A administração local fechou 2022 com um excedente orçamental de 361 milhões de euros, superior ao que estava estimado no relatório que acompanhou a proposta de Orçamento do Estado para 2022 (OE 2022), revela a análise “Evolução Orçamental da Administração Local em 2022”, publicada esta terça-feira pelo Conselho das Finanças Públicas (CFP).
A estimativa do Governo era de um saldo de 283 milhões de euros, recorda o CFP, sinalizando que em relação ao défice apurado para 2021 verifica-se uma melhoria, “assente no contributo da receita municipal, cujo aumento mais do que compensou o crescimento da despesa”.
Numa nota prévia, o CFP deixa a ressalva de que a análise dos resultados da administração local em 2022 está “limitada pela circunstância de o CFP não dispor de informação completa e validada da prestação de contas da totalidade dos municípios portugueses”.
A situação “continua a ser motivada pelas dificuldades e atrasos vários quer na implementação do SNC-AP [Sistema de Normalização Contabilística para a Administração Pública] na administração local, quer no desenvolvimento do sistema de recolha de informação da DGAL [Direção-Geral das Autarquias Locais]”. Tais constrangimentos implicam que o relatório agora divulgado se baseie nos valores de contabilidade orçamental pública de 300 dos 308 municípios portugueses (98,7% da despesa efetiva de 2019), esclarece o CFP.
Imobiliário e turismo dão empurrão à receita
A análise para 2022 mostra que a situação orçamental das autarquias melhorou graças “ao comportamento favorável das receitas próprias”, em particular os valores obtidos com a cobrança de impostos que recaem sobre o imobiliário, a que se somam as receitas que vêm do incremento da atividade turística.
Porém, faz notar o organismo liderado por Nazaré da Costa Cabral, tal estrutura de receita acarreta dúvidas quanto à sua manutenção no tempo. “Esta recuperação encontrou-se fortemente associada ao dinamismo do mercado imobiliário e à atividade turística, o que não deixa de constituir um risco descendente para o futuro, caso ocorra uma desaceleração das transações imobiliárias e da procura turística”, sublinha o organismo.
Em 2022, a receita efetiva dos municípios registou um crescimento de 10,7% para 10.368 milhões de euros, acima do previsto no OE 2022 para o subsector local (6,8%). A receita própria (isto é, não considerando transferências) apresentou uma evolução “muito mais favorável do que o previsto naquele documento de programação orçamental”, com quase dois terços do crescimento dos proveitos a resultarem do aumento da receita fiscal.
A receita fiscal “beneficiou, sobretudo, do incremento das receitas de IMT (26,2%) muito acima do previsto no relatório do OE 2022 (1,7%), bem como da recuperação da derrama municipal (26,3%)”. No caso da receita própria não fiscal, as vendas de bens e serviços e receita proveniente de taxas aumentaram com destaque para a taxa turística que, em 2022, mais do que triplicou o montante arrecado em 2021, passando de 18 milhões de euros, em 2021, para 56 milhões de euros, “justificando mais de dois quintos do aumento destas receitas”.
“A evolução favorável da receita permitiu acomodar o crescimento de 6,6% da despesa municipal em 2022”. O crescimento nos gastos da administração local foi impulsionado pela despesa corrente primária (11,5%), uma vez que diminuiu a despesa de capital (-5,2%), nomeadamente a de investimento. No que se refere à despesa corrente primária observa-se um aumento dos encargos com a aquisição de bens e serviços (14%) e com o pessoal (10,8%). “O primeiro caso refletiu o efeito da subida da inflação em 2022. No segundo caso, as despesas com pessoal foram influenciadas pela transferência de trabalhadores ao abrigo do processo de descentralização de competências”.
O documento do CFP refere ainda que, no ano passado, o número de trabalhadores ao serviço dos municípios aumentou em quase 20 mil (para mais de 162.500), na maior parte afetos à área da educação. “Porém, a informação disponível não permite apurar o montante da despesa dos municípios resultante deste processo”, aponta o documento, sinalizando a necessidade de “uma maior transparência sobre o processo de descentralização, designadamente quanto à sua dimensão económica e financeira”.
Quanto ao investimento, nomeadamente o suportado por transferências de capital, em particular fundos europeus, os dados indicam um decréscimo de quase 5% em 2022, contrariamente ao inicialmente antecipado, quer no OE 2022, quer pelos próprios municípios, acrescenta o CFP.
Municípios devem 3,6 mil milhões de euros
“Não obstante as limitações de informação, existe evidência de que a despesa por pagar dos municípios terá diminuído em 2022, seja ao nível dos passivos não financeiros ou das contas por pagar”. No entanto, “os dados disponíveis indicam um ligeiro aumento da dívida já vencida e em atraso, situação, no entanto, restrita a um reduzido número de municípios”, é ainda mencionado.
A dívida total municipal de 300 dos 308 municípios – financeira e não financeira – considerada para efeitos do limite legal reduziu-se de 3,8 para 3,6 mil milhões de euros, revela o CFP. Com base apenas neste indicador, em 2022, pelo menos, 14 municípios estavam acima do limite da dívida total em 31 de dezembro de 2022, ou seja, menos três do que no final de 2021.
“Esta evolução traduz o decréscimo de dívida observado em 211 municípios (redução de 395 milhões de euros) que mais do que compensou o aumento reportado pelas restantes 89 autarquias (177 milhões de euros)”, resume o CFP.