€700 de salário mínimo é muito ou pouco? Patrões ‘pegam-se’ nas redes sociais
Bruno Bobone, presidente da Câmara de Comércio e Indústria, recorreu ao LinkedIn para criticar António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial de Portugal. O líder dos empresários respondeu - tudo sempre “com muita amizade”
Em causa está a entrevista concedida esta semana ao Negócios e à Antena 1 por António Saraiva, presidente da Confederação Empresarial (CIP), onde o líder dos empresários considerava "perfeitamente razoável" um salário médio de 700 euros até ao final da legislatura, em 2023. Bruno Bobone, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP), utilizou a sua conta no LinkedIn para criticar a visão de António Saraiva que classificou de "redutora" instando o presidente da CIP a "lutar pelo estabelecimento efetivo de um salário digno". Saraiva respondeu. Aconselhou Bobone a "ler ou ouvir na íntegra a entrevista" e adiantou que "redutor é opinar sem a leitura completa do texto". Mas despediu-se sempre do seu opositor "com muita amizade".
"É uma visão profundamente redutora propor um aumento do salário mínimo para 700 euros em quatro anos. Há muito defendo que o importante não é o salário mínimo, mas sim o salário digno" foi este o argumento de Bruno Bobone que fez estalar o verniz entre os líderes da CIP e da CCIP. Bobone defendeu que "para estabelecer um salário digno que seja sustentável é necessário introduzir na equação a condição da produtividade".
"Com muita amizade, Bruno"
Os dois líderes trocaram argumentos, e o líder da CIP foi ainda interpelado por diversos comentadores remetendo sempre para a leitura integral da entrevista. Já Bobone relembrou Saraiva das diversas vezes em que lhe tinha dito que "que por diversas vezes é falta de ambição continuar a discutir o salário mínimo, que apenas garante a manutenção de salários baixíssimos no nosso país".
Para o líder da CCIP, "é fundamental atacar a causa dessa miséria e isso passa por transformar a produtividade numa mais valia do nosso país. Para isso é essencial envolver os trabalhadores e empresários numa cooperação tanto do lado do aumento da produtividade como do lado da distribuição do seu resultado".
Acrescentou que "enquanto não mudarmos, empresários e trabalhadores, continuaremos a ter pouca ambição e a ser coniventes com a pobreza do nosso país". E assinou: "com muita amizade, Bruno".
O salário mínimo subiu de 505 para 600 euros nos últimos quatro anos. Para a próxima legislatura não há ainda uma meta, com os partidos a defenderem estratégias diferentes. Enquanto PCP, BE e PSD querem que se voltem a fixar aumentos mínimos, o PS prefere centrar-se num acordo global para salários.
António Saraiva, em entrevista recente ao Negócios, foi desafiado a comentar se consideraria razoável que o salário mínimo subisse para os 700 euros no espaço de quatro anos, como defendera Pires de Lima, antigo ministro da Economia do CDS/PP. O líder da CIP respondeu que o valor "parece-me tão razoável como pode parecer outro qualquer… Cem euros durante a legislatura? Parece-me perfeitamente razoável, mas não estou com isto a amarrar a minha organização a que assim seja. [Porque] eventualmente até podemos ser surpreendidos. Se a economia o permitir até seria desejável que pudesse ser mais". E é esta declaração que Carlos Bobone considera pouco ambiciosa.
Esta não é a primeira vez que António Saraiva agita a classe empresarial com o salário mínimo. Em junho de 2018 o líder da CIP dizia, a propósito dos 600 euros, que a meta poderia ser ultrapassada - “provavelmente as confederações patronais vão surpreender a sociedade portuguesa”, afirmou. Na altura, contudo, as críticas não foram de falta de ambição, como agora, mas de falta de cautela.
Bruno Bobone, por seu turno, tem dado entrevistas a defender uma discussão alargada sobre o que é um salário digno no país, por considerar que o atual salário mínimo "não pode cuidar da sua casa, não pode cuidar da sua família, não pode dar qualquer expectativa de desenvolvimento e crescimento e era fundamental que nos preocupássemos em conseguir entregar às pessoas esse mínimo razoável de vida", como afirmou recentemente ao Dinheiro Vivo. O líder patronal também sustenta a necessidade de envolver os trabalhadores nas principais decisões no seio das empresas.