Turismo

Hotéis temem redução de voos para Portugal este ano, lembrando que “o aeroporto de Lisboa recusou no ano passado 1,3 milhões de passageiros"

Hotéis temem redução de voos para Portugal este ano, lembrando que “o aeroporto de Lisboa recusou no ano passado 1,3 milhões de passageiros"
José Peleteiro/Hoti

O principal alerta vem dos Açores, onde a Ryanair cortou os voos semanais de 14 para 2, com impacto direto na queda de 25% nas taxas de ocupação no final do ano, ameaçando a transportadora avançar com reduções no Algarve ou na Madeira devido ao aumento das taxas aeroportuárias

A redução de voos para Portugal já se tornou uma das principais preocupações dos hotéis para este ano, ultrapassando os habituais receios associados à falta de mão-de-obra ou aos efeitos da inflação, de acordo com o mais recente inquérito da Associação da Hotelaria de Portugal (AHP), cujo objetivo foi o de apurar os resultados de 2023 e perspetivas para o corrente ano.

A “instabilidade geopolítica”, com as guerras que se vivem no mundo, passou a ser o principal constrangimento do ano apontado pelos hotéis em Portugal, que mostram ter perspetivas mais arrefecidas para o crescimento do turismo face a 2023.

Mais de 90% dos hoteleiros dos Açores apontaram a questão da redução de voos como um dos principais receios para este ano, a par de mais de 70% na Madeira e de 58% no Algarve.

“Os Açores ‘afundaram-se’ no final do ano, passando as taxas de ocupação de 51% para 27%, o que foi uma queda brutal, à qual não foi alheia a redução da Ryanair de 14 para 2 voos por semana, e em consequência disso, por exemplo, o mercado francês parou na região”, destaca Cristina Siza Vieira, vice-presidente executiva da AHP.

A “preocupação” com a possibilidade de cortes de voos da companhia aérea estende-se aos hoteleiros da Madeira e do Algarve, “com a própria Ryanair a querer dar nota do aumento das taxas aeroportuárias” e das alterações que isso poderá trazer à sua operação, frisa ainda a responsável da AHP - lembrando que o tema do aumento das taxas nos aeroportos nacionais é uma preocupação para 2024 assumida pelo presidente do Turismo de Portugal, Carlos Abade.

Para a AHP, o inquérito às perspetivas dos hoteleiros quanto à evolução do turismo em Portugal em 2024 trouxe “surpresas”, em particular com o “salto gigantesco” na questão da 'instabilidade geopolítica', que passou a ser vista como a principal ameaça para 78% dos associados (e lembrando que o inquérito tem por base uma amostra de 476 hotéis, de todas as regiões do país).

“Pela primeira vez, a disseminação das taxas turísticas é apontada como um fator de constrangimento para 2024”, tal como passou a ser a ‘redução de voos’ para Portugal (receio evidenciado por 49%, cerca de metade dos inquiridos), ou o facto de o país estar em período de eleições (destacado por 10% dos hoteleiros). E ao mesmo tempo, a falta de mão-de-obra no turismo, que habitualmente dominava o quadro de preocupações do sector, pura e simplemente “desapareceu” e nem foi mencionada no recente inquérito.

Aeroporto de Lisboa ‘bloqueou’ reforço de rotas para os EUA

Entre os fatores mais críticos para 2024, 36% dos hoteleiros também destacaram a ‘capacidade do aeroporto de Lisboa’. “A incapacidade de resposta do aeroporto de Lisboa a companhias que podem trazer mais passageiros e receitas é um tema de grande preocupação”, frisa Bernardo Trindade, presidente da Associação da Hotelaria de Portugal, lembrando que se trata da “principal infraestrutura aeroportuária que serve todo o país”.

“Só em 2023, o aeroporto de Lisboa recusou o equivalente a 1 milhão e 300 mil lugares de avião, por incapacidade de resposta”, realçou Bernardo Trindade, explicitando que “o reforço de rotas para os Estados Unidos, por parte da TAP ou da SATA, a par de expansão de companhias, como a Saudi Airlines ou a Qatar Airways, não puderam ter expressão para nós por o aeroporto de Lisboa não ter capacidade”.

O crescimento turístico em Portugal está a vir sobretudo do lado dos Estados Unidos, cujos turistas foram considerados um dos principais mercados para 42% dos hoteleiros (mantendo-se os ingleses na pole position, para 50% dos casos), segundo o recente inquérito da AHP.

“2023 foi um ano positivo, e 2024 também pode ser, mas nunca com os níveis de crescimento que tivemos no ano passado”, antecipa Bernardo Trindade, frisando a necessidade de adotar uma visão de “prudência, pois estamos entre duas guerras, além de termos limitações a nível aeroportuário”.

As perspetivas dos hotéis para 2024 a nível de taxas de ocupação são de um ano “pior ou igual” a 2023, em Lisboa, nos Açores ou no Norte de Portugal, enquanto por exemplo na Madeira se espera que seja “idêntico” ao ano passado, mas “melhor no último trimestre”.

Bernardo Trindade põe também a tónica no “aumento das taxas de juro, que levou a um preço do crédito mais elevado”, e estão agora “ao dobro daquilo que tínhamos no período da pandemia”, frisando ser um tema que “em período eleitoral tem de estar na agenda política”.

“A saúde financeira das empresas turísticas melhorou, mas há nuvens no horizonte para 2024”, lembra ainda Cristina Siza Vieira, enfatizando a preocupação do sector com o tema do aumento de taxas nos aeroportos nacionais, e frisando que “falar de receitas ou de resultados é muito diferente”, e carregar nos custos de um sector com um comportamento económico positivo, mas que enfrenta desafios, está longe de ser a solução.

Sobre a situação que se vive na Madeira e os impactos que pode ter para o turismo, o presidente da associação hoteleira realça que “instabilidade não rima com confiança, e algo a que a política tem de estar muito atenta são os sinais da nossa economia”.

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