Economia

Do Estado russo para os Estados croata e esloveno: é o fim do maior banco da Rússia na União Europeia

Foto: Getty Images
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Operações do Sberbank na UE foram intervencionadas. Há insolvências e vendas, mas os bancos europeus (incluindo os portugueses) livram-se de um encargo

A intervenção europeia sobre o maior banco da Rússia, o Sberbank, ditou a sua expulsão da União Europeia. O coração das operações, na Áustria, vai para insolvência, e as subsidiárias na Croácia e na Eslovénia têm novos donos: entre eles, estão os próprios Estados croata e esloveno. Trata-se, portanto, de uma mudança de Estados proprietários. Depois da intervenção, o próprio banco russo veio dizer que saía do continente (à exceção da Suíça).

Desde segunda-feira que se sabia que, após a fuga de depósitos, o Banco Central Europeu tinha dado o tiro de partida para que tudo fosse diferente nos braços europeus do Sberbank, ao atribuir-lhe o carimbo de “em risco ou em situação de insolvência”. Com isso, começaram os preparativos por parte do Conselho Único de Resolução, responsável europeu pelas intervenções em bancos europeus.

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A decisão, após uma moratória de dois dias de congelamento, foi tomada este dia 1 de março, e veio com diferentes posições: de um lado, a insolvência austríaca; do outro, a continuidade croata e eslovena. No caso de depósitos, há uma proteção de até 100 mil euros nas aplicações feitas no banco austríaco, e uma garantia total sobre as aplicações colocadas nos bancos croata e esloveno, já que passam para outro dono.

Sem dinheiros do Fundo Único de Resolução

“Hoje, agimos para proteger o interesse público e assegurar a estabilidade financeira. Tudo isto foi feito sem ter de usar fundos públicos, pelo que não só os clientes do Sberbank foram protegidos, como também os contribuintes o foram”, declarou a presidente do Conselho Único, Elke König. A Comissão Europeia apoiou a decisão do Conselho Único de Resolução, cuja implementação cabe agora a cada uma das autoridades nacionais.

Não há qualquer ajuda da parte do Fundo Único de Resolução, para onde os bancos europeus contribuem para vir a pagar dificuldades numa entidade bancária, como ressalva a Comissão Europeia, na decisão que autoriza a medida de resolução. Quer isto dizer que os bancos portugueses não estão a contribuir para estas operações.

“Os bancos estavam em risco de insolvência, não havia soluções privadas fora do regime de resolução, não havia ações de supervisão que impedissem a insolvência, e a ação de resolução era necessária para o interesse público”, segundo diz a Comissão Europeia.

Mesmo que diretamente não haja dinheiro europeu, a verdade é que os novos proprietários têm dinheiro dos respetivos contribuintes envolvidos.

Os novos donos estatais

“O Conselho Único de Resolução decidiu transferir todas as ações da subsidiária do Sberbank na Croácia para o Hrvatska Poštanska Banka d.d. [HPB, o banco postal croata] e todas as ações da subsidiária do Sbrebank na Eslovénia para o Nova ljubljanska banka (NLB)”. Esta opção faz com que os bancos tenham aberto esta quarta-feira, 2 de março, sem problemas, fosse para os depositantes, fosse para os clientes. “Fazem parte agora de grupos bancários bem-estabelecidos, robustos e estáveis”.

No caso da atividade croata, o novo acionista do banco russo, o HPB, é uma instituição de capitais públicos croatas, tendo uma quota de mercado de 5,6% dos ativos do sistema bancário daquele país dos balcãs. A República croata detém 45% do capital, somando-se depois outras entidades do país, como a empresa de serviço postal, o sistema de garantia de depósitos e de pensões.

A autoridada croata lembra “que todos os depósitos de cidadãos e empresas, independentemente do volume, estão absolutamente seguros”. No caso esloveno, também.

A instituição eslovena que fica com o Sberbank do país tem no seu capital a República da Eslovénia. O NBL é o maior banco internacional do país, e é público – foi privatizado recentemente, sendo que o Estado esloveno detém 25% do capital, que é o maior acionista. Tem outros acionistas, onde se incluem a Schroders e o BERD.

Insolvência austríaca e checa

Em sentido inverso vai o banco na Áustria: “O Conselho Único de Resolução decidiu que não é necessária a resolução do Sberbabank Europe AG austríaco. Os procedimentos de insolvência serão seguidos de acordo com a lei nacional”, indica o seu comunicado.

A conclusão da autoridade é que esta unidade, embora fosse o coração das restantes entidades, não exercia “funções críticas” para a economia, e que a insolvência não teria um impacto negativo sobre a estabilidade financeira austríaca (“a sua descontinuação não causaria disrupção nos serviços que são essenciais para a economia real da Áustria, nem a disrupção da estabilidade financeira na Áustria e noutros Estados-membros”).

Segundo o supervisor austríaco, que segue as instruções do BCE (que é a autoridade de supervisão direta da instituição), o sistema de garantia de depósitos terá de pagar até 100 mil euros por aplicação no espaço de 10 dias úteis.

Deixando de haver o banco austríaco, também a livre prestação de serviços que tinha em Portugal deixa de existir.

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Afastado pelos outros e por conta própria

O Sberbank tem presença noutros países europeus, mas estas três entidades eram aquelas que, sendo autónomas, estavam sob a supervisão direta do Banco Central Europeu devido à dimensão transfronteiriça do grupo. Na República Checa, a unidade do Sberbank – que não era supervisionada diretamente pelo BCE, mas pela autoridade nacional – já vira a sua licença bancária ser revogada, sendo que também assegura o pagamento dos depósitos até 100 mil euros nos próximos sete dias. O sistema de garantia checo já assegurou que tem dinheiro para pagar todos os depósitos elegíveis.

Este é o passo que dita o futuro do Sberbank na Europa que até tinha um acordo desde o ano passado para vender as operações na Bósnia e Herzegovina, na Croácia, na Hungria, na Sérvia e na Eslovénia – a guerra russa acabou com esses planos. O fim aconteceu e sem receber qualquer dinheiro.

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Aliás, além da decisão das autoridades bancárias europeias, o Sberbank também anunciou a retirada da sua presença da Europa (com a exceção da Suíça). Segundo um comunicado citado pela imprensa internacional, o banco central russo ordenou a saída da Europa por incapacidade de ceder liquidez às subsidiárias europeias – a moeda estrangeira é para manter no país. Além da decisão, o grupo russo também justifica a saída com as “ameaças à segurança dos funcionários e balcões” sentidas nos países, como cita a Reuters.

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