Fiscais sobre o enquadramento tributário dos aproveitamentos hidroelétricos em sede de IMI.

No despacho, a que o Expresso teve acesso, Nuno Santos Félix determina que “a avaliação, a inscrição e a atualização matriciais das construções respeitantes aos aproveitamentos hidroelétricos […] seja efetuada com base na natureza jurídico-patrimonial resultante do entendimento que consta do parecer número 126/2005, de 11 de maio de 2006, do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República (PGR)”.

Na prática, o governante ordenou à AT que adote um entendimento que a PGR seguiu em 2006 para lidar com a polémica questão da tributação das barragens: vários municípios reclamam há muito o direito a poder receber imposto das empresas que exploram as centrais hidroelétricas. A AT chegou a tentar cobrar IMI à EDP, mas a elétrica contestou, levou o caso para arbitragem… e levou a melhor.

Em 2016, após uma sentença em sentido contrário do Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD), envolvendo a EDP, e um parecer da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), dizendo que as barragens são bens do domínio público, o Fisco mudou de posição e resolveu passar a assumir que estes imóveis não estão sujeitos a imposto.

Entretanto, a par com esse diferendo, a AT teve vários litígios com empresas de energias renováveis, pela cobrança de IMI sobre parques eólicos. As disputas acabaram com o entendimento de os parques eólicos eram sujeitos a IMI, mas o imposto só era calculado sobre o valor da infraestrutura de betão em que as torres assentam, ficando os equipamentos (aerogerador e pás), que são as componentes mais valiosas, isentos.

Em 2020 a EDP viria a vender seis barragens no Douro a um consórcio liderado pela Engie, por 2,2 mil milhões de euros. O Movimento Cultural da Terra de Miranda insurgiu-se contra a forma como a EDP estruturou o negócio, classificando-a como um artifício para escapar ao pagamento de impostos nessa transação.

Desde essa altura que se intensificou a pressão sobre a AT, não só por parte daquele movimento, mas também por alguns dos partidos da oposição (incluindo o Bloco de Esquerda e o PSD), no sentido de sujeitar o negócio de 2,2 mil milhões de euros ao pagamento de impostos que possam levar à arrecadação de receitas para os municípios onde se situam as barragens.

A AT tem estado a analisar este caso, que entretanto se tornou objeto de uma investigação do Ministério Público, por suspeitas da prática de um crime de fraude fiscal.

A falta de resultados levou o município de Miranda do Douro a ameaçar avançar para tribunal contra a AT e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA), considerando que as suas ações prejudicaram o interesse público.

O Governo acabou, no corrente mês de janeiro, por decidir emitir o despacho agora aprovado, que obrigará a AT a reavaliar os edifícios das barragens, no sentido de vir a cobrar IMI (não só às da EDP, mas também às que a Engie, através da participada Movhera, adquiriu, bem como outros produtores, em que se incluirá a Iberdrola, com o complexo do Tâmega).

O despacho agora assinado por Nuno Santos Félix determina que a AT deve requerer à APA as informações sobre as partes edificadas das centrais hidroelétricas. E determina também que caso subsistam dúvidas elas “devem ser informadas superiormente, tendo em vista eventual pedido de clarificação ao Conselho Consultivo da PGR”.

Mas esse esclarecimento será feito sem prejuízo de se acautelar a avaliação e atualização dos prédios e “a liquidação dos impostos correspondentes, que decorram da qualificação jurídico-patrimonial daquele parecer [da PGR], conquanto se verifique o risco de caducidade ou de prescrição do correspondente crédito tributário”.

A redação do despacho tem implícita a ordem para que a AT não deixe caducar o direito à cobrança de IMI às barragens em nenhum dos anos que ainda são passíveis de cobrança: 2019, 2020, 2021 e 2022.

O despacho também dará respaldo à AT para exigir o pagamento de outros impostos, como IMT e Selo, em relação ao negócio de venda das barragens no Douro, embora neste caso seja o comprador, a Movhera, que terá de arcar com as obrigações tributárias.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: mprado@expresso.impresa.pt

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