Economia

Como financiar os apoios às famílias e empresas? Subindo impostos aos mais abonados, recomenda economista-chefe do BCE

Philip Lane
Philip Lane
Niall Carson - PA Images/Getty

Philip Lane avisa que a partir do próximo ano a pressão sobre as contas públicas começa a aumentar. E diz que aumentar impostos sobre os mais ricos e as empresas mais lucrativas é menos nocivo para a economia, do que deixar derrapar os défices

Nos últimos meses os governos têm lançado mão de uma bateria de medidas para ajudar famílias e empresas a suportar a escalada dos preços. Na maioria dos casos, os pacotes estão a ser financiados diretamente, noutros preparam-se subidas de impostos ou taxas extraordinárias sobre empresas e alguns grupos sociais. Qual a melhor maneira de pagar este encargo? Para o economista-chefe do Banco Central Europeu, o caminho dos impostos de solidariedade é o mais indicado, porque menos nocivo para a economia.

Numa entrevista ao der Standard, um diário austríaco, divulgada esta terça-feira na página eletrónica do BCE, Philip Lane diz que, nesta fase, os governos devem apoiar o consumo e o rendimento das famílias e empresas mais carenciadas. Trata-se de “uma medida de justiça social”, mas também de racionalidade macroeconómica, diz o economista. Contudo, é preciso cautela na forma como os cofres públicos financiam estes apoios.

Para Lane, a forma mais adequada é recorrer à subida de impostos, quer sobre quem tem mais rendimentos, quer sobre as empresas e indústrias que mantêm elevados lucros, apesar do choque energético. Pedir um esforço adicional a quem mais tem, nesta fase, “tem menos efeitos sobre a inflação do que se [os Estados] aumentarem os défices” das suas contas públicas, considera.

Philip Lane não vê problemas no curtíssimo prazo, “mas há um limite no tempo. A partir do próximo ano é preciso afastarmo-nos de políticas inflacionistas”, avisa.

O alerta vem em linha com as declarações feitas esta semana por Christine Lagarde, que acusou os governos europeus de estarem a agir em contramão com os objetivos do BCE: 80% das medidas anticrise que os governos estão a tomar são nocivas e contrariam a política monetária que pretende “enfraquecer a procura” para reduzir o surto inflacionário, queixou-se a presidente do Banco Central Europeu, durante uma deslocação a Estrasburgo.

A mensagem do economista-chefe do BCE surge também numa altura em que a política fiscal volta a ganhar terreno na discussão pública. Em Espanha, porque Pedro Sanchez quer avançar com um imposto sobre as grandes fortunas, a par com taxas sobre a banca e as petrolíferas, mas conta com a resistência dos governos regionais e do próprio partido. No Reino Unido, onde a voracidade do “choque fiscal” de Luz Truss atirou a libra para mínimos históricos e obrigou o banco central a intervir. E em Itália, onde Giorgia Meloni promete uma taxa única de imposto sobre o rendimento e uma descida da tributação para rendimentos altos.

Moderar ambições, nos salários e nos lucros

Na entrevista ao jornal austríaco, Philip Lane pede também moderação, tanto aos trabalhadores, como aos empresários.

“A inflação tem de ser refletida nos salários, mas parcialmente. Porque refleti-la diretamente teria um impacto nos custos das empresas e teria efeitos secundários, como um novo aumento dos preços, o que apenas prolongaria o ciclo de elevadas taxas de juro, explica o economista.

A mesma mensagem é endereçada aos patrões. “Recomendo vivamente as empresas a não esperarem o mesmo nível de lucros em períodos de elevada inflação. Para conseguirmos controlar a inflação, temos de perceber que os lucros empresariais vão descer durante algum tempo e que os salários também não poderão acompanhar a inflação”.

Para o modelo do BCE funcionar, é importante que este “equilíbrio coletivo” funcione. “Temos de carregar este fardo coletivamente”, diz Lane.

Enquanto a forma da distribuição do fardo da crise ainda se desenha, uma coisa é certa: “As condições de vida vão degradar-se, em resultado dos custos da eletricidade e gás. Isto empobrecerá as pessoas”.

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