Economia

Covid-19. Media pedem apoios “urgentes”

Surto da covid-19 fez soar os alarmes e levou a Plataforma de Media Privados a apresentar ao Governo medidas “urgentes”
Surto da covid-19 fez soar os alarmes e levou a Plataforma de Media Privados a apresentar ao Governo medidas “urgentes”
José Fernandes

Quebras publicitárias provocadas pela pandemia fazem tremer um sector já debilitado

Covid-19. Media pedem apoios “urgentes”

Pedro Lima

Editor-adjunto de Economia

Ainda nem há quatro meses várias entidades, com o Presidente da República à cabeça, defendiam a urgência de tomar medidas de apoio à comunicação social. Em causa estava a crise estrutural vivida pelo sector, acelerada pela crise financeira e económica iniciada em 2007 e 2008. Mal podiam imaginar o que aí vinha: a situação de emergência criada pela pandemia de covid-19 fez soar os alarmes e levou a Plataforma de Media Privados (PMP) a apresentar ao Governo medidas “urgentes” e para serem implementadas de imediato.

Luís Nazaré, diretor executivo da plataforma que junta os grupos Cofina, Global Media, Impresa, Media Capital, Público e Renascença, diz ao Expresso que, entre essas medidas (ver caixa), a definição do regime de manutenção de postos de trabalho e do lay-off é prioritária. “São mecanismos pouco ágeis, burocratizáveis, que não preveem a possibilidade de os regimes serem utilizados de forma diferenciada pela mesma empresa. É importante que a sua implementação seja rápida. Esta questão tem muito impacto, não só a nível financeiro como na organização do trabalho.”

A aplicação imediata da taxa de 0% no IVA das assinaturas de publicações perió­dicas digitais, assim como nos serviços associados à sua distribuição em papel, é outra das medidas preconizadas, associada à suspensão da liquidação do IVA dos pontos de venda. Ao mesmo tempo, o Estado poderá apoiar contratando campanhas de publicidade e voltando a ser o “grande anunciante” que já foi. Outra proposta é a suspensão das várias taxas aplicadas ao sector.

Luís Nazaré lembra que esta é uma crise dentro de outra. Fala em especial da imprensa, referindo que muitos jornais têm apostado na transição digital, onde “as receitas não compensam a redução das do papel”. E aqui volta à baila uma das reivindicações dos grupos de media nos últimos anos: a tributação de plataformas globais, como a Google ou o Facebook. “As receitas de publicidade existem, mas estão a ser canibalizadas por grandes entidades que não pagam impostos. É imoral.”

O facto de a Comissão Europeia dizer que está atenta “não basta”. “A OCDE também diz que está, mas depois os EUA bloqueiam a ação. Bruxelas tem-se respaldado na posição da OCDE.” E recorda que alguns países europeus decidiram avançar com essa tributação por não quererem esperar por uma posição comum. Mas em Portugal “a Assembleia da República não teve coragem de ir em frente”.

RECEITAS EM QUEDA LIVRE

Na carta enviada ao ministro da Economia e ao secretário de Estado do Cinema, Audiovisual e Media, a PMP realça “um decréscimo homólogo das receitas superior a 20%”, mas Luís Nazaré diz que ainda é cedo para se ter noção exata do grave impacto que o surto está a ter — e aponta previsões internacionais que referem reduções de 40% a 60% das receitas dos grupos de media.

A PMP avançou também com propostas aplicáveis às empresas de todos os sectores, como a redução da taxa social única, a melhoria das condições prestadas pelo sistema bancário e a criação de linhas de crédito. Luís Nazaré espera que o Governo anuncie uma decisão “dentro de dias”.

Certo é que o panorama atual já levou alguns grupos a agirem. “Há um tipo de publicidade no qual é inevitável haver quedas, como na área do turismo e viagens”, sublinha o presidente executivo da Impresa, Francisco Pedro Balsemão. “Temos, por isso, que captar publicidade junto daqueles que mantêm algum tipo de comunicação, como os hipermercados, ou dos que podem crescer com a crise, como o comércio digital.” Ajustar custos também será essencial, embora nem a Impresa nem a Media Capital queiram “cortar no pessoal”. A dona da SIC e do Expresso prevê apenas reduzir alguns custos temporários, não antecipando despedimentos, à semelhança do grupo presidido por Luís Cabral. “Posso ter lay-offs numa área ou noutra, mas à data não há despedimentos em curso. Não nos podemos precipitar”, indica o líder da Media Capital, que detém a TVI. E recorda que o foco agora é “garantir que os media não param”, tendo o Estado que assegurar que “continuam a cumprir a missão de informar, aconselhar, tranquilizar — e entreter”.

Também o Sindicato dos Jornalistas (SJ) “enviou um apelo ao Governo para que aprove o quanto antes um pacote de apoios à comunicação social, sob pena de o sector colapsar. A quebra de receitas publicitárias, o adiamento de investimentos e projetos editoriais e o decréscimo nas vendas de publicações perió­dicas vão acentuar-se”, diz ao Expresso a presidente do SJ. Sem detalhar medidas, Sofia Branco realça que “estas devem garantir postos de trabalho e salários” e apoiar os jornalistas sem vínculo laboral — que são um terço dos jornalistas portugueses e que “poderão deixar de ter trabalho” —, assegurando-lhes um rendimento mínimo. Em janeiro, o SJ apresentou um pacote de propostas para serem integradas no Orçamento do Estado para 2020, mas quase nenhuma foi atendida pelo Governo.

APELOS EM TODO O MUNDO

Não é só em Portugal que o cenário é negro. Espanha prevê quedas de 50% nas receitas publicitárias em abril, Itália entre 25% e 30% no primeiro semestre e, nos Estados Unidos, o “New York Times” antecipa quedas de mais de 10% no primeiro trimestre.

Perante este cenário, associa­ções de editores de imprensa, rádio e televisão privadas lançaram um grito de alerta. Apesar da subida nas audiências e subscrições, as quebras naquela que é a principal fonte de receitas dos media ameaça gerar “um processo de ajustamento mais duro do que o da crise de 2008, com uma forte destruição de emprego e encerramento de jornais e emissoras”.

A Associação Mundial de Jornais e Editores fez um apelo aos Governos para aprovarem apoios para o sector, nomeadamente “linhas de financiamento para ultrapassar esta travessia do deserto, que vai ser muito dura”, disse ao jornal espanhol “Vanguardia” o presidente Fernando de Yarza. E alguns países, como Itália e Alemanha, já apresentaram soluções.

ALGUMAS PROPOSTAS

  • Flexibilização dos regimes de manutenção de postos de trabalho e lay-off para todo o sector, com base na verificação de decréscimo homólogo das receitas superior a 20%; possibilidade de aplicação parcial ou geral
  • Forte aquisição de espaço publicitário por parte do Estado, a preços de tabela, em todos os meios e plataformas para divulgação massiva das campanhas em curso: saúde, segurança pública, economia e outras
  • Taxa de 0% no IVA de assinaturas digitais e serviços associados à distribuição de publicações em papel; suspensão da liquidação de IVA pelos pontos de venda durante quatro meses
  • Eliminação das taxas da ERC e da ANACOM e isenção da taxa de exibição/audiovisual (4% das receitas) até ao final do ano
  • Regularização dos créditos com empresas de media
  • Comparticipação nos gastos de energia dos emissores de radiodifusão durante o período do surto
  • Suspensão das obrigações relativas à programação portuguesa e europeia, produção independente e quotas criativas, durante pelo menos quatro meses
  • Apoios à produção de conteúdos informativos e audiovisuais de origem nacional, como a majoração do investimento em produção portuguesa

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: mjbourbon@expresso.impresa.pt

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