Banqueiros alertam que a crise ainda não acabou. E o pior pode estar para vir
Líderes da CGD, BCP, Novo Banco e BPI recusam maioria das críticas nos apoios à economia e alertam que a crise pode prolongar-se
Líderes da CGD, BCP, Novo Banco e BPI recusam maioria das críticas nos apoios à economia e alertam que a crise pode prolongar-se
Jornalista
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O incumprimento vai aumentar, há empresas que vão falir e a recuperação económica poderá demorar mais do que um ano. Estes são alguns dos avisos deixados pelos principais banqueiros portugueses, que acreditam que o mais difícil da crise criada pela covid-19 ainda está para vir. Todos repetem que os bancos estão em melhores condições para ajudar a economia nos próximos tempos, mas, para já, recusam que estejam a falhar na ajuda aos empresários, como defenderam na SIC Notícias, no âmbito do CEO Banking Forum, uma parceria do canal televisivo com o Expresso e a consultora Accenture.
Aliás, às críticas de que os empréstimos garantidos pelo Estado ainda não foram disponibilizados às empresas (ainda esta semana o presidente do IAPMEI disse no Parlamento que só 28% dos créditos chegaram às empresas), os responsáveis da CGD, BCP, BPI e Novo Banco avançaram com números para responder, mas nem todos especificaram que parte do montante aprovado pelas sociedades de garantia mútua já chegou efetivamente às empresas. Em números gordos, os quatro bancos têm aprovados €3850 milhões no âmbito das linhas de crédito garantidas pelo Estado.
Paulo Macedo antecipou que a Caixa deverá acabar com cerca de €800 milhões de créditos aprovados, a que se juntam €1450 milhões no BCP, segundo Miguel Maya. António Ramalho revelou que o Novo Banco tem €1000 milhões, dos quais €400 milhões já chegou às empresas, €160 milhões estão disponíveis e o resto está em trânsito. Já o CEO indigitado do BPI, João Pedro Oliveira e Costa, falou em €600 milhões, dos quais 52% já contratados, sublinhando que o BPI “disponibiliza logo 20% quando o crédito está aprovado”, o valor que corre por conta do risco do banco.
“O dinheiro está a chegar, com uma banca que está a cumprir o seu papel, da mesma maneira que o Governo está a cumprir, com políticas anticíclicas”, declarou Macedo, acrescentando que é sempre “fácil” e “popular” criticar os bancos. Miguel Maya argumentou que a banca não tem incentivo nenhum em não emprestar. É preciso olhar para o quadro completo, referiram. E que quadro é esse?
Macedo e Maya frisaram que nem todas as empresas “estão desesperadas por dinheiro” nem “aflitas”. Nem todas querem o dinheiro para já — aliás, Maya sublinhou que há empresas prudentes a quererem abrir o crédito, mas para se salvaguardarem, ao contrário de outras empresas que estão mais aflitas.
Até já há pontos positivos a correr. Oliveira e Costa nota já que existe uma tímida reanimação económica após o confinamento. “O crédito a pequenos negócios tem vindo a aumentar”, disse. No crédito ao consumo e na utilização de cartões de crédito ainda não há esse avanço, mas “o crédito à habitação aumentou de uma semana para a outra”. Há esperança no programa europeu de apoio à economia, mas também há dúvidas sobre a capacidade orçamental de Portugal face aos restantes países.
Mas se a pressão sobre a intervenção da banca no país tem sido já elevada (já se fala em comissões de acompanhamento parlamentar da chegada dos apoios à economia), o tempo vai intensificá-la ainda mais. “O papel da banca vai ser muito mais importante na segunda fase da reconstrução, que vai ser muito mais difícil”, declarou António Ramalho.
“A crise é pior, mas há um outro consenso, embora menos falado: é que os bancos estão muito mais bem preparados para esta crise”, declarou Paulo Macedo. Só que há também mais incertezas, nomeadamente por tudo depender da saúde. Até haver vacina, haverá “algum crescimento da procura, mas em valores abaixo do que será desejável”. E, com os empréstimos concedidos, não há propriamente investimento a ser feito. “Estamos a pôr dívida sobre dívida, mas é dívida para tesouraria e não dívida para investimento”, continuou.
A realidade futura é com o crescimento do crédito malparado. Vai depender dos prazos das moratórias de crédito, atualmente a permitirem que as empresas e os particulares não paguem as prestações até ao fim de setembro. “É óbvio que é preciso prolongar essas moratórias. O final do ano não é suficiente”, continuou Miguel Maya, acrescentando que “tudo o que seja menos do primeiro trimestre de 2020 é pouco”. Há sectores, até, em que a suspensão das prestações deveria ocorrer mais tarde, como a hotelaria e a restauração.
“Os bancos, se forem atrás do ruído, aguentam pouco tempo. Se nos mobilizarmos para fazer diagnósticos corretos, se unirmos esforços, estou absolutamente convencido de que o sistema financeiro tem condições” para o apoio à economia, frisou o líder do BCP, que, assumindo-se otimista, deixou um alerta: “Ninguém se iluda, que há aqui 15% a 17% das empresas que não têm condições para sobreviver.”
Quanto às medidas do Governo nesta fase inicial, a ideia geral é de que foram rápidas e adequadas, mas o pacote aprovado por Bruxelas esta semana — €750 mil milhões, dos quais €500 mil milhões a fundo perdido — será muito importante.
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