Economia

Presidente da Comissão Europeia avisa grandes marcas da Web. António Costa aponta à digitalização

As conferências da Web Summit costumam ser aproveitadas para reciclar conhecimentos
As conferências da Web Summit costumam ser aproveitadas para reciclar conhecimentos
Tiago Miranda

Numa Web Summit 2020 realizada em videoconferência devido aos confinamentos, António Costa recordou a evolução de Portugal nos principais indicadores de inovação. Ursula von der Leyen lembra às grandes marcas da Net que há regras para respeitar

Pode o primeiro-ministro António Costa estar vestido de cinzento às 12h05 na Câmara Municipal de Lisboa para lançar a Web Summit 2020 e aparecer vestido de negro no Centro Cultural de Lisboa à mesma hora para falar sobre a presidência da UE? As tecnologias ainda não conseguem colocar a mesma pessoa em dois lugares diferentes, mas seguramente que terão contribuído para a gravação da mensagem de António Costa na cerimónia de inauguração da Web Summit 2020 nesta quarta-feira, juntamente com Paddy Cosgrave, que é o mentor do evento, e Fernando Medina, presidente da Câmara de Lisboa.

O primeiro-ministro aproveitou a participação no evento que decorre com várias videoconferências devido à pandemia para fazer um balanço sobre a digitalização em curso da sociedade nacional, mas não foi o único a abordar o tema. Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia, surgiu, pouco depois e, provavelmente com uma mensagem igualmente gravada, nos ecrãs desta Web Summit digital para deixar um aviso às grandes plataformas da Internet.

“As grandes plataformas ajudaram-nos no confinamento – e estão lucrar imenso com esta situação”, disse a presidente da Comissão Europeia, reiterando que o facto de nada ter contra os lucros alcançados pelas grandes empresas da Internet não a impede de deixar um alerta: “Estas plataformas não podem ser o novo leviatã”.

Ursula von der Leyen deu assim o mote num evento que costuma ser dominado pelas tecnologias e que a própria presidente da Comissão Europeia classificou como “um orgulho europeu”. E foi esse mesmo orgulho que a levou a retomar alguns dos argumentos sublinhados no passado recente pelo Executivo de Bruxelas.

A governante europeia também defendeu que as maiores plataformas da Internet “Não devem discriminar e beneficiar os seus próprios serviços”, e lembrou que os utilizadores são os donos dos dados e devem poder ter acesso ou eliminar esses dados sempre que quiserem. Von der Leyen não mencionou os nomes de Apple, Google, Facebook ou Amazon, mas só mesmo quem não tenha lido uma linha sobre o sector tecnológico nos últimos anos poderá imaginar outros destinatários que não estas quatro gigantes americanas que, nalguns casos, já foram alvo de processos de investigação e multas avultadas.

“O que é ilegal offline (fora da Internet) tem de ser ilegal também online (dentro da Internet)”, ditou a presidente da Comissão Europeia apontando a principal referência legal que tanto pode ser aplicada à venda de produtos ilegais ou contrafeitos como aos discursos de ódio. As maiores plataformas da Web terão de colaborar com as autoridades competentes, defendeu von der Leyen:. “Ninguém espera que sejam estas plataformas a analisar todos os conteúdos, porque isso seria uma ameaça às liberdades dos cidadãos”.

Apesar dos avisos às grandes marcas tecnológicas, a presidente da Comissão Europeia confessa-se otimista quanto à inovação que já garantiu o desenvolvimento de Inteligência Artificial (IA) que ajuda a detetar o cancro com maior precisão, ou quando cria sistemas de cirurgia mais precisos, ou quando abre caminho às vacinas contra a Covid-19.

Foram também as tecnologias que permitiram criar vias de comunicação alternativas durante a pandemia. Ursula von der Leyen lembra que os conhecimentos acumulados durante vários anos foram aplicados em apenas algumas semanas. “E por isso as pessoas sobreviveram ao confinamento”, concluiu.

A digitalização tem um protagonismo como nunca teve no roteiro de investimentos da UE, e Ursula von der Leyen não se esqueceu de aludir aos 20% de um bolo de 750 mil milhões de euros que vão diretamente para financiar as fundações de um mercado digital único. Criação de repositórios de dados comuns na saúde e na área da energia e investimentos na área da supercomputação e do desenvolvimento de processadores de nova geração, bem como a expansão das redes móveis de quinta geração (5G) mereceram menções da líder europeia. Que defendeu ainda que é hora de acabar com as barreiras entre estados-membros e evoluir para um mercado digital comum.

“Uma startup portuguesa que queira expandir-se para outros países da UE não pode ser obrigada a ter de se adaptar a todos os procedimentos que são diferentes”, defendeu.

Por seu turno, António Costa, na mensagem gravada no Município de Lisboa, assumiu as vestes de anfitrião, e tentou juntar a promoção da imagem de marca da Web Summit à evolução que Portugal tem tido em termos de inovação e tecnologias. Numa mensagem proferida em inglês que teve seguramente por principais destinatários os espectadores portugueses, o primeiro-ministro lembrou o aumento de 14% registado em 2020 nos alunos inscritos em cursos de tecnologias e engenharias, a entrada de Portugal “na liga dos campeões” dos indicadores de inovação europeus. A subida na escala da OCDE no índice de países que mais desenvolveram soluções de combate à Covid-19 e a captação de 23 projetos de investimento (18 deles durante a pandemia) na área das tecnologias também mereceram destaque.

Por fim, uma alusão à Europa: António Costa também prometeu levar a digitalização para a Presidência da UE, quando chegar a hora de desempenhar essa função rotativa, entre estados-membros.

“O mundo dos pós-pandémico será diferente. Cabe-nos garantir que vai ser um mundo melhor”, afirmou o primeiro-ministro português.

Fernando Medina também voltou a marcar presença na cerimónia de abertura, mas não se alongou muito. Reiterou que a Web Summit ajudou a posicionar “Lisboa como uma das principais capitais de inovação no mundo” e, perante a assistência em videoconferência, deixou uma promessa para o pós-covid-19: “Tenho a certeza de que em 2021 vamos estar de regresso a Lisboa”.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: senecahugo@gmail.com

Comentários
Já é Subscritor?
Comprou o Expresso?Insira o código presente na Revista E para se juntar ao debate