O primeiro-ministro considera que Portugal precisa de reforçar e reorganizar as suas cadeias de valor face à atual instabilidade internacional e defende que as empresas sul-coreanas podem ser importantes parceiras, designadamente nas energias renováveis e semicondutores.
Este objetivo da política externa nacional foi transmitido à agência Lusa por António Costa antes de iniciar uma visita de dois dias à Coreia do Sul, entre terça e quarta-feira, que terá uma agenda sobretudo económica.
"A instabilidade que enfrentamos a nível global mostrou-nos que precisamos de reforçar e reorganizar as nossas cadeias de valor. Acreditamos que sul-coreanos e portugueses podem complementar-se e fortalecer-se mutuamente", declarou o líder do executivo.
António Costa chega na manhã de terça-feira a Seul acompanhado pelos ministros da Economia, António Costa Silva, da Ciência, Elvira Fortunato, das Infraestruturas, João Galamba, e do secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros, Francisco André, numa vista que será a primeira de um chefe de Governo português desde que António Guterres esteve na Coreia do Sul em 2000.
"Será importante fortalecer as nossas relações políticas. Nos tempos tão desafiantes que vivemos é importante poder contar com parceiros como a Coreia do Sul", assinalou.
No plano económico, o primeiro-ministro manifestou-se convicto de que há vários setores nacionais que podem despertar interesse às empresas sul-coreanas, caso das energias renováveis, semicondutores, matérias-primas críticas ou indústria automóvel.
"A área das energias renováveis é um domínio em que Portugal tem muita experiência e conhecimento. Há investimentos portugueses na República da Coreia e investimentos sul-coreanos em Portugal. Temos uma estratégia ambiciosa, já que prevemos investir 60 mil milhões de euros até 2030", destacou.
Na energia solar, por exemplo, segundo António Costa, Portugal pretende "aumentar significativamente a sua capacidade disponível, mais de nove gigawatts de incorporação até 2030".
"E temos planos para instalar dez gigawatts de capacidade para energia eólica offshore, cujo leilão será lançado ainda este ano. Os semicondutores são também uma área onde sentimos que Portugal tem condições para ser uma porta de entrada relevante para empresas sul-coreanas que pretendam aumentar a resiliência da cadeia de valor dos semicondutores como um todo", sustentou.
Já que no concerne à indústria automóvel, o líder do executivo português disse acreditar que as empresas coreanas "podem aproveitar a experiência de Portugal em inovação e mobilidade urbana verde".
"O hidrogénio verde também tem muito potencial, porque a proximidade da água e os custos energéticos atrativos são ativos estratégicos que estão a atrair a atenção de múltiplos investidores, que procuram produzir hidrogénio a partir da energia solar e eólica, sobretudo em Sines", defendeu.
António Costa realçou ainda que "Portugal tem as maiores reservas de lítio da Europa e a oitava maior do mundo.
"Somos o sétimo maior produtor mundial de lítio e o primeiro da Europa. Em 2023, lançaremos seis concursos públicos para prospeção de lítio e queremos fomentar o desenvolvimento de cadeias de valor integradas para matérias-primas críticas", acrescentou.
“Forte pendor económico”
A visita do primeiro-ministro à Coreia do Sul, entre terça e quarta-feira, terá, por isso, sobretudo uma dimensão económica.
O primeiro dos dois dias de visita de António Costa a Seul terá uma tarde totalmente dedicada a visitas a empresas dos ramos das energias renováveis e dos semicondutores e termina com um jantar com algumas das principais multinacionais sul-coreanas.
"É uma visita que vai ter um forte pendor económico. Há atualmente um reposicionamento bastante importante dos vários atores à escala global com a criação de novas cadeias de valor. Esta visita também vai servir para criar sinergias e, sobretudo, novas oportunidades para as empresas portuguesas num mercado tão importante e significativo à escala global como é o da República da Coreia", declara à agência Lusa o secretário dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação, Francisco André.
Na terça-feira, o primeiro-ministro terá uma reunião com o grupo Hanwha, uma das empresas vencedoras do segundo leilão solar em Portugal, no qual conseguiu seis dos doze lotes a concurso para desenvolver projetos fotovoltaicos no Alentejo e no Algarve.
Visita depois a Hynix. Esta empresa e a também sul-coreana Samsung Eletronics ocupam respetivamente o terceiro e segundo lugar no ranking mundial dos maiores fabricantes de semicondutores.
Francisco André destaca que em 2022 Portugal exportou cerca de 200 milhões de euros para a Coreia do Sul, país que regista "uma trajetória de crescimento, apesar do quadro complexo a nível internacional".
"Cresceu durante 2022 cerca de 2,6% e é um país que está a fazer, também como Portugal, a sua transição para uma economia verde e digital. A República da Coreia tem hoje já interesses relevantes no mercado português, com a presença de empresas nos setores da energia, designadamente nas energias renováveis, mas também na indústria automóvel e nas tecnologias", assinala o membro do Governo.
Na quarta-feira, logo pela manhã, em Seul, António Costa discursa num fórum de negócios Portugal/Coreia do Sul.
De acordo com Francisco André, o primeiro-ministro, além de ter reuniões com algumas empresas sul-coreanas consideradas essenciais nos setores das energias renováveis, automóvel, tecnologia e semicondutores, procurará contribuir para "aumentar os fluxos de exportação de produtos portugueses, designadamente do setor agroalimentar".
"A nossa expectativa é aumentar e aprofundar esse relacionamento económico. Por isso, encaramos de forma bastante positiva esta visita à República da Coreia, tendo em vista aprofundar a cooperação em setores fundamentais: automóvel, energias renováveis, eletrónico, biotecnológico e tecnológico. Por exemplo, no setor tecnológico, basta pensar que duas empresas coreanas fazem parte do conjunto dos três maiores produtores à escala global de semicondutores", referiu.
Em relação à atual conjuntura económica mundial, o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação procurou acentuar a relevância da inserção em novas cadeias de valor nos mercados internacionais.
"No quadro global estão a ser criadas cada vez mais novas cadeias de valor e um país como Portugal tem de se posicionar. No âmbito desta visita, importa perceber quais são as sinergias para em conjunto enfrentarmos estas alterações que se verificam à escala global e aproveitarmos essas oportunidades para os nossos agentes económicos", acrescentou.
Reforço dos laços institucionais
A parte institucional do programa de António Costa em Seul vai acontecer na quarta-feira, com destaque para a reunião com o primeiro-ministro da Coreia do Sul, Han Duck-soo, à qual se seguirá uma cerimónia de assinatura de instrumentos jurídicos.
"No âmbito desta visita iremos promover e fomentar o ensino da língua portuguesa na Coreia, através da assinatura de um protocolo para a criação de um novo leitorado na Universidade de Hankuk. Vamos também assinar um protocolo de entendimento entre o Instituto Camões e a Koica, que é a agência coreana de cooperação, para fomentar projetos conjuntos de cooperação triangular. Queremos fomentar cada vez mais projetos de desenvolvimento sustentável em países em desenvolvimento, designadamente no continente africano", realça Francisco André.
Ainda de acordo com o membro do Governo português, a visita do primeiro-ministro vai também servir também para aprofundar o relacionamento bilateral na ciência, na investigação e desenvolvimento.
"O objetivo é projetar ainda mais aquilo que já existe. Nós hoje temos doze instituições do Ensino Superior em Portugal que já trabalham com instituições coreanas. E temos já cerca de quinze projetos do programa Horizonte Europa e do programa Eureka onde há equipas conjuntas de Portugal e da Coreia", assinala.
Do ponto de vista político, o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação assinala que "a República da Coreia tem estado em sintonia com as posições portuguesas e europeias na condenação da Rússia pela invasão ilegal e injustificável da Ucrânia".
"Tem havido um grande alinhamento nessas prioridades. E, quanto à Coreia do Norte, Portugal tem sido sempre solidário" face ao executivo de Seul "no quadro das Nações Unidas", salienta o secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação.
Na quarta-feira, num ponto do programa com forte caráter simbólico, após um almoço que lhe será oferecido pelo primeiro-ministro sul-coreano, António Costa desloca-se ao cemitério nacional, em Seul, onde irá depor uma coroa de flores no Memorial da Guerra da Coreia.