16 fevereiro 2022 13:15
Foto: Getty Images
Eurodeputados preservam a cultura do vinho, admite a associação ACIBEV. Já o tabaco, que acabou por passar quase esquecido na discussão, acaba penalizado
16 fevereiro 2022 13:15
“O Parlamento Europeu recentrou a necessidade de se combater o consumo nocivo de bebidas alcoólicas no combate ao cancro e não o consumo per se”, comenta ao Expresso Ana Isabel Alves, secretária-geral da ACIBEV – Associação de Vinhos e Espirituosas de Portugal, vendo neste ponto uma vitória dos produtores de vinho contra “o fundamentalismo anti-álcool” em Estrasburgo.
O sector do vinho e também o da cerveja brindam, assim, “com moderação” à aprovação de algumas emendas decisivas no Relatório da Comissão Especial para a Luta contra o Cancro que esteve no centro das atenções dos eurodeputados na terça-feira e vai esta quarta-feira a votação final, em Estrasburgo, onde tudo indica que será aprovado, já que os diferentes grupos políticos admitiram ao Expresso, desde o princípio, que seria difícil recusar um pacote de recomendações contra o cancro.
Foi assim que tudo se jogou nas emendas, onde, como sublinha a ACIBEV, o sector do vinho, com “apoio significativo” dos deputados de várias famílias políticas dos países produtores (Portugal, Espanha, França e Itália) conseguiu substituir a referência indiferenciada ao consumo por uma sobre “consumo excessivo”, assim como evitar as advertências à saúde nos rótulos idênticas às das mensagens que acompanham os maços de tabaco por uma referência à “necessidade de consumo responsável, com moderação, já habitual na publicidade dos vinhos”.
Ao mesmo tempo, a proibição de patrocínios a eventos desportivos, especialmente dirigida aos produtores de cerveja, foi limitada a eventos dirigidos a crianças.
Já no que se refere à recomendação para aumentar os impostos sobre o álcool como forma de desincentivar o consumo, acabou por passar.
No balanço final, a responsável da ACIBEV fala de “um resultado positivo”, sustentando que “agora é tempo de a Comissão Europeia trabalhar em medidas legislativas focadas no consumo abusivo do álcool, que não ponham em causa a nossa cultura, as nossas comunidades, os nossos territórios e que respeitem a nossa tradição gastronómica de que o vinho faz parte”. E “não podemos baixar os braços nem desviar a atenção destes pontos”, acrescenta.
Alguma divisão entre eurodeputados
Frederico Falcão, da Viniportugal, fala numa “vitória parcial” do mundo do vinho relativamente a um relatório que não tem impacto direto em termos de legislação, mas vai indicando tendências, pode pressionar os diferentes estados a legislar e “tem de ser encarado com muita preocupação relativamente à forma como começou por tratar o álcool”.
Sobre a forma como votaram os eurodeputados portugueses, a indicação é que houve posicionamentos diferentes dentro de cada partido e mesmo em algumas emendas em especial, sendo que o voto eletrónico torna mais difícil uma análise conclusiva imediata.
O BE votou a favor da rotulagem, o PSD votou quase em conjunto ao lado dos produtores, com algumas exceções, mas no caso do PS, por exemplo, “houve alguma divisão, sim”, admite o eurodeputado e médico Manuel Pizarro, certo de que a maioria terá estado com ele e com os produtores de vinho.
A questão do tabaco
Manuel Pizarro sabe que “é inegável que o consumo de álcool é causa de alguns cancros” e até admite que “é difícil definir cientificamente o ponto a partir do qual o consumo de vinho, por exemplo, passa a ser nocivo”, mas na sua decisão pesou o facto de os estudos indicarem que o efeito causal do consumo de álcool em novos cancros anda nos 4%,”o que não pode ser esquecido, mas também não pode desviar o facto do problema bem mais grave do tabaco, responsável por 20% dos cancros e por 27% da mortalidade associada ao cancro”, comenta.
“Estamos a falar de um relatório sem valor vinculativo, mas também de uma evidência: neste relatório a questão essencial que é o tabagismo acabou por ver as atenções desviadas para o vinho e para o álcool”, acrescenta.
Mesmo assim, saúda o facto de ficar consagrado que “os novos produtos do tabaco têm de ser considerados da mesma forma do tabaco, sem esquecer o tabaco vaporizado, a adição de aromas e o cigarro eletrónico”, sustenta.