Milhares de documentos expõem organismo da UE que vigia concorrência fiscal desleal

Editor de Economia
Durante anos o professor holandês de Direito Fiscal Martijn Nouwen tentou obter junto da Comissão Europeia acesso à vasta documentação do grupo do Código de Conduta, o organismo criado em 1997 pela União Europeia para monitorizar os benefícios fiscais concedidos às empresas nos diversos Estados-membros e evitar uma concorrência fiscal desleal.
Nouwen acabou por ter acesso a um acervo de informação, que decidiu partilhar com a revista alemã “Der Spiegel”, que o partilhou com o consórcio EIC – European Investigative Collaborations, de que o Expresso faz parte, e com o jornal sueco Dagens Nyheter.
O projeto “The Code”, do EIC, compila e analisa mais de 2.500 ficheiros que cobrem quase 24 anos de atividades do grupo do Código de Conduta e que mostram como este organismo, que opera através de representantes das autoridades tributárias dos diversos países europeus, foi gerindo ao longo do tempo temas sensíveis no que toca à fiscalidade que incide sobre as empresas (o escopo do Código de Conduta não inclui a tributação sobre contribuintes individuais), incluindo os benefícios fiscais que lhes são concedidos.
Nouwen acabou por descobrir que a Comissão Europeia apagou grandes quantidades de mensagens de correio eletrónico com mais de 6 meses.
Um dos pontos de interesse do académico holandês eram os acordos fiscais (tax rulings) que, sobretudo a partir de 2014, com o Luxleaks, deram uma maior visibilidade ao grupo do Código de Conduta.
Martijn Nouwen doutorou-se em 2020 com uma tese sobre o grupo do Código de Conduta e foi um dos co-fundadores de um projeto de investigação sobre transparência fiscal, tendo obtido um apoio da Adessium Foundation que lhe permitiu criar uma pequena equipa para investigar a lista negra de paraísos fiscais da União Europeia e matérias como a transparência e a evasão fiscal.
No acervo que Martijn Nouwen obteve, e que partilhou com a “Der Spiegel” e com o EIC, inclui-se também documentação relativa a Portugal, e a interações que ao longo dos anos a administração fiscal lusa teve com o grupo do Código de Conduta.
No que concerne a Portugal, um dos temas em cima da mesa foi a Zona Franca da Madeira. Outro, mais recente, explorado a partir de 2017, foi o do regime da Remuneração Convencional do Capital Social, um benefício fiscal criado em 2008 para incentivar a capitalização das pequenas e médias empresas.
O Ministério das Finanças adiantou ao Expresso que esse instrumento, que todos os anos tem permitido a milhares de empresas poupar milhões de euros em impostos (com um limite de 29.400 euros por firma), é um de “três benefícios fiscais de elevada complexidade” que irão ser avaliados num projeto do Fundo Monetário Internacional, cujas conclusões serão apresentadas no próximo ano.
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