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Descodificador: quem é o pai do intermediário na lei 'Uber'?

Descodificador: quem é o pai do intermediário na lei 'Uber'?

Parlamento Europeu e Comissão Europeia chegaram a um entendimento para regular as relações laborais nas plataformas digitais. Em Portugal a regulamentação continua presa na figura do “intermediário”

Já há regras para as plataformas digitais?

Estamos mais próximos disso. O Parlamento Europeu (PE) e a Comissão Europeia (CE) aprovaram, no início da semana e depois de um processo negocial que se arrastava desde março, um compromisso de entendimento que abre caminho à votação do diploma final para regular as relações de trabalho na economia das plataformas no espaço europeu. A CE apresentou em 2021 uma proposta de diretiva que não reuniu consenso na Comissão de Emprego e Assuntos Sociais do PE, onde o dossiê está em discussão. Foi agora possível fechar uma proposta que será negociada com os Governos de cada país. Em Portugal, onde o Governo está também a tentar legislar, o impasse mantém-se. A votação da proposta do Executivo, prevista para terça-feira, voltou a ser adiada, e até ao fecho desta edição permanecia sem consenso.

O que prevê a proposta europeia?

As regras que permitiram alcançar consenso entre as instituições europeias envolvidas no processo legislativo passam por garantir o combate ao falso trabalho independente, precário e sem proteção social entre os trabalhadores das plataformas digitais, assegurar a supervisão humana de tudo o que possa ter impacto nas condições de trabalho e tornar obrigatória a partilha de informação das plataformas com as autoridades nacionais. Para cumprir estes objetivos, a proposta europeia determina que é presumido o vínculo laboral do trabalhador à plataforma, cabendo à última (e não ao trabalhador) contestá-lo e provar que se trata de trabalho independente. Em paralelo, proíbe a transferência para o algoritmo de decisões críticas e obriga à transparência. Ou seja, a plataforma tem de informar os trabalhadores sobre como são monitorizados.

A proposta do Governo é similar?

Já foi mais. A primeira versão da proposta do Executivo, apresentada ainda na anterior legislatura e que ficou pelo caminho com a dissolução do Parlamento, estava mais próxima da diretiva europeia do que a atual. Se, inicialmente, a proposta do Governo dava como provado vínculo laboral dos trabalhadores à plataforma sempre que fossem confirmados dois dos seis indícios de laboralidade previstos no diploma — em linha com o que foi aprovado pelo Parlamento Europeu e o que resulta da jurisprudência internacional —, a versão final da proposta que agora está a votação em sede de especialidade defende algo substancialmente diferente. O Governo alterou a sua proposta para passar a prever que o contrato possa ser assinado com empresas intermediárias, e não apenas com plataformas como a Uber, Glovo ou similares, distanciando-se assim da diretiva europeia.

Vamos ter regras diferentes?

É precisamente a introdução desta terceira figura, o intermediário, que está a travar a regulamentação do trabalho nas plataformas em Portugal. A oposição, sobretudo o Bloco de Esquerda (BE), tem acusado o Governo de ter cedido ao “lóbi das plataformas” ao alterar o texto. E, da esquerda à direita, os partidos colocam em causa a decisão, com o PSD a questionar António Costa, esta semana, no Parlamento, sobre a “paternidade” da figura do intermediário, que afasta as regras que Portugal quer adotar do que define a Europa. Costa acabaria por admitir que a proposta pode ser clarificada neste ponto, levando o BE a requerer o adiamento, pela terceira vez, da votação da norma. O objetivo era que as novas regras entrassem em vigor já em janeiro de 2023, mas, com os sucessivos adiamentos que a votação tem sofrido, o Executivo já admitiu que o prazo não se irá cumprir.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: cmateus@expresso.impresa.pt

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