À quarta não foi de vez, pelos menos para já. Depois da Portugal Telecom, da Ongoing e de a Altice terem equacionado comprar a Media Capital, proprietária da TVI, foi a vez da Cofina avançar, mas a operação poderá ter ficado pelo caminho com o falhanço do aumento de capital de 85 milhões de euros, um passo fundamental para que o negócio se cumprisse, e que já levou hoje à suspensão temporária das ações na Bolsa de Lisboa. Estava previsto que o negócio de compra da TVI, já com luz verde de todas as autoridades, ficasse concluído na segunda semana de março.
Há desde logo uma razão forte e evidente, a reviravolta radical no mercado de capitais, com as bolsas a viveram momentos de enorme incerteza e pânico, com quebras vertiginosas, por causa do chamado efeito coronavírus, algo que acelerou nas últimas três semanas, e que ninguém previa que viesse a acontecer. Esta é aliás a razão que a Cofina usou para justificar o cancelamento da operação, que passava também por uma oferta pública de aquisição (OPA). Em comunicado enviado às redações a empresa de media da Cofina justificou o fim do negócio com a impossibilidade de completar o aumento de capital destinado a financiar a compra de 94,69% Media Capital, por causa da "deterioração das condições de mercado". A compra TVI é uma das vítimas do coronavírus.
Ao contrário do que se esperava os investidores, nomeadamente os acionistas da Cofina, acabaram por mostrar menos interesse pela operação de aumento de capital de 85 milhões de euros do que era suposto, daí a operação ter falhado. Por que se desinteressaram é uma das questões a esclarecer, e uma das hipóteses, é mesmo o risco do negócio, já tradicionalmente sob forte pressão, ter aumentado. Uma coisa é certa, os acionistas da Cofina mostraram um cartão vermelho ao aumento de capital. O coronavírus é um dos argumentos apontados, mas fontes conhecedoras do processo admitiam que alguns, depois de conhecerem melhor as contas da Media Capital, estavam já a mostrar algumas reservas. A Media Capital teve um prejuízo de 55 milhões de euros em 2019, contra um lucro de 21,6 milhões em 2018. A pressão sobre a TVI aumentou nos últimos meses, com o canal a ser ultrapassado pela SIC na liderança das audiências televisivas. E o valor da oferta foi revisto no final de 2019 em 50 milhões de euros, depois de uma auditoria feita às contas, passando de 255 milhões para 200 milhões.
Quais terão sido os acionistas que se terão retraído não se sabe para já. Paulo Fernandes, o maior acionista individual da Cofina, seria quem iria ficar com uma maior posição, o segundo maior acionista da Cofina após o aumento de capital seria Mário Ferreira, que já se mostrou surpreendido com o fim do negócio. Por que não optaram por ficar com uma posição superior à inicialmente prevista é uma pergunta ainda sem resposta, mas uma das razões poderá ser necessidade de mais financiamento, admitem fontes financeiras. O Expresso sabe que os actuais acionistas subscreveram 65 milhões de euros, dos 85 milhões de euros do aumento de capital, mas não houve interesse.
Há falhas de aconselhamento e um excesso de confiança inicial no sucesso da operação, e um sinal disso é o facto de o aumento de capital não ter sido tomado firme pela banca ao contrário do que é habitual neste tipo de operações, defendem analistas ouvidos pelo Expresso. A assessorar o negócio está o Santander, o CaixaBank e a Societé Général.
Outro facto que poderá ter contribuído para o menor interesse tem a ver com o facto de o preço a que o aumento de capital foi colocado estar muito próximo dos valores de mercado a que a Cofina tem sido transacionada. Ou seja, não havendo desconto, como muitas vezes acontece nestas operações, o aumento de capital tornasse menos atrativo. Uma razões para esta opção de preço terá sido o facto de os acionistas da Cofina não quererem diluir muito a sua posição.
O negócio morreu mesmo?
Resta saber agora se Paulo Fernandes e a Cofina estão interessados em deixar cair o negócio de vez ou voltarão a ele, renegociando novos termos. Ao Expresso fontes próximas de Paulo Fernandes afirmam que o negócio morreu. Paulo Fernandes não quer fazer comentários e mantém o silêncio sobre esta decisão. Apesar de o negócio ainda não estar fechado, já havia pessoas da equipa da Cofina e ligados aos seus projetos editoriais a tomar decisões no dia a dia da TVI e a tomar o pulso à operação.
Poderá não ser assim tão fácil à Cofina desistir do negócio, a espanhola Prisa, dona da Media Capital, já veio dizer que a empresa liderada por Paulo Fernandes está a violar o contrato de promessa de compra e venda, e promete dar guerra. Em comunicado enviado à Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) pela Media Capital, a Prisa lembra que, “de acordo com as declarações feitas pela Cofina no acordo de compra e venda e em comunicados aos mercados", a empresa tinha "os compromissos necessários para financiar a quantia requerida para completar a transação, de uma lado por parte das instituições de crédito e, de outros, pelos principais acionistas da Cofina".
As consequências no âmbito oferta pública de aquisição (OPA) são para já nulas. A OPA ainda não estava registada, era ainda apenas preliminar, e tinha como claúsula suspensiva o sucesso de aumento de capital. Ou seja, se a Cofina e Paulo Fernandes assim o entenderem podem voltar a avançar com o negócio, uma vez que não terá de esperar meio ano, como aconteceria se tivesse lançado a OPA.
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