Economia

Envio ao Fisco da contabilidade das empresas vai ter parecer prévio da Comissão Nacional de Proteção de Dados

Envio ao Fisco da contabilidade das empresas vai ter parecer prévio da Comissão Nacional de Proteção de Dados

Futuro modelo de submissão à Autoridade Tributária do polémico SAF-T vai ser sujeito ao crivo da entidade que acautela a Proteção de Dados, garante o Governo. A encriptação é uma das propostas e a chave poderá ficar na mão da Imprensa Nacional-Casa da Moeda

O Governo vai pedir um parecer prévio à Comissão Nacional de Proteção (CNPD) sobre o futuro modelo de submissão dos dados do ficheiro SAF-T, que agrega os dados da contabilidade das empresas e cujo envio, pelos contribuintes, à Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) passa a ser devido a partir de 2020. A encriptação da informação mais sensível ou que extravasa o âmbito das necessidades declarativas está prevista nas propostas do Executivo e a chave poderá ficar na mão da Imprensa Nacional-Casa da Moeda (INCM).

Estas intenções estão vertidas numa nota explicativa sobre o novo modelo de submissão do SAF-T, enviada à Comissão de Orçamento, Finanças e Modernização Administrativa (COFMA), pelo Gabinete do secretário de Estado dos Assuntos Fiscais (SEAF), António Mendonça Mendes, a que o Expresso teve acesso.

A nova obrigação de declaração ao Fisco do SAF-T ((Standard Audit File for Tax Purposes), que é um ficheiro normalizado de auditoria tributária, decorre de alterações, no sentido da simplificação, que o Governo pretende adotar no preenchimento da Informação Empresarial Simplificada (IES). A intenção é que alguns dos campos do novo modelo de submissão da declaração passem a estar pré-preenchidos pelos serviços de Finanças com base na informação previamente recolhida no SAF-T.

No seguimento da discussão sobre estas mudanças em sede da COFMA, o Governo vem agora esclarecer e propor como se irão operar as mudanças que tocam na questão sensível da proteção de dados das empresas.

É que os empresários são obrigados a ter SAF-T desde 2008, mas a AT só tem acesso a este ficheiro no âmbito de ações de inspeção. Ou seja, não estava previsto, como agora, o seu envio generalizado para o Fisco. Uma situação que preocupa várias entidades, nomeadamente a Associação Nacional Contabilistas (ANACO), que tem vindo a alertar para a ameaça de um ‘Big Brother fiscal’, bem como de várias associações patronais.

Aliás, a CNPD já se pronunciou uma vez, a pedido da COFMA, sobre as preocupações dos contabilistas e no parecer (datado do início da semana) é dito que “tem que ser assegurada a adoção atempada de medidas técnicas mitigadoras do impacto sobre a privacidade das pessoas singulares que figurem como clientes e fornecedores das empresas”.

Nesta nota explicativa a que o Expresso teve acesso, o Executivo menciona que tendo em conta “necessidades de fiabilidade, uniformidade e coerência da informação contabilística reportada por parte das empresas e tendo presente o princípio da proporcionalidade e as necessárias garantias dos contribuintes, propõe-se um modelo que seja suficientemente flexível e que garanta as diferentes necessidades dos intervenientes, criando uma solução opcional para o contribuinte que não aumente os custos de contexto já incorridos”.

Assim, põe à consideração dos deputados da COFMA, duas opções de proteção de dados, cuja escolha será deixada do lado dos contribuintes. A opção 1 consiste numa “solução sem qualquer aumento de custos de contexto, que garante a não utilização da informação de detalhe por parte da AT, fora do contexto de um procedimento inspetivo”.

Segundo o Governo serão dadas garantias adicionais, “consagradas num artigo do Decreto-Lei”, que impedem a disponibilização e utilização por parte do Fisco dos ficheiros SAF-T com todo o seu detalhe, exceto no âmbito de uma fiscalização. Para que isso aconteça, os detalhes dos ficheiros deverão ser eliminados das bases de dados da AT, ficando os SAF-T submetidos em formato xml, comprimidos (zipados) armazenados nesse formato, “só podendo ser disponibilizado o seu conteúdo em base de dados, no âmbito de um procedimento inspetivo promovido pela AT, após a notificação da respetiva carta-aviso”.

É ainda garantido que “a AT não poderá utilizar a informação de detalhe para emitir alertas, divergências, autos de notícia ou seleção de contribuintes para inspeção, pois o detalhe desta informação não poderá sequer ficar disponível para consulta ou para utilização aplicacional”.

A opção 2 é uma solução “que garante a encriptação da informação relativa a descrições”. Consiste na possibilidade de encriptação, por parte dos softwares de contabilidade (pelo contribuinte) – aquando da geração do ficheiro SAF-T da contabilidade para efeitos de submissão da IES –, dos campos relativos a “descrição”. Ou seja, segundo o Executivo, assim, ficaria garantido que “a AT não acede aos detalhes que possam de alguma forma identificar nomes de contas ou descrições de movimentos”.

É ainda proposta outra inovação. “Para que esta solução possa funcionar, com garantias para todos os intervenientes, propõe-se uma abordagem inovadora, com a intervenção de uma entidade independente (por exemplo, a INCM), que será responsável por gerar, disponibilizar e armazenar a chave de encriptação”. O Expresso sabe que já haverá contactos com a INCM nesse sentido.

O gabinete do SEAF frisa que a escolha pertence ao contribuinte e ressalva que “a opção 1 é sempre cumulativa com a opção 2, isto é, ainda que o sujeito passivo opte por não encriptar as descrições do ficheiro SAF-T”, a AT não poderá ter disponível a informação adicional fora de um contexto de procedimento inspetivo.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: ASSantos@expresso.impresa.pt

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