Maria Antónia Araújo, ex-chefe de gabinete do ex-ministro das Infraestruturas Pedro Nuno Santos, ouvida esta quarta-feira na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP, assegura que o valor da indemnização pago a Alexandra Reis não foi definido pelo Ministério. Explica, ainda, que o ex-ministro das Infraestruturas, Pedro Nuno Santos, a partir do dia 17 de janeiro esteve ausente do Ministério e só voltou depois das eleições de 30 de janeiro de 2022.
A antiga chefe de gabinete explicou que não só Pedro Nuno Santos não acompanhou o processo de negociações, como explicou também as informações sobre o acordo foram sendo mandadas por mensagem. “Fui eu que mandei [a mensagem], uma vez que o senhor secretário de Estado [Hugo Mendes] já o tinha tentado contactar e não estava a conseguir", explicou aos deputados.
E acrescentou: "Fiz ‘printscreen’ do email que está disponível no relatório da IGF, […] explicando que nos tinha sido transmitido que muito dificilmente seria possível baixar daquele valor, porque o valor de partida tinha sido três vezes superior e, portanto, o valor final seria aquele”. Considerou, então, que se tratava no fundo de uma “recomendação” de valor por parte de Christine Ourmières-Widener. “Estávamos de boa fé”, explicou. E afirma que não havia razões para duvidar, se não teria aceitado como bom o acordo.
Pedro Nuno Santos estava naquela altura em campanha em Aveiro, detalhou a chefe de gabinete. E defendeu, ao ser questionada pelo deputado da Iniciativa Liberal, que foi também por isso que o chairman, Manuel Beja, terá tido alguma dificuldade em falar com o ministro. Mas lembrou que Beja tinha uma boa relação com o secretário de Estado, Hugo Mendes
A amnésia do ministro
O que se passou nos 18 dias que intermedeiam a demissão do dr Pedro Nuno Santos, que não se lembra de nada sobre o acordo de saída, até se lembrar de tudo, pergunta Paulo Moniz. Maria Antónia Araújo explica que o pedido de demissão de Pedro Nuno Santos dá-se quatro dias após a notícia do Correio da Manhã, em dezembro de 2022. Foi muito rápido, não foram revisitadas as comunicações trocadas a propósito do acordo de Alexandra Reis, diz
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Confessa que participou na construção do comunicado do pedido de demissão do Ministro que classifica de "dificílimo". E explica: "Nessa altura não fizemos uma reconstituição das comunicações trocadas a esse propósito". Só mais tarde o fizeram e foi aí que Pedro Nuno Santos detetou que lhe foi comunicado a valor, afirma admitindo que ajudou o ex-ministro a fazer a “fita do tempo”.
Teve conversa com o dr Pedro Nuno Santos nos últimos 30 dias, pergunta Paulo Moniz. "Falo com ele com bastante regularidade", esclareceu. E não escondeu que falaram de todo este processo. "É um assunto que pela sua relevância é natural que tenha falado sobre ele com Pedro Nuno Santos", defende. E atira: "mas se me está a perguntar se preparei esta reunião com o Pedro Nuno Santos, digo-lhe que não".
Maria Antónia Araújo esclareceu, também, que Ministério não tinha informação sobre "o respaldo jurídico" para o valor da indemnização paga a Alexandra Reis quando deu “conforto político” à ex-presidente executiva da TAP, Christine Ourmières-Widener, para avançar com as negociações. A ex-chefe de gabinete afirma mesmo que até certa altura achava que os serviços jurídicos da TAP estavam envolvidos, só mais tarde percebeu que não.
“Nós não recebemos qualquer conclusão jurídica, nem nenhum enquadramento jurídico Não havia uma conclusão jurídica, nós não tínhamos informação sobre o respaldo jurídico daquele valor [500.000 euros]”, assegurou.
Atual chefe de gabinete do secretário de Estado das Infraestruturas, Maria Antónia Araújo pediu aos deputados da comissão que revejam um anexo do relatório da auditoria da Inspeção-Geral de Finanças (IGF) que contém um email com informações do advogado César Sá Esteves, da SRS, que negociou por parte da TAP a saída da ex-administradora Alexandra Reis. Naquele email, explicou o advogado “diz especificamente que precisa de começar a redigir o clausulado do acordo”.
Os 500 mil não foram decididos pelo Ministério
“O valor final nunca foi decidido pela tutela, o que foi dado à tutela [pela ex-presidente executiva, Christine Ourmières-Widener] foi uma recomendação [de valor de indemnização] e um pedido de conforto político adjacente, pelo facto de ser um valor muitíssimo expressivo”, salientou a chefe de gabinete. A responsável sublinhou ainda que, no processo de saída de Alexandra Reis da TAP, a tutela "teve um acompanhamento acessório e à distância".
Maria Antónia Araújo esclareceu que na reunião com a TAP, na qual participou, em 01 de fevereiro de 2022, sobre o tema da saída de Alexandra Reis - data em que soube do acordo - o tema jurídico não foi tratado. E esclarece que não pensou na questão do Estatuto do Gestor Público também porque estava convencida de que o processo estava a ser bem acompanhado pelos respetivos advogados.
Mais tarde em resposta ao deputado do PCP, Bruno Dias, a chefe de gabinete defende que os advogados seguiram o código das sociedades comerciais na saída de Alexandra Reis da TAP, e não o estatuto do gestor público, por causa do "vínculo privado" da gestora.
“Em 2022, nós não tínhamos conhecimento de qual era o enquadramento jurídico que ia ser dado àquela cessação de funções e agora sabemos, porque entretanto já houve contraditório e já houve explicações à Inspeção-Geral de Finanças, que os senhores advogados entenderam aplicar a legislação subsidiária do código das sociedades comerciais pelo facto de a engenheira Alexandra Reis ter também o vínculo privado à TAP e, nessa linha, não aplicaram o estatuto do gestor do público”, defendeu em resposta ao deputado comunista Bruno Dias.
A responsável explicava a justificação dada pela TAP em resposta ao despacho conjunto dos ministérios das Finanças e das Infraestruturas e Habitação após o conhecimento público da indemnização de meio milhão de euros à ex-administradora Alexandra Reis, que era à data secretária de Estado do Tesouro.
Porém, mais do que uma vez, sublinhou que, no início de fevereiro de 2022, a tutela não tinha informação de qual o enquadramento jurídico que ia ser dado à cessação de funções de Alexandra Reis.
O estatuto do gestor público, que abrange a TAP desde que voltou ao controlo do Estado em 2020, não permite o pagamento de indemnizações no valor da que foi paga à ex-administradora Alexandra Reis.
Da polémica indemnização de 500.000 euros, Alexandra Reis terá de devolver cerca de 214 mil euros, segundo noticiou esta quarta-feira o Correio da Manhã.
Presidente da TAP requeria conforto
A chefe de gabinete esclareceu ainda que a ex-presidente executiva da TAP “tendencialmente, pedia muito conforto e muita validação à tutela”. Mais do que a generalidade das outras cerca de duas dezenas de tuteladas pelo Ministério das Infraestruturas.
Maria Antónia Araújo reiterou ainda que a iniciativa do processo de saída de Alexandra Reis foi da ex-presidente executiva da TAP e que quem acompanhou de perto toda a negociação foram os advogados de ambas as partes.
Frisou ainda que no Ministério nunca houve indicação que a porta de entrada das informações sobre a TAP seria apenas as Infraestruturas..
Depois de ter dito que não foi informado da indemnização de 500 mil euros e após a sua demissão, Pedro Nuno Santos esclareceu, em comunicado, que ele, o então secretário de Estado Hugo Mendes e a chefe de gabinete, Maria Antónia Araújo “não tinham memória” de que sabiam da indemnização e que o ministro deu “anuência política para fechar o processo”. Uma situação que o deputado Paulo Moniz, do PSD, considera uma estranha "amnésia".
“A única informação nova, posterior à minha demissão, que senti necessidade de dar conhecimento público foi a de uma comunicação encontrada, por mim, a 19 de janeiro de 2023 da minha então chefe de Gabinete (CG) e do secretário de Estado (SE), de que nenhum dos três tinha memória, a informarem-me do valor final do acordo a que as partes tinham chegado e que não era possível reduzir mais o valor da indemnização”, informou, em 20 de janeiro.