O Banco Central Europeu (BCE) voltou a subir os juros esta quinta-feira. O aumento de 25 pontos-base (um quarto de ponto percentual) já tinha sido antecipado na reunião de junho e durante o Fórum anual em Sintra e foi concretizado apesar de alguns sinais de que o aperto monetário já está a ter efeito na zona euro.
A inflação desceu para 5,5% no mês passado e a transmissão do aperto monetário está a sentir-se na economia real, com a procura de crédito a baixar, o sector bancário a apertar os critérios do crédito e o stock de empréstimos a manter-se praticamente estagnado desde o final do ano passado.
Mas o conselho do BCE considera que a decisão de subida se justifica porque “a inflação continua a descer, mas ainda se espera que permaneça demasiado elevada durante demasiado tempo”, lê-se no comunicado oficial..
Com o aumento desta quinta-feira, a taxa diretora subiu para 4,25%, o nível mais alto desde outubro de 2008, na sequência de um ciclo que já leva 13 meses e acumulou a maior subida de sempre na história do BCE. Os juros aumentaram desde há um ano 425 pontos-base. O anterior recorde data do período inicial do BCE, com uma subida de 225 pontos-base entre novembro de 1999 e outubro de 2000.
A taxa de remuneração dos depósitos do sector bancário no BCE (na facilidade permanente de depósito) subiu de 3,5% para 3,75% e abrange atualmente 3,63 biliões de euros, mais de 50% do valor do passivo.
O conselho do BCE decidiu igualmente fixar a remuneração das reservas mínimas obrigatórias em 0% a partir de 20 de setembro. O sector bancário tem no BCE depósitos à ordem, incluindo as reservas mínimas obrigatórias, num total de 157,34 mil milhões de euros. A decisão visa “reduzir o montante global de juros a pagar por reservas”. O BCE deve deixar de pagar ao sector bancário cerca de 6 mil milhões de euros em juros por ano sobre essas reservas obrigatórias.
O BCE decidiu, também, manter a estratégia de emagrecimento do balanço que já passou pela descontinuação das compras líquidas em todos os programas e dos reinvestimentos do capital dos títulos vencidos no programa principal conhecido pela sigla APP (asset purchase programme) lançado por Mario Draghi em 2014 e 2015. Continua sem ser descontinuado o plano de reinvestimentos do programa de compra de ativos devido à emergência pandémica (pandemic emergency purchase programme – PEPP), que deverá continuar até, pelo menos, ao final de 2024.
Em linha com as subidas nas economias desenvolvidas
A decisão de aumento em um quarto de ponto percentual está em linha com a maioria das decisões de subida dos juros tomada em julho até à data. Entre as economias desenvolvidas, o Banco do Canadá e a Reserva Federal dos Estados Unidos (na decisão tomada na quarta-feira) aumentaram os juros no mesmo ritmo.
Os maiores aumentos em julho ocorreram em economias emergentes. Na Turquia, o banco central aumentou os juros pela segunda vez consecutiva. A subida foi de 250 pontos-base (2,5 pontos percentuais). Na Rússia, no quadro de uma economia de guerra que alimenta a invasão da Ucrânia, o banco central subiu a taxa em 100 pontos-base (1 ponto percentual), invertendo a trajetória de descida desde outubro de 2022.
O nível de juros do BCE é, agora, o sétimo mais elevado nas economias desenvolvidas, ficando abaixo das taxas da Fed (5,5%), Reino Unido (5%) e Canadá (5%). É, no entanto, mas elevado do que os juros da Austrália (que entrou em pausa), Suécia, Noruega e Suíça, por exemplo.
Até onde irá o ciclo de subidas na zona euro?
Continua a ser uma incógnita. A decisão para setembro não é antecipada e o BCE regressou ao padrão de sublinhar que as decisões futuras serão tomadas com base nos dados reunião a reunião. “O Conselho do BCE continuará a seguir uma abordagem dependente dos dados na determinação do nível e da duração adequados da restritividade. Mais especificamente, as suas decisões sobre as taxas de juro continuarão a basear‑se na sua avaliação das perspetivas de inflação, à luz dos dados económicos e financeiros que forem sendo disponibilizados, da dinâmica da inflação subjacente e da força da transmissão da política monetária”.
O mercado de contratos financeiros a prazo aponta para uma probabilidade de 50% de um novo aumento na próxima reunião do BCE, a 14 de setembro, mas há uma forte pressão política para que o banco central opte por uma pausa nessa altura.
Os analistas aguardam por uma melhor clarificação da estratégia por parte de Christine Lagarde na conferência de imprensa desta quinta-feira. Em setembro, os economistas do banco apresentarão uma nova projeção macroeconómica que influenciará as opções em discussão na altura.
Nos pressupostos das previsões do Fundo Monetário Internacional (FMI), apresentadas esta semana, admite-se que os juros do BCE atingirão um pico agora nesta reunião de julho e que se manterão durante um período prolongado nesse nível.
No entanto, a inflação subjacente (excluindo do índice as componentes mais voláteis) subiu em junho para 5,5%, invertendo a trajetória descendente, e a inflação nos serviços atingiu um máximo de 5,4%. Os responsáveis do sector de serviços admitem que ainda poderão aumentar os preços e o BCE projeta que os salários nominais neste sector aumentem 5,2% em 2023 e 4,5% em 2024.
O comunicado oficial sublinha: “A evolução desde a última reunião [em junho] apoia a expectativa de que a inflação descerá mais no resto do ano, mas permanecerá acima do objetivo por um período prolongado. Apesar de algumas medidas revelarem sinais de abrandamento, a inflação subjacente continua a ser, em geral, elevada. Os anteriores aumentos das taxas de juro estão a ser transmitidos de forma vigorosa: as condições de financiamento tornaram‑se novamente mais restritivas e estão a refrear cada vez mais a procura, o que constitui um importante fator para fazer a inflação regressar ao objetivo”.
As previsões do FMI e do BCE (apresentadas em junho) apontam para uma inflação média anual em 2023 ainda acima de 5% e para níveis de inflação ainda distantes da meta dos 2% em 2024.
O grosso do impacto do aperto monetário vai sentir-se em 2023 com o crescimento económico a ficar abaixo de 1%, em metade do ritmo norte-americano. Mas para 2024, as previsões do BCE e do FMI apontam para uma aceleração para 1,5%, acima da média pojetada para o conjunto das economias desenvolvidas e das previsões para os EUA, Reino Unido e Japão.