Economia

Uma palavra da restauração para António Costa: “inaceitável”

Uma palavra da restauração para António Costa: “inaceitável”
Rui Duarte Silva

“O primeiro-ministro tem uma estratégia clara: manter os restaurantes sem clientes”, diz Daniel Serra, da ProVar. “Fomos escolhidos para ser o bode expiatório da pandemia", acrescenta

"Senhor primeiro-ministro, tudo isto é inaceitável." É assim que Daniel Serra, presidente da associação de restaurantes ProVar, reage ao Expresso após as declarações do primeiro-ministro sobre o encerramento do comércio e da restauração ao fim de semana, depois de uma série de informações contraditórias e falhas de comunicação.

Depois de alguns dias de contestação, dúvidas e pedidos de esclarecimentos sobre o que se ia passar nos dois próximos fins de semana, ouvir o primeiro-ministro anunciar que os restaurantes só podem trabalhar depois das 13h de sábado e domingo para entregas ao domicílio foi mal recebido por um sector que já saiu à rua para se manifestar em alguns pontos de país e promete continuar os protestos no fim de semana, sem pôr de lado a hipótese de uma providência cautelar.

Se as pessoas não podem circular a partir das 13h, o pico semanal da procura do sector é cortado pela raiz e, em cima disso, o primeiro-ministro anuncia que a atividade da restauração fica limitada às entregas ao domicílio. Quando os supermercados podem ter serviço de take-away, todas as associações do sector falaram em “discriminação”, lembrando que na primeira fase do estado de emergência tiveram esta janela de negócio aberta.

"O primeiro-ministro tem uma estratégia clara: manter os restaurantes sem clientes. Considera certamente que somos o grande foco de contaminação do país. Não sabemos porquê, talvez tenha números que nós não temos", diz o presidente da ProVar.

"Aliás, quando Costa anuncia que o ivaucher, anunciado como uma medida para dinamizar o sector na proposta de Orçamento do Estado para 2021, só vai estar operacional no final da pandemia dá mais um sinal da forma como vê atualmente a restauração", acrescenta.

Mas para o sector também é "inaceitável" ver o Governo propor um apoio de 20% pela perda de receitas nos dois fins de semana face à média dos 44 fins de semana anteriores (janeiro a outubro). "Estamos a falar de um período em que os restaurantes estiveram muito tempo fechados ou quase fechados, com receitas muito abaixo do habitual. Ter este período como padrão é surreal", afirma. "E prova mais uma vez que fomos escolhidos para ser o bode expiatório da pandemia", acrescenta.

"A favor da Uber"

É verdade que o sector viu nascer uma inovação municipal que pode ter réplicas no país: a Câmara de Matosinhos assegurou um serviço de refeições ao domicílio gratuito neste e no próximo fim de semana, numa parceria com a cooperativa de táxis local para servir o concelho e 54 freguesias da Maia, de Vila do Conde, de Gondomar e do Porto. Mas mesmo isso parece pouco quando a Restauração, Similares e Alojamento perderam mais de 49.000 postos de trabalho no 3º trimestre de 2020 e, de acordo com o último inquérito da AHRESP, outra associação deste sector, 41% das empresas ponderam ir para insolvência.

E na análise que fez da situação desde o primeiro momento, Condé Pinto, diretor-geral da APHORT - Associação Portuguesa de Hotelaria e Restauração, assumiu que o Governo parecia "estar a desistir da restauração" e "a legislar a favor da Uber, "a única empresa que parece sair a ganhar de tudo isto".

Sobre a compensação de 20%, "sem querer parecer pobre e mal agradecido" não deixa de lamentar um critério assente "no apuro de meses em que os restaurantes foram muito, muito, penalizados" e "a visão de curto prazo que envolve tudo isto quando temos um problema que vai durar muitos meses". "E agora que fica ainda mais claro que muita gente vai ficar pelo caminho era importante o Governo pensar em medidas que permitam a estas pessoas sair com dignidade do negócio da restauração", conclui.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: mmcardoso@expresso.impresa.pt

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