Economia

Veículo para ficar com crédito malparado português tem pouca utilidade

Há dois anos, a OCDE pediu para que fosse dinamizado um mercado para livrar os bancos nacionais dos empréstimos problemáticos. Em 2019, a OCDE revela que a utilidade de um veículo seria diminuta. E deixa a recomendação: é para favorecer o reconhecimento da perda dos bancos.

Veículo para ficar com crédito malparado português tem pouca utilidade

Diogo Cavaleiro

Jornalista

A utilidade da constituição de um veículo que fique com o crédito malparado que está no balanço dos bancos portugueses é “baixa”, segundo um estudo feito em Portugal e referido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE).

“As autoridades nacionais levaram recentemente a cabo um estudo que concluiu que o potencial para uma transferência em massa de créditos malparados do sistema bancário para um veículo de gestão de activos é baixa, tendo em conta as características dos activos subjacentes”, revela o relatório económico da OCDE relativo a Portugal, divulgado esta segunda-feira, 18 de fevereiro.

Não há explicações sobre que características que estão por trás desses ativos são essas, capazes de limitar essas transferências, nem é dito quem levou a cabo tal estudo.

Mas a consideração segue-se a algo que já vem de 2017. No relatório daquele ano, a OCDE recomendava Portugal a apoiar o desenvolvimento de um mercado para os ativos tóxicos dos bancos, dando como exemplo a criação de sociedades de gestão de activos.

A criação de um veículo de gestão de ativos estatal também não é fácil ao nível europeu, tendo em conta as limitações comunitárias que impedem ajudas do Estado.

Portugal chegou a ponderar a constituição de uma entidade deste género, mas acabou por embater na legislação europeia, sendo que a opção foi a constituição de uma plataforma de gestão de crédito por parte dos três bancos portugueses mais afectados pelo malparado (Caixa Geral de Depósitos, Banco Comercial Português e Novo Banco), sem intervenção estatal.

O crédito malparado na banca portuguesa continua a superar a fasquia dos 10% da carteira de crédito total (era de 11,3% em Setembro, de acordo com o Banco de Portugal), sendo o segundo maior rácio dos países da OCDE, apenas atrás da Grécia. E, embora tenha havido progressos (e a organização refere-o por várias vezes), a verdade é que esta herança tóxica pesa na rentabilidade e na solvência das instituições financeiras. Enquanto têm de ter capital alocado a estes créditos problemáticos, não conseguem direcioná-lo para outras actividades, lucrativas.

Favorecer saída de créditos do balanço dos bancos
Assim, veio um aviso já muito repetido da entidade comandada por Angel Gurría: “é essencial continuar a cortar no malparado”. O caminho já está a ser feito – no ano passado, foram várias as notícias de vendas destes empréstimos tóxicos.

Há um plano europeu, há uma abordagem nacional, há planos individuais de cada banco e há uma plataforma de gestão de malparado. No que diz respeito aos planos individuais, que são desenhados pelas instituições e pelos supervisores, não há metas divulgadas publicamente. Mas a OCDE diz que “a comunicação dos planos e do progresso feito para alcançá-los poderia dinamizar a credibilidade dos bancos e acrescentar pressão para que fossem efectivamente atingidas as metas”. Há um “porém”: essa divulgação “pode comprimir os preços a que os bancos são capazes de vender os activos se os agentes do mercado souberem das vendas que um determinado banco tem de fazer para cumprir o plano em determinada data”.

Assim, não havendo comunicação, as autoridades de supervisão devem reflectir nas exigências de capital a evolução do cumprimento dos planos por parte dos bancos. Qualquer coisa como: maiores exigências para aqueles que menos cumprem os objectivos delineados.

Há uma recomendação da OCDE para a forma como os bancos devem lidar com estes créditos tóxicos, que pode passar por vendas, recuperações ou os chamados “write-offs”, os abatimentos ao activo que são, na prática, o reconhecimento de que aquele crédito já não está no balanço. Nesta última, o banco pode vir a recuperá-los (ou a passá-lo a outra entidade para fazer essa recuperação), mas deixa de estar a consumir capital no balanço, sendo reconhecido como perdido na totalidade.

Nos planos a definir entre os supervisores e os bancos, são estes últimos que devem ser potenciados, diz a instituição. “Os abatimentos ao activo de créditos malparados devem continuar a ser encorajados, tendo em conta as medidas que estão a ser implementadas, também ao nível europeu, para reforçar o provisionamento exigido contra os créditos malparados nos balanços”, explica a organização.

As mexidas no regime das insolvências – que tem estado a ser alterado – também devem continuar e ser melhoradas, explica o banco.

A conclusão da OCDE é a de que há uma melhoria do setor, mas ainda permanecem “vulnerabilidades”, o que tornam a economia menos resiliente a choques económicos.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: dcavaleiro@expresso.impresa.pt

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