O ponto de partida para a conversa com Bernardo Correia foram dois estudos, pedidos pela Google à consultora Boston Consulting Group (BCG) e apresentados esta sexta-feira, sobre o impacto do digital e da Google em Portugal. Mas estes pouco dizem sobre os investimentos e negócios diretos da multinacional norte-americana no país, preferem destacar os seus impactos indiretos no emprego e nas receitas. O Expresso tentou saber mais junto do diretor-geral da Google Portugal.
Por que motivo pediram estes estudos à BCG?
Para entender a revolução digital no país. Portugal está num estado de maturidade digital interessante: está numa rampa de lançamento para voos mais altos, embora ligeiramente abaixo da média europeia. Temos indicadores interessantes, como a taxa de penetração de internet que é razoavelmente alta (mais de 70%), mas ainda há muito espaço para crescer no comércio online: cerca de 85% da população portuguesa não compra em sites portugueses. Pior que nós só a Moldávia. É importante acelerar o digital no país: o estudo conclui que se a economia portuguesa apostar a sério na digitalização pode gerar um incremento adicional de 1,5% no PIB e um crescimento económico de 20 mil milhões de euros.
O que é necessário para atingir esse crescimento?
Uma série de políticas públicas positivas no que respeita à regulamentação do digital, como a continuidade do apoio às startups, do incentivo ao investimento direto estrangeiro em algumas áreas, da aposta nas infraestruturas para aumentar a acessibilidade. E parcerias entre empresas como o Google e organismos públicos e privados que nos permitam acelerar o crescimento em todas as indústrias.
Os dois estudos foram pedidos pela Google à BCG?
Sim, são gémeos: um é sobre o digital como um todo e o outro sobre o papel do Google no digital. Este último é interessante, porque a BCG aponta para 2,5 mil milhões de euros em impacto direto dos serviços e produtos da Google na economia portuguesa.
Concretamente, como são gerados esses 2,5 mil milhões?
O número surge do impacto nas receitas ou vendas das empresas que compram serviços de publicidade ao Google. Ou seja: por cada euro de publicidade, qual o impacto nas receitas?
Estamos a medir só a publicidade?
Maioritariamente. Somado a esse impacto direto dos serviços publicitários da Google, existe aquilo a que a BCG designou por excedente do consumidor. Temos uma série de serviços gratuitos - como o motor de busca, o Gmail, o Youtube - que a consultora calculou como tendo 9 mil milhões de euros de impacto na economia portuguesa. No caso do motor de busca, por exemplo, os utilizadores teriam de pagar mais de 660 euros por ano para deixarem de o usar - um terço dos utilizadores, inclusive, não estão dispostos a deixar de usar o motor de busca independentemente do preço. Cada utilizador está disposto a pagar 1400 euros por ano pelo total dos serviços gratuitos da Google, o que somado dá os 9 mil milhões (equivalentes a cerca de 70 mil empregos gerados em Portugal por ano).
E quantos empregos diretos já criaram em Portugal? O estudo fala nos empregos indiretos, mas nada diz sobre os diretos. Porquê?
Temos criado muitos empregos diretos, o próprio Expresso noticiou a ampliação do nosso investimento inicial de 535 empregos para os potenciais cerca de 1300. Portugal é um país muito interessante em termos de investimento, porque existe talento, infraestruturas, um ecossistema vibrante de startups. É um excelente local para nos basearmos e termos um centro internacional e, por isso, temos ampliado os investimentos da Google e queremos continuar a fazê-lo enquanto valer a pena.
Quantos empregos diretos já criaram até à data?
Estamos nesse período de transição e de crescimento até chegarmos aos 1300.
Mas são 1300 mais os empregos da Avenida da Liberdade, onde têm escritório.
Não lhe vou dar o número exato, não divulgamos isso. Mas os nossos planos de expansão não se esgotam no centro internacional, o centro local na Avenida da Liberdade está em franco crescimento. Temos novas equipas que se foram baseando lá nos últimos dois anos, como a de DoubleClick e de cloud (nuvem), e temos conseguido atrair muitas pessoas que antes estavam lá fora.
Disse numa entrevista que o objetivo do centro operacional em Oeiras é atrair para Portugal competências que não estão tão desenvolvidas cá. Que competências estão a atrair?
Para chegarmos ao crescimento de 1,5% no PIB por ano, precisamos de uma injeção de talento enorme em áreas como a publicidade digital, que as universidades não conseguem gerar em quantidade suficiente. Trazer o centro de Oeiras para cá está relacionado com o objetivo de trazer centenas de pessoas com competências de informação digital (que nós próprios providenciamos através de alguns dos nossos parceiros) que depois possam circular no ecossistema português. Se esperássemos pela formação universitária, daqui a cinco ou dez anos tínhamos o problema resolvido.
Mas a publicidade digital não representa a maioria dos serviços que estão em Oeiras, ou representa?
Não, Oeiras tem uma panóplia de outros serviços. As 1300 pessoas que o Expresso noticiou incluem muitas funções e serviços.
Quais são os outros?
Qualquer empresa como a nossa tem uma série de serviços para consumo interno e externo, são os normais de uma empresa grande. Suporte técnico interno, área financeira… podia falar de dezenas deles.
Estou a perguntar isto porque há um secretismo à volta do centro e não se explica bem para que serve…
Precisamos de parceiros, como os nossos fornecedores, para suprir as necessidade de uma empresa como a nossa. Uma empresa que cresce muito precisa de encontrar parceiros que apoiem alguns serviços. O centro é uma excelente notícia para Portugal, independentemente das funções que lá estão.
Mas é diferente ser apenas um call center, que já sabemos que não é, ou ter outro tipo de serviços.
Mas é assim tão normal perguntarem a todas as empresas que departamentos têm?
Olhando então para o valor do investimento, quanto é que a Google já injetou em Portugal?
Não fizemos as contas, porque o número está sempre a aumentar. E há casos difíceis de quantificar. Como calculamos o impacto na economia do Digital News Initiative? Este estudo da BCG é uma tentativa de quantificar aquilo que nós achamos que consegue ser quantificado, mas há muito mais valor em termos de contributo direto para a economia portuguesa. Uma das coisas que a BCG aponta é a comunidade de criadores de conteúdos que é alimentada pelo Youtube: estima-se que o total de receitas geradas por eles em 12 milhões de euros.
Falando no Youtube, só falta o Parlamento Europeu aprovar o texto da diretiva dos direitos de autor na internet. Se este passar, pode mudar o funcionamento de serviços como o Youtube e o Google News?
O Google sempre disse que era a favor dos direitos de autor e de um diálogo construtivo sobre a reforma dos direitos de autor. Foi isso que foi feito, houve muito debate e penso que foi importante: trouxe para o dia a dia das pessoas um assunto muito importante. O documento, que ainda vai ao Parlamento Europeu, procura novas formas de salvaguardar esses direitos. Vamos ficar pacientemente à espera dos resultados finais no Parlamento Europeu e, quando o texto final for aprovado, podemos responder a essa pergunta. Nós respeitamos a lei dos países onde operamos e se ela mudar encontraremos formas de a respeitar.