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Economia

Eleições. Empresas com grandes diferenças salariais penalizadas

Cozinheiros estão entre os profissionais mais procurados
Cozinheiros estão entre os profissionais mais procurados

No seu programa eleitoral, o PS avança com duas medidas que agradam à esquerda: castigar as disparidades salariais e dar voz aos trabalhadores nos salários e dividendos. Penalização poderá ser modulada em função da dimensão da empresa ou do sector de atividade em que opera, e assumir a forma de uma sanção fiscal

Há cerca de um ano, em entrevista ao Expresso, António Costa desafiou os gestores a fazerem uma alteração “radical” nas suas políticas salariais, diminuindo o fosso entre os salários dos gestores de topo e os do restante pessoal. Agora, no programa eleitoral, vai além do repto e garante que tomará medidas para penalizar as empresas onde há maiores disparidades.

Os pormenores finos estão longe de fixados, e em todos os programas eleitorais há medidas que acabam por ficar pelo caminho, mas fonte do gabinete de estudos do PS garante ao Expresso que esta intenção está madura e a medida é mesmo para avançar. Em pinceladas gerais, a ideia é calcular o nível de desigualdade entre os 20% de trabalhadores que mais ganham em Portugal e os 20% que ganham menos, no conjunto da economia. Depois disso, pegar no valor e confrontá-lo com o que acontece em cada empresa e, aquelas que ultrapassem o nível global, enfrentarão um mecanismo de penalização.

A penalização poderá ser modulada em função da dimensão da empresa ou do sector de atividade em que opera, e assumir a forma de uma penalização fiscal (por exemplo, as empresas poderão ver-se impedidas de deduzir como custo fiscal uma determinada percentagem da fatura salarial).

Em 2018 os socialistas chumbaram uma proposta do Bloco de Esquerda que impediria as empresas com elevadas disparidades de aceder a apoios públicos e fazer contratos com o Estado. Mas o PS garante estar firmemente empenhado nesta medida, até porque, agora, o contexto é diferente. Desde logo porque se fará passar a proposta pela concertação social, consultando os parceiros; depois, porque já se tem uma ideia sobre como operacionalizar uma medida desta natureza sem sobrecarregar as empresas com novas obrigações declarativas. “Não partimos do zero. Este instrumento vem em linha com medidas que já foram sendo tomadas, como a política de igualdade salarial entre homens e mulheres e a taxa da rotatividade, onde a informação se vai buscar quer ao relatório único quer à declaração de remunerações à Segurança Social”, não sendo necessário fornecer dados adicionais, explica a mesma fonte.

Amarguras à esquerda não comprometem apoios futuros

As alterações ao Código do Trabalho e a forma musculada como António Costa lidou com a greve dos motoristas e da Ryanair deixaram os parceiros da ‘geringonça’ amargurados com a política laboral do Governo socialista e desconfiados das suas intenções. “Esperamos que não seja um indicador do PS para o futuro”, atira José Soeiro, do Bloco de Esquerda.

Mas, se a intenção do PS for mesmo firme, a esquerda não deixará de garantir que ela tem pernas para andar. “Fomos nós que lançámos este debate, e não será por nós que não serão encontradas soluções”, diz Soeiro ao Expresso.

Francisco Lopes, da Comissão Política do PCP, também se diz disponível para o debate e avança desde já com duas achegas. Em primeiro lugar, para os comunistas, quando se fala de desigualdade, “a questão central é a parcela do que é produzido que reverte para os trabalhadores (salários) e a parcela que reverte para os lucros do capital”, um rácio que tem vindo a deteriorar-se em Portugal, mais rapidamente do que o ritmo médio europeu. Depois, é preciso que as desigualdades se reduzam por via do aumento dos salários mais baixos, porque “até pode haver empresas a reduzir o leque salarial por reduzirem os salários dos corpos gerentes, mas se lhes pagarem por fora, de outras formas, não resolve nada”.

As desigualdades salariais são um tema recorrente na agenda política e mediática que ganha nova visibilidade de cada vez que as grandes empresas apresentam os seus resultados anuais. Por cá, a Jerónimo Martins avulta quando se comparam salários médios e de topo nas sociedades cotadas, mas o caso da EDP e a remuneração global de António Mexia, condicionada sobretudo pelos prémios de gestão, é trazido amiúde à liça (ver gráfico). Mas, apesar de o debate se ter intensificado, tanto cá dentro como a nível internacional, a questão tem sido deixada sobretudo na esfera da autorregulação das empresas.

Os Estados Unidos, que obrigaram as empresas a divulgar publicamente o seu pay gap (o nível de disparidade entre salários mais altos e mais baixos), e Israel, que impediu os banqueiros de ganharem mais do que 44 vezes o salário mínimo pago no banco, são alguns dos poucos exemplos que se encontram sobre a interferência do Estado nesta matéria.

A concretizar este passo, o PS dá um passo inédito por cá e pisca o olho aos seus parceiros da ‘geringonça’, à semelhança do que faz com outra medida, também ela cara à esquerda, de pôr os trabalhadores a ter voz ativa na fixação dos salários e na distribuição de lucros aos seus acionistas.

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