A Sociedade Francisco Manuel dos Santos, holding holandesa que controla 56,1% da Jerónimo Martins (JM), dona dos supermercados Pingo Doce, submeteu à assembleia geral de acionistas da JM uma proposta para um “voto de apreço” ao conselho de administração pela forma como conduziu os negócios do grupo num ano pautado pela escalada da inflação.
Em comunicado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), a Jerónimo Martins dá conta da inclusão na assembleia geral de acionistas de 20 de abril da proposta da Sociedade Francisco Manuel dos Santos, que defende a aprovação de “um voto de apreço, reconhecimento e confiança ao Conselho de Administração e a todos e a cada um dos seus membros e, de forma especial, ao seu presidente, Pedro Soares dos Santos, pela forma como liderou a sociedade ao longo do complexo e desafiante exercício de 2022”.
Nesta proposta a maior acionista da Jerónimo Martins sublinha que o ano passado foi “desafiante a todos os níveis, em particular pelo aumento generalizado da inflação, resultante não só das medidas tomadas pelos Estados para combater o impacto da crise pandémica como também da invasão da Ucrânia pela Rússia e pelo conflito bélico subsequente”.
A proposta deste voto de apreço surge pouco mais de uma semana depois de o presidente executivo da Jerónimo Martins, Pedro Soares dos Santos, ter verbalizado duras críticas ao Governo português pelas suspeitas lançadas sobre a atuação das empresas de distribuição ao nível dos preços cobrados aos consumidores finais.
Recorde-se que Pedro Soares dos Santos afirmou que “o Estado português foi quem mais beneficiou com a inflação e quem menos fez pelas pessoas”.
“Acredito que o Governo, pressionado por toda esta contestação social que está a acontecer, procure desviar atenções e foi o que fizeram e depois utilizaram a ASAE para o espetáculo. Foi lamentável mas as pessoas estão a começar a acordar para a verdade dos factos. O discurso já começou a mudar porque as pessoas começaram a perceber que atrás disto tudo havia uma grande mentira”, declarou o gestor na conferência de imprensa de apresentação dos resultados anuais da Jerónimo Martins.
A Jerónimo Martins obteve em 2022 um lucro de 590 milhões de euros, mais 27,5% do que no ano anterior. As vendas do grupo (que detém as cadeias Pingo Doce, Recheio, Biedronka e Ara) subiram 21,5%, para 25,4 mil milhões de euros e o EBITDA (resultado antes de juros, impostos, depreciações e amortizações) avançou 17%, para 1,85 mil milhões de euros. A margem EBITDA recuou 0,3 pontos percentuais em termos homólogos, para os 7,3%.
No final do ano passado o grupo Jerónimo Martins foi um dos visados pela nova contribuição solidária sobre lucros excessivos que o Governo português aprovou, à semelhança dos restantes Estados-membros da União Europeia. Essa contribuição foi criada para arrecadar mais receita junto das empresas de distribuição e do setor petrolífero, incidindo sobre os resultados adicionais alcançados pelas empresas desses setores em relação aos ganhos médios dos quatro anos anteriores.
A 23 de março, a Jerónimo Martins estimou em 700 mil euros a contribuição sobre lucros excessivos que lhe será imposta, prometendo contestá-la judicialmente, segundo escreveu então o “Público”, citando a administradora financeira do grupo, Ana Luísa Virgínia.
Embora seja habitual as empresas cotadas levarem à votação dos acionistas votos de louvor aos administradores, a proposta agora apresentada pela dona da Jerónimo Martins é especialmente detalhada sobre o contexto em que o grupo operou (e que esteve na génese das acusações de que as empresas de distribuição estariam a aumentar as suas margens inflacionando os preços ao cliente final).
Na convocatória da assembleia geral da EDP Renováveis (que se realiza esta semana), por exemplo, o ponto sexto prevê a aprovação da gestão e atuação do conselho de administração e “ratificar a confiança depositada nos seus membros”, sem mais. Na assembleia geral da NOS (igualmente agendada para esta semana) a acionista Sonaecom propõe um voto de louvor aos membros do conselho de administração e da comissão executiva, sem outras considerações.
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