Economia

Economia mundial arrisca partir-se em blocos geopolíticos, avisa economista-chefe do FMI

Economia mundial arrisca partir-se em blocos geopolíticos, avisa economista-chefe do FMI
Stefani Reynolds

A invasão russa provocou uma "mudança tectónica" avisa Pierre-Olivier Gourinchas, o novo economista-chefe do FMI. Criação de "blocos geopolíticos" distintos poderão redesenhar a globalização

A invasão russa da Ucrânia provocou uma "mudança tectónica" na ordem global que poderá levar "a uma maior fragmentação permanente da economia mundial em blocos geopolíticos com distintos padrões tecnológicos e diferentes sistemas de pagamento transfronteiriços e divisas de reserva", avisa o académico Pierre-Olivier Gourinchas que substituiu Gita Gopinath como economista-chefe do Fundo Monetário Internacional (FMI).

Este reajustamento da globalização é uma das novidades trazida pelo World Economic Outlook publicado esta terça-feira no âmbito das reuniões de primavera do Fundo e do Banco Mundial que estão a decorrer em Washington DC.

O impacto longo deste choque ocorrido em fevereiro pode ser a formação de blocos geopolíticos em confronto que arrastam um redesenho dos fluxos de comércio internacional e de investimento, subordinando-os a zonas de influência politico-militar ou de forte tutela geoeconómica. O que se saldará, diz Gourinchas,"em perdas de eficiência na economia mundial, maior volatilidade, e a colocação em causa da ordem internacional dos últimos 75 anos".

Em poucas semanas, a guerra de invasão russa provocou um novo grande choque ainda as feridas da pandemia não estavam curadas. A expansão económica ainda recente abrandou, recuou quase um ponto percentual à escala mundial em 2022, a inflação disparou, à exceção da China e do Japão, e os riscos globais aumentaram fortemente e interagem entre si, diminuindo a margem de manobra para as políticas monetária e orçamental.

Gourinchas explica: “Esses riscos e políticas interagem de uma maneira complexa e em tempos diferentes. As taxas de juro a subirem e a necessidade de proteger as populações vulneráveis ​​contra a alta dos preços da energia tornam ainda mais difícil manter a sustentabilidade orçamental. Por sua vez, a erosão da margem orçamental torna mais difícil investir na transição climática, enquanto os atrasos no tratamento desta crise tornam as economias mais vulneráveis ​​a choques de preços de matérias-primas, o que, por seu lado, alimenta a inflação e a instabilidade económica".

A todo este emaranhado de tendências junta-se, agora, a fragmentação geopolítica, diz o economista-chefe do FMI, o que "só piora a escolha entre todas essas opções, aumentando o risco de conflito e volatilidade económica e diminuindo a eficiência geral". Precisamente sobre a "mudança tectónica", esta quarta-feira, Kristalina Georgieva, a diretora-geral da organização, interrogou-se, num frente-a-frente com David Malpass, presidente do Banco Mundial: "Como será o mundo se a economia mundial se partir?". Para contrariar um cenário difícil de imaginar, a búlgara adiantou: "Prosperidade e paz são indivisíveis".

Os dilemas a enfrentar nas opções de políticas aumentaram, nomeadamente na área monetária (terminar os estímulos para controlar a inflação, ainda que correndo o risco de arrefecer em demasia a economia e os mercados) e orçamental (acudir aos piores efeitos nas famílias e empresas do surto inflacionário tendo em conta a necessidade de cortar na dívida e reduzir o défice).

O economista-chefe do FMI aconselha, por isso, a que os bancos centrais comuniquem "bem" as suas decisões quando aumentam as taxas diretoras ou reduzam o valor dos próprios ativos, apoiando-se sempre "nos dados", e que os governos consigam um bom equilíbrio entre "o apoio aos vulneráveis" e a reconstrução de almofadas financeiras num contexto de taxas de juros mais elevadas".

O disparo no risco geopolítico (com uma invasão de um vizinho às portas da União Europeia e da NATO) aumentou "consideravelmente muito para além do habitual" o nível de incerteza, finaliza Gourinchas.

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