Impacientes, frustrados e surpreendidos pela escassez da informação prestada pelo presidente da CMVM ao Parlamento, a comissão de inquérito à TAP vai pedir o levantamento do segredo de justiça no processo de contraordenação à transportadora.
Luís Laginha de Sousa, presidente da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários, invocou o dever de sigilo e o segredo de justiça, para não responder aos deputados na Comissão Parlamentar de Inquérito à TAP sobre os detalhes do processo de contraordenação levantado à companhia por prestação de informação incorreta sobre a saída de Alexandra Reis, em fevereiro de 2022. Posição que levou os parlamentares a discutir durante longos minutos como proceder, acabando por ser dada por concluída a audição ao fim de mais de quatro horas, com a deliberação de que se avançaria com um pedido de levantamento do segredo de justiça.
Ficou por esclarecer, entre outras questões, se o processo contraordenacional aberto pela CMVM contra a TAP, e que pode levar à aplicação de uma coima de dois a cinco milhões de euros, diz respeito apenas à saída da ex-administradora Alexandra Reis, ou se se estende a outros processos de renúncia. Isto porque o processo refere “renúncias de administradores”.
Depois da saída de Alexandra Reis da comissão executiva, em fevereiro de 2022, e no dia da apresentação dos resultados, a 21 de março - onde foram apresentados lucros de 65,6 milhões de euros -, houve também a renúncia da administradora para a área comercial, Sílvia Mosquera. E, durante o mandato de Christine Ourmières-Widener, renunciou também ao cargo, em outubro de 2021, o antigo administrador financeiro, João Weber Gameiro, alegando então "motivos pessoais imprevisíveis".
Cauteloso, Laginha de Sousa não chegou a explicar se a contraordenação estava a ser aplicada por prestação de informação falsa ou informação incompleta. “Estávamos à espera de ter respostas mais conclusivas e mais focadas nas perguntas que foram colocadas. Eu não estava à espera de hoje ter um problema de ter aqui alguém que viesse referir a questão da existência de sigilo” e de "limitações de respostas", afirmou Jorge Seguro Sanches, presidente da Comissão de Inquérito. Lembrando que a CPI tem poderes parajudiciais. E avançando que iria fazer o pedido de imediato.
Laginha de Sousa desculpou-se com o facto de estar pela primeira vez numa CPI, dizendo que não lhe passou pela cabeça que havia estas questões e limitações, e afirmando que queria que ficasse claro que da "parte da CMVM não havia qualquer postura de não colaboração institucional".
Depois das perguntas dos deputados e por insistência do presidente da comissão, Laginha de Sousa respondeu às questões sobre a data em que foi aberto o processo contraordenacional à TAP, explicando que a decisão foi tomada na reunião do Conselho de Administração da CMVM, de 5 de abril, onde não participou por ser detentor de obrigações da companhia.
Explicou, no entanto, que a deliberação inicial do Conselho de Administração, sobre a contraordenação, só se tornou efetiva, depois de ter passado pelo crivo dos serviços jurídicos da CMVM. Só após a confirmada a legalidade da deliberação, ela ficou então pronta para ser comunicada, e isso aconteceu na passada quarta-feira.
A opacidade sobre a privatização
Laginha de Sousa afirmou que a TAP não está obrigada a informar o mercado sobre o processo de privatização, porque é emitente de obrigações e não empresa cotada, salientando que neste momento o processo não interfere no valor dos títulos. “Não há necessidade de dar essa informação ao mercado, na medida em que ela não interfere sobre o que é relevante, e que é o valor da obrigação e a capacidade de receber a obrigação”, defendeu, em resposta ao deputado da Iniciativa Liberal, Bernardo Blanco.
Embora não haja um caderno de encargos, a TAP está neste momento a dar passos no sentido da privatização. Há uma empresa que apesar de não ter um contrato, tem estado desde há nove meses a fazer o contato com os investidores, a norte-americana Evercore. Há demonstrações de interesse, e o Eco revelou esta quinta-feira, que a IAG, grupo de aviação que detém a British Airways e a Ibéria, já contratou o escritório de advogados Vieira de Almeida para a assessorar.
“A intenção de avançar com um processo desses pode manter-se secreta dentro da empresa”, considerou o presidente da CMVM. Sabe-se que o processo estava nas mãos da presidente da TAP e do administrador financeiro, Gonçalo Pires. Mas quer as Finanças, quer as Infraestruturas têm mantido o silêncio sobre o processo.
Mais pedidos de informação
O PS apresentou um requerimento oral para pedir o extrato de submissão do comunicado à CMVM, às 23h29 de 04 de fevereiro de 2022, sobre a saída de Alexandra Reis,com a indicação da pessoa da TAP que o submeteu no sistema de difusão da entidade.
E o Chega anunciou que vai pedir que seja enviado com urgência a cópia da deliberação do Conselho de Administração da TAP que aprovou o acordo de rescisão de Alexandra Reis, que não foi enviado juntamente com os restantes documentos à CMVM, e a cópia dos pareceres do órgão de fiscalização.
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