Fundos imobiliários do ex-GES têm apenas um caminho: desinvestir

Após venda da Comporta, antiga sociedade do GES aliena ou liquida fundos imobiliários
Após venda da Comporta, antiga sociedade do GES aliena ou liquida fundos imobiliários
Jornalista
É mais uma peça que é retirada ao puzzle do Grupo Espírito Santo. A sociedade gestora de fundos imobiliários Gesfimo —Espírito Santo Irmãos, responsável por gerir veículos como o da Herdade da Comporta, está limitada no seu trabalho. Já só poderá fazer desinvestimentos nos seus fundos imobiliários. Sem compras de novos terrenos ou imóveis.
A decisão foi tomada a 12 de março pela administração da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), mas deveu-se a um passo dado pela Gesfimo em dezembro do ano passado.
A sociedade, constituída em 1989, tinha em curso um procedimento de registo para a atividade de gestão de organismos de investimento imobiliário, à luz das novas regras do sector. Desistiu desse pedido no final de 2018. Segundo informações obtidas pelo Expresso, a razão prendeu-se com os custos: não fazia sentido ter encargos com a licença quando a gestão feita não é ativa.
A extinção do procedimento, decretada pelo regulador liderado por Gabriela Figueiredo Dias, tem uma implicação direta na operação da Gesfimo no que diz respeito ao investimento imobiliário: “A partir desta data, verifica-se a impossibilidade de realização de investimentos adicionais, devendo ser prosseguida uma política ativa de desinvestimento”, segundo indicam os regulamentos de gestão dos 11 fundos de investimento geridos pela Gesfimo e publicados a 20 de março.
Pelas palavras do revisor oficial de contas Amável Calhau, a decisão da CMVM impede os fundos geridos pela Gesfimo “de efetuar[em] quaisquer investimentos adicionais, além dos já existentes”, como indica a certificação legal de contas ao Herdade da Comporta — Fundo Especial de Investimento Imobiliário Fechado aos resultados do ano passado.
O fundo da Herdade da Comporta é um dos 11 geridos pela Gesfimo. Este instrumento acordou a alienação dos seus dois principais ativos imobiliários ao consórcio que junta a Vanguard Properties, de Claude Berda, e a Amorim Luxury, de Paula Amorim. A operação, no valor de €158 milhões, ainda não está totalmente fechada, mas servirá para que o fundo liquide a sua dívida de €124 milhões perante a Caixa Geral de Depósitos, além de viabilizar o investimento nos terrenos, localizados em Grândola e Alcácer do Sal.
Quando acontecer a transação, o fundo ficará praticamente esvaziado dos ativos mais valiosos, pelo que os restantes ou serão vendidos ou liquidados. É de “prever que, após a transação, seja deliberada dissolução e liquidação do fundo”, admite mesmo o relatório e contas do fundo relativo ao ano passado, publicado esta semana. A deliberação tem de acontecer até 2021, ano até ao qual o fundo tem autorização para permanecer em atividade.
Na prática, é também isto que irá acontecer aos restantes fundos, como os chamados FIMES, ou os vários veículos denominados Invesfundo (em que houve financiamento a construtores, entre os quais José Guilherme, que deu €14 milhões a Ricardo Salgado), que não poderão fazer aquisições adicionais no futuro.
Segundo dados que constam da CMVM, a Gesfimo gere ativos de €157 milhões nestes fundos, pelo que tem uma quota de mercado de 1,5%. Em dezembro de 2013, antes da derrocada do grupo, a quota era de 5,6%, quando geria mais de €700 milhões.
Esta sociedade, presidida por Pedro Melo Breyner, foi constituída em 1989, o mesmo ano em que foi autorizada a exercer a atividade de gestão de fundos de investimento. A Gesfimo pertence à Espírito Santo Property Portugal, sociedade que, por sua vez, está na posse da Rioforte, em insolvência no Luxemburgo, onde estava sediada. Os responsáveis pela sua insolvência já assumiam que os fundos imobiliários FIMES estavam a alienar os seus ativos, antecipando-se, por isso, a sua “liquidação no médio prazo”.
Contudo, a desistência não significa, só por si, que a empresa venha a deixar de existir. “Os efeitos não são automáticos, pelo que o cancelamento do registo para o exercício da atividade de gestão de organismos de investimento coletivo imobiliário junto da CMVM não implica automaticamente a desistência do processo de reautorização junto do Banco de Portugal. A sociedade pode, no âmbito da respetiva autorização, optar por desenvolver outra atividade permitida”, explica a assessoria de imprensa do Banco de Portugal em resposta ao Expresso.
“O processo de reautorização é exigido nos termos da lei para qualquer sociedade gestora que efetue a gestão de organismos de investimento alternativo, sendo que este conceito é mais amplo do que a mera gestão de organismos de investimento imobiliário. Nesta medida, cabe à sociedade definir se pretende desenvolver no futuro alguma atividade reservada (entre as quais, a gestão de fundos alternativos, que não sejam imobiliários)”, continua.
Não se sabe qual o futuro da empresa. O que é certo é que há um contacto entre os supervisores sobre o tema, como confirma a autoridade bancária: “O Banco de Portugal está a acompanhar o tema em articulação com a CMVM”.
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