Economia

Covid-19. “Vai ser uma crise como nunca houve”, avisa o FMI

Covid-19. “Vai ser uma crise como nunca houve”, avisa o FMI
Remo Casilli/Reuters

O Fundo Monetário Internacional confirma, esta quinta-feira, que, em 2020, a economia mundial vai registar uma recessão, mas deixa para a próxima semana o anúncio da dimensão do trambolhão. A diretora-geral Kristalina Georgieva, no discurso de abertura da assembleia da primavera, fala de retoma no próximo ano, mas avisa já que será “parcial”

“Vai ser uma crise como nunca houve”, afirma Kristalina Georgieva, a diretora-geral do Fundo Monetário Internacional (FMI), no discurso de abertura, esta quinta-feira, dos trabalhos da assembleia da primavera da organização. Uma reunião magna que, este ano, vai ser em modo virtual.

O FMI confirma que o ano de 2020 vai registar uma recessão, mas ainda não avança a dimensão da queda do Produto Interno Bruto mundial.

O anúncio do trambolhão vai ser feito na próxima terça-feira quando Gita Gopinath, a economista-chefe do FMI, apresentar a primeira edição do ano do World Economic Outlook (WEO), a bíblia de previsões macroeconómicas e de recomendações.

Que o quadro macroeconómico mundial mudou subitamente nos dois últimos meses já se sabia. Mas Georgieva acentua as cores negras dessa mudança: “Há três meses esperava-se, em 2020, um crescimento do rendimento per capita em 160 países membros do FMI. Agora, o número foi virado de pernas para o ar: projetamos que 170 países vão registar, este ano, um crescimento negativo do rendimento per capita”.

Em janeiro, quando o Fundo apresentou uma primeira revisão das previsões que tinha feito no último WEO do ano passado, o crescimento mundial em 2020 foi revisto em baixa de 3,4% para 3,3%. Os Estados Unidos deveriam crescer 2%, a Zona Euro 1,3% e a China 6%. Agora, olhando para previsões que já foram avançadas, a economia mundial poderá cair entre 1 e 3%, segundo a OCDE. O Institute of International Finance, o lobi da finança privada mundial, aponta para uma recessão de 2,8% à escala global.

Georgieva diria, depois, em entrevista à Bloomberg rádio e televisão, que seria seguramente "a pior desde a Grande Depressão" dos anos 30 do século passado.

Por seu lado, Christine Lagarde, presidente do Banco Central Europeu (BCE), aponta como "hipóteses" dois cenários de recessão na zona euro em 2020, dependendo da duração da crise sanitária. Em entrevista na quarta-feira ao Le Parisien, a francesa aponta para uma quebra de 3,5% a 4% no cenário otimista e de 9% a 10% no cenário pessimista.

Retoma em 2021 vai ser parcial

Fiel à ideia de um ciclo em “V”, o FMI antevê uma retoma em 2021. Mas avisa, desde já, que será “parcial”, e que tudo depender de como vai abrandar a pandemia do coronavírus no segundo semestre deste ano.

Há “uma tremenda incerteza” sobre a duração da crise pandémica, diz Georgieva. “Até pode piorar”, acrescenta, recordando que não está posta de parte pelos epidemiologistas a possibilidade de um segundo surto. Há um aviso que deixa: “É um falso dilema” encarar a pandemia como se tivesse de haver uma escolha política entre salvar vidas ou salvar a economia.

Sobre como vai ficar a economia mundial depois do choque desta pandemia, quais as mudanças estruturais que se vão observar, Georgieva diz que é uma das grandes incógnitas.

A diretora-geral congratula-se com a resposta já dada pelos países membros. Segundo contas do Fiscal Monitor, um relatório do FMI dirigido por Vítor Gaspar, que vai ser publicado na próxima quarta-feira, os impulsos orçamentais em todo o mundo já somam 8 biliões de dólares (€7,3 biliões), 9% do PIB mundial.

Em alguns países já se superou essa fasquia média em percentagem do PIB, como nos Estados Unidos com um pacote de 2,5 biliões de dólares (€2,3 biliões), equivalente a 12% do PIB, ou na União Europeia, onde, segundo as contas de Valdis Dombrovskis, vice-presidente da Comissão Europeia, o impulso orçamental e as garantias à liquidez somam 14% do PIB da União.

Segundo as contas de Lagarde, na entrevista ao Le Parisien, o esforço na zona euro soma já €2,4 biliões, o que representa 19% do PIB dos 19 da moeda única.

No entanto, Georgieva diz que é “essencial” que os estímulos orçamentais sejam “coordenados” e que os países que têm “folga orçamental devem fazer mais”, enquanto os que estão limitados de recursos “devem ser apoiados”.

Resposta dos bancos centrais foi “massiva”

Na política monetária a resposta imediata foi “massiva”, diz a diretora-geral do Fundo.

De facto, só em março registaram-se 69 decisões de corte das taxas diretoras e diversos bancos centrais já avançaram com programas de compra de ativos.

Nuns casos reabrindo-os sem teto de aquisições ou data para o fecho (como a Reserva Federal norte-americana), noutros lançando-os pela primeira vez (como o Banco da Reserva da Austrália a partir de 20 de março), ou, ainda, reforçando-os (como o Banco Central Europeu que criou inclusive um programa especial até final do ano de €750 mil milhões, que foi iniciado a 26 de março).

A finalizar a sua intervenção de abertura da assembleia, a diretora-geral afirma que o Fundo tem 1 bilião de dólares (€920 mil milhões) para emprestar a quem necessitar nesta crise, adiantando que 90 países membros já pediram apoio. É uma procura de apoios jamais vista desde a fundação do FMI em 1945, refere Kristalina Georgieva. Garante que "onde o Fundo não possa emprestar porque se verifica insustentabilidade da dívida, olharemos para outras soluções".

No final do mês passado, a UNCTAD, o organismo das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento, foi mais longe nas sugestões ao FMI. Além do bilião para emprestar aos aflitos, propôs que o Fundo liderasse a proposta de um jubileu (perdão) na dívida das economias em desenvolvimento que vença este ano e que a organização avance com um Plano Marshall contra a crise sanitária naqueles países na ordem de 500 mil milhões de dólares (€460 mil milhões).

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