Uma política orçamental expansionista seria um erro no contexto atual de alta inflação pelo perigo de criação de “uma segunda onda no processo inflacionário”, disse o ministro das Finanças, esta segunda-feira, 21 de novembro, na conferência do primeiro aniversário da CNN Portugal, a CNN Portugal International Summit.
Sobre se a estratégia acelerada de subida das taxas de juro pelo BCE é a correta, Medina disse que tem defendido que “tem de haver equilíbrio (…) face à característica particular da inflação que estamos a viver", que não se deve ao aumento acentuado da procura mas sim à escassez de oferta criada pela pandemia da covid-19 e acentuada pela invasão da Ucrânia pela Rússia.
Mas “a política orçamental neste momento tem que ser uma política coordenada com a política monetária”, disse Fernando Medina.
”Não podemos ter a política orçamental a ser um contravapor" das decisões de política monetária do BCE e “não podemos ter políticas orçamentais muito expansionistas neste período porque seria errado do ponto de vista económico uma deescoordenação”.
“Não poderíamos ser nós a criar uma segunda onda no processo inflacionário”, vincou Medina, numa altura em que o surto inflacionista está a ser de “duração mais longa do que inicialmente era previsto”.
A estratégia orçamental portuguesa para 2023, plasmada no Orçamento do Estado, “é fundamentalmente neutra”. Não sendo expansionista, “também não é de contração”.
“Nós procuramos não contribuir para a contração da economia, mas também não seremos o elemento acelerador de um processo inflacionário, esse sim com raízes internas e ancorado internamente”.
Sobre o impacto da subida rápida das taxas de juro nos créditos à habitação, numa altura em que os portugueses se deparam com revisões em forte alta das prestações, Medina reconheceu que “esta subida muito rápida das taxas de juro obviamente que está a causar dificuldades a muitas famílias”.
Porém, lembrou que “ainda estamos em níveis de taxas de juro significativamente abaixo daquelas que registámos em 2008” e que não se prevê que o BCE continue o ciclo de subidas de forma a chegar a esses valores. Medina reconheceu, contudo, que “na altura o processo de subida foi mais longo do que está a ser agora”.
Segundo o ministro das Finanças, a situação atual goza da vantagem de “um stock de crédito mais envelhecido” que significa que a cada mensalidade “amortiza-se mais capital do que juro”.
O problema, disse, “está mais concentrado nos créditos mais recentes, onde a dimensão de juro tem ainda uma dimensão muito significativa relativamente à mensalidade”.
Relativamente a uma possível correção dos preços do imobiliário provocada pelo aumento das taxas de juro, o ministro disse que “o nosso mercado tem tido historicamente uma resistência a baixa dos preços muito significativa na medida em que a habitação no nosso pais tem uma forte dimensão de reserva de valor”.
Mas podem sofrer alterações, já que a subida das taxas diretoras pode significar uma redistribuição do investimento por atividades, tal como está a acontecer nas ações do setor tecnológico norte-americano com perspetivas de crescimento muito abaixo das dos últimos anos, disse.
“O que certamente irá acontecer com o processo de subida das taxas de juro é que vários desses investimentos sofrerão processos de saída”, descreveu.
Depósitos e PRR
Interrogado sobre se a Caixa Geral de Depósitos deveria liderar um movimento, entre o setor bancário, para remunerar melhor os depósitos, Fernando Medina escusou-se a falar sobre a estratégia do banco do Estado, mas aplaudiu os recentes resultados positivos da Caixa e disse que a sua expectativa “é que para o ano também melhorem”.
E apelou a que os portugueses continuem a financiar o Estado através de instrumentos de dívida: em alternativa aos depósitos bancários, os certificados de aforro “têm uma remuneração interessante neste momento”, lembrou.
Medina atribuiu a baixa execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) “aos ciclos de investimento numa empresa e no Estado" cujos tempos são influenciados por “mecanismos de transparência e igualdade”.
O dinheiro atribuído a título de subsídios “é de execução imediata”, mas “quando se trata de fazer investimentos” este não é aplicado de “forma linear ao longo do tempo, é preciso fazer estudos e projetos” que atrasam a despesa. A execução “vai acelerar agora sem dúvida” passadas essas primeiras exigências, vaticinou.
"O Marquês de Pombal e o engenheiro Duarte Pacheco são muito elogiados" (…) mas queria ver o que valem perante o Código de Contratos Públicos", brincou.
O Governador: “Não li nem vou ler”
O recente livro “O Governador”, do jornalista Luís Rosa, em que o antigo governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, faz uma retrospetiva do seu mandato, e no qual faz várias acusações ao primeiro-ministro António Costa e ao seu governo foi igualmente tema na conversa com a CNN Portugal.
“Eu não li o livro nem vou ler e também não quero comentar. Se tivesse que comentar tinha que dar a minha opinião sobre o que foi o mandato do governador Carlos Costa e a minha opinião da personalidade em causa”, disse Medina. “Pelas funções que ocupo acho que não deveria fazer”.
No livro, Carlos Costa acusa a Câmara Municipal de Lisboa (CML), liderada por Medina à época, de autorizar uma manifestação em frente à casa do governador.
Desafiado a comentar esta passagem, o ministro disse que “o entendimento da CML é que as câmaras não têm poder para proibir ou autorizar manifestações ao abrigo da Constituição da República Portuguesa. A CML não pode proibir e não proibiu nenhuma."
“Não sabia aliás que essa tinha acontecido porque o direito à manifestação é constitucionalmente protegido”, disse.
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