Economia

Ministério Público quer baixar sete coimas a bancos (sobretudo a do Montepio) e manter a quatro (incluindo os €82 milhões à CGD)

Ministério Público quer baixar sete coimas a bancos (sobretudo a do Montepio) e manter a quatro (incluindo os €82 milhões à CGD)

Nas alegações finais do “cartel da banca”, o Procurador da República defendeu um limite nas sanções caso ponham o sistema bancário em risco, ou caso exijam novas ajudas do Estado

Ministério Público quer baixar sete coimas a bancos (sobretudo a do Montepio) e manter a quatro (incluindo os €82 milhões à CGD)

Diogo Cavaleiro

Jornalista

O Ministério Público propõe uma redução global das coimas aplicadas pela Autoridade da Concorrência no âmbito do caso conhecido como “cartel” da banca. Mas essa diminuição não é extensível a todas as instituições financeiras, apenas a sete dos 11 bancos com recursos. Quatro bancos devem ver as coimas da Autoridade da Concorrência confirmadas, defende o procurador da República, incluindo porque têm resultados expressivos para suportar as sanções. A sentença do tribunal virá em abril.

Esta quarta-feira, 23 de fevereiro, no início das alegações finais do julgamento que corre no Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, em Santarém, o procurador Paulo Vieira considerou que a coima global de 225 milhões de euros, aplicada aos 11 bancos que recorreram para a justiça, deve ser mais baixa, atendando a casos específicos.

Montepio lidera reduções

Justificando com a situação financeira “frágil”, o Banco Montepio deverá ver a sua coima ser reduzida de 26 milhões (paga apenas em 13 milhões, por ter aderido ao programa de clemência), para um máximo de 4,4 milhões de euros (reduzida a metade, à mesma). Foi o único caso em que o procurador apontou um valor específico quando pedia a redução de coima. Nas restantes, pediu a diminuição, mas sem propor um número.

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Por exemplo, no BCP, com a segunda coima mais elevada no processo, de 60 milhões, a sanção até devia ser mantida, só que a situação financeira do banco pode justificar que haja uma redução – tudo dependerá, na sua ótica, dos resultados a apresentar na próxima segunda-feira, 28 de fevereiro.

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Entre as reduções de coimas incluem-se ainda o BES (em liquidação), a UCI, o BIC e BPI (estes dois últimos de forma “marginal”). Até o Barclays, dispensado de pagar por ter sido o denunciante do caso, veria a coima aplicada reduzida, por vontade do Ministério Público.

Resultados explicam manutenções

No montante de 82 milhões de euros, a coima mais elevada, aplicada à Caixa Geral de Depósitos, é para continuar, tal como a do Santander Totta e do BBVA, com o procurador a relembrar que estes dois últimos apresentaram lucros expressivos que não justificam o corte da coima.

No Crédito Agrícola, a posição é manter a coima, mas o procurador ressalvou que ainda não se conhecem os resultados do ano passado – e esse é um ponto central, na ótica do Ministério Público, na hora de definir as sanções.

Evitar novos resgates

Nas justificações, o procurador Paulo Vieira explicou que não quer que as sanções ponham em causa a situação financeira de cada um dos bancos. “O Ministério Público entende que qualquer sanção tenha como seu limite [… a situação] financeira de cada uma das instituições”, declarou.

Segundo o procurador, há necessidade de evitar que o Estado volte a suporte os “elevadíssimos ónus” de coimas elevadas que prejudicassem os bancos. Daí que seja necessário afastar “qualquer risco sistémico”.

O procurador, que alinha com a grande maioria das conclusões da AdC (de que houve troca de informação sensível que não era acedida facilmente pelos consumidores e que falseou a concorrência, entre 2002 e 2013), fez as suas propostas à juíza Mariana Machado. As alegações finais começaram esta quarta-feira, dia 23 de fevereiro, e estendem-se por mais uma semana.

A sentença do tribunal virá em abril. É à juíza que cabe a decisão judicial de aplicação de sanções, aderindo ou não à proposta da AdC e do MP. Qualquer decisão é recorrível pelas partes para tribunais superiores.

Coimas

  • Caixa Geral de Depósitos

Coima da AdC: 82 milhões

Coima pedida pelo MP: 82 milhões

O procurador considera que a coima, sendo elevada, representa apenas 7 milhões de euros por cada ano de infração, inferior aos benefícios que terão sido obtidos com a troca de informação. “Afigura-se que esta coima é de manter nos precisos termos” da condenação da AdC. Paulo Vieira criticou a forma como a CGD, apesar de ser um banco de capitais integralmente públicos, tratou do caso: “efetivamente, tem tratado todo este assunto de forma ligeira”.

  • Banco Comercial Português

Coima da AdC: 60 milhões

Coima pedida pelo MP: Deve descer se resultados de 2021 forem magros

A coima mostra-se “adequada”, mas o MP não tem certezas, porque depende dos resultados de 2021, a divulgar a 28 de fevereiro. “Caso a solidez do banco venha a ficar afetada, se for o caso, entende-se que a coima deverá ser reduzida”, disse Paulo Vieira.

  • Santander Totta (incluindo Popular)

Coima da AdC: 35,65 milhões

Coima pedida pelo MP: 35,65 milhões

“As coimas calculadas mostram-se adequadas, sendo de manter integralmente, atendendo aos resultados de 2021, teve lucros muito expressivos”, justificou o procurador.

  • BPI

Coima da AdC: 30 milhões

Coima pedida pelo MP: Abaixo de 30 milhões

“Entende-se que a coima mostra-se adequada, mas, atendendo à correta postura, e à assunção da responsabilidade através do seu presidente da administração, sufraga-se uma redução marginal da coima”, apontou o representante do Ministério Público.

  • Banco Montepio

Coima da AdC: 26 milhões, dispensada em metade do valor pelo programa de clemência

Coima pedida pelo MP: Máximo de 4,4 milhões, dispensada em metade do valor pelo programa

O banco aderiu ao programa de clemência da AdC (a segunda adesão, a seguir ao Barclays, pelo que teria direito a dispensa de até 50% da coima). O procurador criticou, porém, a postura do banco, por na fase de julgamento ter uma posição que não é consentânea, e com “atos contrários”, com a clemência. Apesar disso, é de considerar na decisão, defendeu Paulo Vieira, essa adesão. Em relação à sanção, o procurador lembrou a “natureza social” do Montepio, bem como a sua “situação económica frágil” e o facto de o capital ser dos aforradores (os 600 mil associados da mutualista). “Afigura-se, face às necessidades de robustez, que a coima deverá ser substancialmente reduzida, para impedir qualquer tipo de situação. Afigura-se que no seu máximo global não deverá exceder 4,4 milhões, dispensa em metade (2,2 milhões)”, disse ainda o procurador, acrescentando que o Ministério Público “não se oporá a que a coima seja paga em prestações, 100 mil euros cada uma”.

  • BBVA

Coima da AdC: 2,5 milhões

Coima pedida pelo MP: 2,5 milhões

“A coima mostra-se adequada, sendo de a manter integralmente”, até porque teve “lucros realmente extraordinários”, explicou o responsável do MP.

  • BES

Coima da AdC: 700 mil euros

Coima pedida pelo MP: Simbólica

Não há quaisquer razões de prevenção que justifiquem uma coima elevada, por isso, o Ministério Público pede uma coima de “valor meramente simbólico”.

  • BIC

Coima da AdC: 500 mil euros

Coima pedida pelo MP: Abaixo de 500 mil euros

O procurador considera que deverá haver uma “redução marginal da coima”, elogiando o trabalho feito pela defesa. Porém, recusa que não haja coima por as infrações terem sido cometidas pelo BPN, entretanto comprado pelo BIC, pelo simples facto de o NIF do BPN ter sido o assumido pelo BIC.

  • Crédito Agrícola

Coima da AdC: 350 mil euros

Coima pedida pelo MP: 350 mil euros

Também se mostra adequada, ainda que o procurador ressalve que ainda não saíram os resultados de 2021.

  • UCI

Coima da AdC: 150 mil euros

Coima pedida pelo MP: abaixo de 150 mil euros

É de baixar a coima aplicada à UCI, a mais baixa deste grupo de bancos, segundo o procurador.

  • Barclays

Coima da AdC: 8 milhões (dispensa na totalidade por programa de clemência)

Coima pedida pelo MP: menos de 500 mil euros (dispensa na totalidade por programa de clemência)

Foi o Barclays que deu origem ao processo, ao denunciar a existência de troca de informações, no fim de 2012. A coima da AdC, pelas suas infrações, era de 8 milhões, mas com dispensa total, por conta desse programa de clemência. O procurador diz que o cálculo deveria apontar as coimas para os 500 mil euros, mas, atendendo à “conduta”, até esses 500 mil euros devem ser reduzidos. Seja como for, esse valor não terá de ser pago devido à clemência.

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