Depois do Governo, PSD formaliza pedido de auditoria ao Novo Banco. E vão três
Novo Banco terá novo acionista, pelo menos em 2021: o Estado
FOTO JOSÉ CARLOS CARVALHO
O ponto de partida foi lançado pelo Governo: é preciso uma auditoria aos créditos dados pelo BES que pesam sobre o Novo Banco. Marcelo juntou-se e disse que é importante saber o que aconteceu quando o BES já era Novo Banco. O PSD alinhou na ideia e formalizou o pedido de uma auditoria independente aos últimos anos. São dois pedidos de auditoria quando a lei já prevê a realização de uma quando há injeções de dinheiros estatais. E o Novo Banco vai receber auxílio público este ano
O Governo e o Partido Social Democrata concordam num objetivo: é preciso uma auditoria ao Novo Banco. Mas o entendimento fica-se por aí: o Executivo pretende olhar para a origem dos créditos na época do Banco Espírito Santo; o principal partido da oposição quer olhar para o que correu mal após a intervenção do Banco de Portugal, em 2014. Aqui, os sociais-democratas têm um aliado de peso: trata-se de Marcelo Rebelo de Sousa. Estes pedidos são feitos quando, é certo, há uma outra auditoria que tem de ser feita, de acordo com a nova legislação.
O grupo de deputados do PSD liderado por Fernando Negrão assina um projeto de resolução, que deu entrada esta quarta-feira 3 de março, em que pretende que a Assembleia da República recomende ao Governo que “determine a realização de uma auditoria ao Novo Banco, por uma entidade independente por si designada sob proposta do Banco de Portugal, a incidir sobre o período pós-resolução e em especial a partir de 30 de junho de 2016”.
Créditos concedidos, decisões de investimento, condições da venda à Lone Star, imparidades e gestão de ativos problemáticos são alguns dos pontos que constam do pedido feito pelo PSD. Que agora tem de ser votado pelos restantes partidos. Na prática, o PSD consegue, com o projeto de resolução, comprometer o PS a uma decisão de aceitar ou reprovar esta auditoria, distante daquela que o Governo pretende.
O projeto do grupo parlamentar social-democrata ganha forma porque “a dimensão da injeção do Fundo de Resolução e da ajuda pública envolvida exige esclarecimentos e cabal compreensão das suas causas”. Em fevereiro, o Novo Banco solicitou 1.149 milhões de euros ao Fundo de Resolução à luz do sistema de compensação que este veículo acordou com a Lone Star aquando da alienação, um montante que soma aos 792 milhões pedidos no ano passado. Para satisfazer estes valores, o Fundo de Resolução pediu 430 milhões emprestados ao Estado em 2018 e deverá pedir cerca de 850 milhões no atual exercício – ainda é necessária a confirmação do número que vai ser pedido ao Fundo de Resolução.
Governo enganou? Ou houve algo errado na gestão?
Além do montante, o PSD diz que houve uma “contradição” que “agrava a necessidade desse esclarecimento”. “O Governo disse-se muito surpreendido com a dimensão da injeção requerida ao Fundo de Resolução, enquanto o Novo Banco e o Fundo de Resolução afirmam que a mesma era expectável”, lembra o partido.
E há aqui duas soluções avançadas pelos deputados: ou o Governo mostrou uma “alegada surpresa fingida” e escondeu esse facto, “enganando” os portugueses; ou “algo errado ou imprevisto aconteceu, seja no próprio negócio de venda, na gestão do banco ou dos ativos abrangidos pelo mecanismo de capital contingente”. O banco é, neste momento, liderado por António Ramalho.
Esse mecanismo é aquele que permite que o Novo Banco peça até 3,89 mil milhões de euros ao Fundo de Resolução pela desvalorização de um determinado conjunto de ativos tóxicos – sobretudo créditos problemáticos, mas também imóveis e fundos de reestruturação – e pelo dano que esta desvalorização causa nos rácios de capital. Tendo em conta os valores já pedidos, ainda pode ser solicitada a convocatória de metade do montante. Este mecanismo tem efeitos a partir de junho de 2016, daí o pedido do PSD.
Marcelo Rebelo de Sousa foi contra o Governo e defendeu necessidade de auditoria ao Novo Banco no pós-2014
RICARDO CASTELO
Um aliado chamado Marcelo
O PSD junta-se, assim, a Marcelo Rebelo de Sousa (que cita no seu projeto de resolução), que tinha já afirmado que “importa apurar o que se passou, não apenas na pré-história, isto é, até à resolução, mas depois da resolução, porque é neste momento que se trata de saber se é preciso mais dinheiro ou não e se é preciso saber para o futuro”.
Um grupo de economistas e de outros notáveis da sociedade civil, como o ex-vice-governador do Banco de Portugal João Salgueiro, também pagou uma publicidade nos jornais de circulação nacional em que faz a mesma defesa: o pós-resolução é que tem de ser escrutinado.
Governo tem outra ideia
Já o Ministério das Finanças – que foi quem lançou a ideia de uma auditoria ao Novo Banco – tinha outra ideia. O período a escrutinar é o anterior à intervenção determinada pelo Banco de Portugal, ou seja, quando os créditos que agora estão a dar problemas foram concedidos pelo Banco Espírito Santo.
“Dado o valor expressivo das chamadas de capital em 2018 e 2019, o Ministério das Finanças, em conjugação com o Fundo de Resolução, considera indispensável a realização de uma auditoria para o escrutínio do processo de concessão dos créditos incluídos no mecanismo de capital contingente”, apontou o Ministério das Finanças num comunicado divulgado em fevereiro passado, logo após o pedido de dinheiro feito pela instituição financeira àquele fundo financiado pela banca. O Governo quer uma auditoria semelhante à que foi feita à Caixa Geral de Depósitos: o que correu mal e falhou nos procedimentos.
Esta auditoria, por ser pedida por um acionista, precisa de ser determinada em assembleia-geral de acionistas. Um mês depois, Fundo de Resolução e Lone Star ainda não se juntaram para decidir definitivamente o que vai ser avaliado. Nem por que entidade.
Quando já injeções estatais nos bancos, o Governo precisa de pedir uma auditoria. O Novo Banco vai, este ano, solicitou novos fundos
TIAGO PETINGA
Mas há outra auditoria
Há pedidos de auditoria distintos, mas o Novo Banco tem, formalmente, de ser alvo de uma auditoria devido à nova legislação que entrou em vigor para trazer mais transparência para a banca, a Lei n.º15/2019.
Quando há injeção de dinheiros públicos (como a que haverá com o empréstimo do Tesouro ao Fundo de Resolução), o “Governo manda realizar uma auditoria especial por entidade independente, por si designada sob proposta do Banco de Portugal, a expensas da instituição auditada”. Essa auditoria, que tem de ser pedida 30 dias depois da colocação, tem de olhar para as operações de crédito, decisões de investimento e de aquisição ou venda de ativos.
Os pedidos feitos pelo PSD vão agora em linha com estes temas, acrescentando as questões relativas ao processo de venda à Lone Star, bem como à ativação do mecanismo de capital contingente.
Neste momento, estão sob este mecanismo ativos com um valor líquido de 4 mil milhões de euros que, sem as imparidades associadas (ou seja, as perdas já reconhecidas contabilisticamente), teriam um valor 7,9 mil milhões.
"Desde a primeira hora que nós temos dito que todas as auditorias são bem-vindas", disse o presidente executivo da instituição financeira, António Ramalho.