O conselho científico consultivo do Budget Watch decidiu atribuir a nota de 45,9% à proposta de Lei do Orçamento do Estado (OE) para 2021.
“Insuficiente quanto ao seu rigor e transparência orçamental” foi a classificação atribuída pelo painel de 20 economistas que analisaram a proposta do governo na ótica de dez princípios de responsabilidade orçamental.
Desde o seu lançamento, em 2010, que a iniciativa Budget Watch vem chumbando os sucessivos OE submetidos à Assembleia da República. A novidade é que o OE2021 (45,9%) obteve uma nota pior do que o OE2020 (48%), interrompendo a tendência de melhoria dos últimos anos.
“O valor global atingido este ano diminui, ao que não é certamente alheio o impacto económico e social da pandemia, que realça ainda mais a importância da transparência e escrutínio das contas públicas”, dizem os peritos.
Nesta edição do Budget Watch, dinamizada pelo Institute of Public Policy (IPP) com o apoio do Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), registaram-se as votações dos seguintes economistas de diferentes universidades: António Afonso (ISEG), Eduardo Costa (Nova), Francesco Franco (Nova), Francisca Oliveira (Católica Porto), Francisco Nunes (ISEG), Joana Andrade Vicente (IPP), João Duque (ISEG), João Ferreira do Amaral (ISEG), João Jalles (ISEG), Jorge Santos (ISEG), José Alves (IPP), José Silva Costa (FEP), Linda Veiga (U. Minho), Manuela Arcanjo (ISEG), Miguel Cadilhe (U. Porto), Patrícia Melo (ISEG), Paulo Trigo Pereira (ISEG), Ricardo Reis (LSE), Susana Peralta (Nova)e Teresa Garcia (ISEG).
Para obviar esta permanente classificação negativa do Budget Watch, os peritos do IPP defendem mesmo a alteração da estrutura e conteúdo do Relatório do OE que o ministério das Finanças apresenta todos os anos ao Parlamento, distinguindo a análise técnica das decisões de política de uma forma mais clara e concisa.
Quanto ao atual Relatório do OE 2021, os peritos deixam várias recomendações para melhorar a sua transparência e rigor orçamental. Eis algumas das propostas:
- “Seria útil ter uma visão clara da natureza da política orçamental decidida pelo Governo, especialmente no contexto atual da pandemia COVID-19, que impõe severos impactos económicos e sociais à economia. Esta é passível de ser analisada essencialmente pela variação do saldo estrutural primário e a variação do hiato do produto. Acontece que, referente a variáveis essenciais, o Relatório do OE 2021 ou apresenta valores distintos em diferentes tabelas (como por exemplo para o saldo estrutural), ou nem sequer os apresenta (como por exemplo para o saldo estrutural primário), o que impossibilita uma análise clara e inequívoca da natureza da política orçamental a vigorar em 2021. Recomenda-se, nesse sentido, a reposição do gráfico que relaciona a variação do saldo estrutural primário com a variação do hiato do produto, para ser claramente identificada a natureza da política orçamental em Portugal”.
- “O Relatório do OE deveria apresentar um quadro síntese com a despesa efetiva consolidada de cada programa orçamental no ano orçamental e no anterior, e a variação percentual (com análise), permitindo uma leitura imediata das prioridades de despesa. Para além da componente de despesa pública, seria útil se cada programa orçamental apresentasse anualmente indicadores objetivos e comparáveis de desempenho (e.g. número e percentagem de portugueses com médico de família). Não é claro para nenhum cidadão qual a prioridade sectorial relativa da despesa pública no OE 2021”.
- “O debate público e político em torno da saúde tem sido caracterizado por divergências sobre a veracidade dos números, quer ao nível da despesa pública, quer ao nível do emprego público. Este problema só se resolve com mais e melhor informação. O IPP recomenda maior detalhe e qualidade de informação, tanto relativamente às despesas com pessoal, como à despesa com investimento público”.
- “O IPP recomenda maior clareza na separação dos orçamentos relativos ao sistema de proteção social de cidadania, por um lado, e ao sistema previdencial, por outro, os quais têm lógicas de funcionamento completamente diferentes, embora ambos sejam subsistemas do sistema da Segurança Social. Apesar disso, é também desejável uma visão consolidada, nomeadamente na avaliação das responsabilidades com pensões”.
- “O Ministério das Finanças, quer através da Direção-Geral de Tesouro e Finanças, quer através da Unidade Técnica de Acompanhamento e Monitorização do Setor Público Empresarial (UTAM), produz informação que não é integrada no Relatório do OE e que seria extremamente útil. É o caso dos indicadores sobre as empresas públicas reclassificadas e não reclassificadas (receitas totais, despesas totais, EBITDA, resultados líquidos, rentabilidade do capital próprio, etc.). É também o caso de um quadro síntese com o esforço financeiro líquido anual com o Sector Empresarial do Estado nas suas principais rúbricas, a saber: indemnizações compensatórias, dotações de capital, empréstimos concedidos, assunção de dividas e, do lado da receita, dividendos. Ao esforço financeiro anual, deveriam adicionar-se as novas garantias concedidas”.
- “O aprofundamento do processo de descentralização política e administrativa em curso, nas diferentes áreas da governação, exige maior clareza. Assim, no âmbito da estratégia de descentralização, devem ser discriminados os montantes de transferências que já se realizavam ao abrigo das Leis de Finanças Regionais e Locais das novas transferências associadas às novas atribuições e competências, com as necessárias desagregações, quer sectorial, quer territorialmente”.
- “A Direção-Geral do Orçamento (entidade responsável pela elaboração do OE no Ministério das Finanças) deve clarificar adequadamente a sua necessidade atualizada de recursos (humanos e técnicos), por forma a poder levar a cabo eficazmente a sua missão. Não estando disponíveis os dados para 2020 (nem sequer para 2019, quanto ao número de efetivos), não se pode inferir quanto ao grau de cobertura, não sendo, assim, possível avaliar a evolução da necessidade de recurso a pessoal contratado externamente (não-efetivo). Era também interessante dispor de informação sobre a estabilidade laboral nesta entidade, pois uma elevada rotatividade de pessoal também poderá influenciar a capacidade de desenvolver um bom funcionamento dos serviços e atividades”.
Mais informação sobre a iniciativa Budget Watch estará disponível aqui.
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