Cerca de 2 mil milhões de euros é o valor dos dez maiores negócios imobiliários de 2020 fechados até ao final da semana passada, adiantou ao Expresso, António Gil Machado, diretor da Iberian Property, o novo banco de dados do universo empresarial da Confidencial Imobiliário que acompanha a atividade de investimento em Portugal e Espanha.
Apesar do abrandamento da atividade devido à pandemia, os analistas ouvidos pelo Expresso salientam que o mercado imobiliário nunca parou e que o clima marcado pelas baixas taxas de juro e de grande liquidez deverá continuar a estimular o setor imobiliário. Logística de proximidade e construção de habitação para arrendamento são algumas das tendências de procura.
“Existe uma grande apetência para investir em imobiliário, em virtude de um excesso de liquidez que nunca aconteceu nas últimas décadas”, diz Gil Machado. Para o diretor da Iberian Property, o investimento imobiliário surge quase como um “refúgio”, sendo talvez a principal alternativa às taxas de juro negativas e ao risco acionista.
“Neste momento, há a perceção que existe no mundo uma liquidez excessiva devido aos sucessivos planos de estímulo às economias feitos pelos bancos centrais, organizações internacionais e governos. Ao mesmo tempo, os investimentos de renda fixa, como Títulos da Dívida, Obrigações do Tesouro, têm juros negativos”, explica António Gil Machado.
Quanto ao imobiliário, os ativos preferidos pelos investidores são os de menor risco. “Até 2019 havia ativos imobiliários de maior risco (inquilinos) e que estão ser preteridos para ativos de renda estável e assegurada”, acrescentou Gil Machado.
“Arrancámos o ano de 2020 com um 1º trimestre muito forte, que registou um volume de investimento imobiliário acima dos 1,48 mil milhões de euros – quase três vezes superior ao mesmo período do ano passado – com grandes transações em diferentes segmentos: dos escritórios à hotelaria, passando pelo retalho e outros usos”, afirma Pedro Lancastre, CEO da consultora JLL.
Daí, que algumas das maiores transações do ano tenham sido no setor de retalho – centros comerciais - hotelaria e escritórios. Exemplo desta tendência foi o até agora maior negócio do ano materializado na venda de 50% da ‘joint-venture’ Sierra Prime pela Sonae Sierra e APG à Allianz Real Estate e Elo, por cerca de 800 milhões de euros. Um negócio fechado em meados de fevereiro, poucas semanas antes de ter sido declarada a pandemia. Outro exemplo pré-pandemia é a compra pela Palminvest - proprietária da rede Hollinday Inn Express em Portugal – por 300 milhões de euros do portefólio do grupo Bernardino Gomes, que inclui as doze unidade da cadeia Hotéis Real. Nos escritórios, já em março, houve por exemplo a compra pela Cofidis da Natura Towers à Caixa Geral de Depósitos por 46 milhões de euros ou a recente transação do Lagoas Park.
Segundo dados da JLL para o primeiro trimestre, o setor de retalho representou 812 milhões de euros, a hotelaria 392 milhões e os escritórios 250 milhões. Para o segundo trimestre e coincidente com o estado de emergência, a consultora para dois negócios fechados em abril e um em maio contabiliza um valor de investimento em escritórios de 49 milhões de euros e de 40 mlhões para imóveis de uso misto.
Habitação para arrendamento e logística de proximidade
António Gil Machado considera que existe também muita vontade de investir em habitação e arrendamento para habitação a nível internacional. “É uma tendência que vai chegar a Portugal, mesmo que não exista um enquadramento perfeito para o arrendamento habitacional”, salienta o diretor da Iberian Property.
Sinal dos tempos de pandemia é também o crescimento das compras atavés da Internet, a que corresponde uma maior procura no segmento da logística. E, neste campo, um segmento que ganha importância é a logística de proximidade, o chamado “último quilómetro”, pequenos postos de distribuição com atividade noturna. António Gil Machado diz que neste momento em Espanha existe bastante animação na logística, um mercado mais sofisticado do que o português. “Em Portugal, este é um segmento onde vai necessariamente ter de existir maior procura. É uma oportunidade que se está a preparar e vai manter-se”, sintetiza.
Apesar da desaceleração do investimento provocado pela incerteza gerada pela Covid-19, para o CEO da JLL “a verdade é que os investidores não estão parados e Portugal continua no seu radar”. Pedro Lancastre dá como adquirido que 2020 vai ser sempre um ano de alguma incerteza no mercado. “Embora nos meses de Verão já tenhamos assistido a sinais de recuperação dos níveis de atividade, estes últimos 4 meses do ano vão ser fulcrais para consolidar este sentimento de retoma que está em marcha”, conclui.
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