A Autoridade Bancária Europeia (EBA, na sigla inglesa) deixou vários alertas sobre os riscos que deteta para o sector para os próximos meses: uma deterioração da qualidade dos créditos já concedidos, devido à inflação, e uma possível descida no preço das casas, que pode afetar o balanço dos bancos e, também, a própria estabilidade do sistema financeiro.
No seu relatório de avaliação de riscos, divulgado esta sexta-feira, 9 de dezembro, a EBA avisa os bancos de que “devem preparar-se para uma provável deterioração da qualidade dos ativos”. Aliás, o regulador diz que já vê “sinais preliminares” de que isso está a acontecer. O rácio de crédito malparado até continua a apresentar uma tendência descendente (passou de 2,3%, em junho de 2021, para 1,8%, um ano depois), com os bancos a lidarem com os ativos problemáticos herdados do passado, mas o que se começa a ver traz receios.
Segundo o documento, as novas entradas em crédito malparado “aumentaram significativamente na primeira metade de 2022”, e o nível (stage) 2 da avaliação de crédito (há três degraus, em que o 3 é quando há incumprimento declarado) está no seu valor mais alto desde a sua implementação.
“A inflação mais elevada e o abrandamento do crescimento económico podem reduzir o rendimento disponível dos clientes”, diz o relatório, sendo que “os bancos devem reconhecer atempadamente os clientes vulneráveis e as imparidades correspondentes”. Em Portugal, há já uma legislação que obriga a esses contactos com os clientes bancários, que foi reforçada agora pelo Governo.
Outro dos dados retirados pela EBA é que mais de metade das entidades bancárias que responderam ao seu inquérito esperam “uma deterioração” dos créditos a PME, grandes empresas e empréstimos a particulares.
Receio sobre imobiliário
A situação macroeconómica, bem como as condições financeiras mais apertadas, “podem levar à queda dos preços do imobiliário residencial”. E se houver uma desvalorização significativa, a estabilidade financeira pode ficar em perigo.
“Os bancos e os supervisores financeiros devem, por um lado, impedir uma maior acumulação de risco e, por outro lado, estar preparados para enfrentar os impactos de uma potencial queda abrupta nos preços do imobiliário”, diz o relatório.
Um aviso que o Banco de Portugal tem vindo também a deixar, devido à exposição da banca ao imobiliário residencial, até porque chegou a considerar que os preços das casas poderiam estar sobreaquecidos no país.
Contenção nos dividendos e prémios, cuidado com impostos
Apesar de os bancos europeus (incluindo os portugueses) terem reforçado os seus lucros (o retorno sobre o capital subiu de 7,4% para 7,8%), e os rácios de capital estejam em níveis “relativamente altos” (ainda assim, deslizaram de 15,8% para 15%), a EBA pede contenção na distribuição de pagamentos.
“Os bancos devem adotar políticas de distribuição de capital prudentes de forma a salvaguardar a resiliência financeira”, continua, acrescentando que também as políticas de atribuição de prémios devem ser “cuidadosamente analisadas”. É preciso ter almofadas de capital para cobrir perdas “inesperadas”, pelo que não devem ser gastas com essas distribuições.
Numa altura em que pela UE (e em Portugal) se prepara a taxação de lucros extraordinários devido ao atual contexto económico, a EBA também refere o tema, dizendo que esta opção política “não pode comprometer a viabilidade a longo prazo dos bancos”.
Na sua avaliação de risco, o regulador europeu presidido pelo espanhol José Manuel Campa nota ainda que cresceu a exposição da banca ao sector da energia (muito por conta das consequências da guerra na Ucrânia), o que se verifica tanto ao nível de empréstimos como de derivados. De qualquer forma, a exposição está concentrada num pequeno número de bancos: “10 bancos têm mais de 50% da totalidade dos empréstimos”.
Nas preocupações da EBA estão igualmente os custos de financiamento dos bancos europeus, que deverão aumentar – há grandes montantes a devolver ao Banco Central Europeu (500 mil euros terão de ser devolvidos até ao fim do ano, mais nos próximos, como anunciou a autoridade da zona euro). Há bancos que podem ter de aumentar a fatia de depósitos, e outros que podem ser obrigados a emitir dívida adicional (que também pode ser um desafio porque há requisitos mínimos de dívida a colocar no mercado para ter camadas de proteção para situações de dificuldade). E os custos são incertos.
A divulgação deste relatório sobre os riscos aconteceu ao mesmo tempo que foram divulgados os testes de transparência à escala da União Europeia, iniciados em setembro, e que avaliam as exposições e a qualidade dos ativos dos bancos europeus. Foram avaliados 122 bancos de 26 países. BCP, CGD, LSF Nani (entidade do grupo Lone Star que consolida o Novo Banco) foram as entidades portuguesas que fizeram parte da amostra, embora as operações em Portugal do Santander e do CaixaBank (dono do BPI) também tenham sido examinadas, incorporadas nas casas-mãe. Na análise aos rácios de capital, dos três bancos portugueses analisados, só a CGD supera a média europeia.
Assine e junte-se ao novo fórum de comentários
Conheça a opinião de outros assinantes do Expresso e as respostas dos nossos jornalistas. Exclusivo para assinantes