Economia

Banco de Portugal alerta para menos dinheiro nas famílias e queda dos preços das casas como riscos para a economia

Apresentação de resultados do Banco de Portugal, feita pelo governador Mário Centeno.Foto Ana Baião
Apresentação de resultados do Banco de Portugal, feita pelo governador Mário Centeno.Foto Ana Baião
Ana Baiao

Banco de Portugal vê seis grandes riscos pela frente da economia portuguesa. Só atuação concertada entre autoridades nacionais e europeias pode ajudar a combatê-los, segundo Mário Centeno

Banco de Portugal alerta para menos dinheiro nas famílias e queda dos preços das casas como riscos para a economia

Diogo Cavaleiro

Jornalista

O Banco de Portugal sintetiza em seis grandes grupos os riscos que vê pela economia portuguesa, sendo que para impedir a sua concretização o governador acredita que é preciso uma atuação "determinada" de "todos os intervenientes na contenção destes riscos". E uma intervenção conjunta. E, diz a autoridade liderada por Mário Centeno a Costa, os fundos europeus são para usar bem.

É necessária uma “atuação muito concertada, não só a nível nacional, como a nível europeu”, disse Mário Centeno na conferência de imprensa desta sexta-feira, 24 de junho, no Museu do Dinheiro, em Lisboa, no dia da publicação do relatório de estabilidade financeira do Banco de Portugal.

Um dos grandes riscos detetados pelo supervisor diz respeito à situação financeira dos particulares, temendo-se a “a redução do rendimento disponível real devido à inflação e o efeito do aumento das taxas de juro sobre o serviço de dívida, aos quais acresce a incerteza relativa à evolução da atividade económica e do emprego”.

Aqui está, na parcela relativa ao serviço da dívida, a subida das prestações de créditos, sobretudo à habitação, que são os de maior dimensão.

Mais incumprimentos

A autoridade bancária nota também o risco do “aumento da probabilidade de incumprimento das empresas, refletindo o efeito conjunto da vulnerabilidade financeira de algumas empresas, da recuperação incompleta da atividade e da rendibilidade de alguns setores no pós-pandemia, bem como o enquadramento macroeconómico e financeiro atual”. Também aqui as empresas podem vir a ser penalizadas pela incapacidade de reembolsarem os créditos contraídos devido ao aumento dos juros.

Este aumento de juros vai beneficiar a margem financeira dos bancos (conseguem mais remuneração nos créditos concedidos, e demoram a subir as taxas nos depósitos), mas também vai agravar as imparidades que os bancos têm de constituir para terem dinheiro de lado para eventuais perdas nos créditos de empresas e famílias que possam tornar-se mais prováveis.

Além disso, tendo em conta os títulos de dívida soberana que têm em carteira, os bancos podem também ter de registar perdas com aquelas que têm de inscrever contabilisticamente à luz da evolução dos preços dos mercados – como o Expresso conta na edição desta sexta-feira, os bancos já tomaram medidas para limitar este efeito, colocando mais dívida na carteira que não tem de refletir a evolução dos mercados.

Dívidas soberanas podem sofrer

Em relação à dívida soberana, poderá haver um aumento dos prémios de risco (remuneração exigida pelos investidores para adquirirem dívida de cada país e da sua diferença em relação aos juros pedidos à dívida alemã, que é a referência).

Este fator é mais relevante para países periféricos, como Portugal, Espanha e Itália, sendo que sobretudo esta última tem vindo a sofrer já um grande diferencial face à dívida da Alemanha. O Banco Central Europeu tem dito que tudo vai fazer para impedir uma fragmentação entre os países, e isso tem levado a uma diminuição nos últimos dias desse diferencial. Porém, o supervisor admite que tal poderá ainda inverter-se.

“Uma reavaliação adicional dos prémios de risco, não obstante a correção já ocorrida” é um dos riscos que a autoridade comandada por Mário Centeno observa, “podendo interagir com as vulnerabilidades acumuladas durante a pandemia e reduzir o preço dos ativos, com impacto no sistema financeiro, sobretudo na valorização de carteiras”.

Com mais custos de financiamento, Portugal pagará juros mais elevados, e um dos riscos que existe é que a dívida pública venha a ganhar peso, em vez de descer, como está previsto: “O rácio de dívida das administrações públicas em percentagem do PIB [pode] não prosseguir a trajetória de redução prevista, derivado da incerteza sobre a atividade económica e do aumento dos custos de financiamento”. Existindo uma maior pressão sobre as contas públicas, como sintetizou Luís Laginha de Sousa, administrador do Banco de Portugal.

Mais crédito para casa assusta

Por fim, há ainda o preço do imobiliário. O risco visto é a “redução dos preços no mercado imobiliário residencial, decorrente de alterações nas condições de financiamento”. Por Portugal, tem havido um aumento dos preços do mercado imobiliário residencial, que o supervisor atribui à procura por estrangeiros e “pela escassez de oferta”. “Continuamos a não ter evidência de que o principal fator subjacente à subida de preços na habitação seja o crédito bancário doméstico”, afirmou Laginha de Sousa, dizendo que o receio é mesmo aí que está.

“No contexto do recente maior crescimento observado no crédito à habitação, é fundamental assegurar que este não passe a assumir um papel determinante para a evolução dos preços no mercado imobiliário”, indica o relatório de estabilidade financeira publicado. Isto porque ganhando força este crédito, são os bancos que mais podem sofrer num cenário de descida de preços das casas.

Utilização eficiente do PPR

No relatório apresentado esta sexta-feira, o supervisor sublinha que neste contexto de maior risco "ganha assim importância acrescida uma utilização eficiente dos fundos colocados à disposição da economia portuguesa através do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR)". Um aviso de Centeno para Costa.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: dcavaleiro@expresso.impresa.pt

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