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Tarrafal: Verdades e mentiras do Campo de Trabalho de Chão Bom

Tarrafal: Verdades e mentiras do Campo de Trabalho de Chão Bom
Ana Baião

Em 2010, José Vicente Lopes, jornalista de Cabo Verde, fez um extenso retrato do Tarrafal enquanto cadeia de nacionalistas africanos. Visitado duas vezes pela Cruz Vermelha, no contexto de África chegou a ser considerado por esses delegados "não uma prisão, mas sim um paraíso". (Versão integral do texto publicado na revista Atual de 14 de Agosto de 2010, recuperado a propósito da visita oficial a Cabo Verde do Presidente Marcelo Rebelo de Sousa).

José Pedro Castanheira

O Tarrafal funcionou, "numa primeira fase, de 1936 a 1954, como cárcere para presos políticos de Portugal; e mais tarde, de 1962 a 1974, com o nome de Campo de Trabalho de Chão Bom, como penitenciária de nacionalistas de Angola, Guiné-Bissau e Cabo Verde. Ao todo estiveram aí encarcerados mais de 340 antifascistas portugueses e cerca de 230 nacionalistas africanos (106 angolanos, 100 guineenses e 20 cabo-verdianos)". Entre os reclusos houve ainda uma dezena de estrangeiros, "arrebanhados em rusgas em Portugal". As vítimas mortais, na contabilidade de José Vicente Lopes, foram 37.

Colónia penal criada em 1936, o Tarrafal ficou conhecido como "campo da morte lenta", nome plenamente justificado pelas terríveis condições - de clima, saúde, alimentação e regime carcerário, marcado pela extrema violência. "Se Hitler tivera Auschwitz e Dachau, Salazar tinha, salvo o exagero da comparação, o Tarrafal." Dos 340 portugueses (comunistas, anarquistas, republicanos), morreram 34 - exatamente 10 por cento, um valor que fala por si. Os nomes mais frequentemente referidos são os de Bento Gonçalves e Mário Castelhano, os líderes do PCP e da CGT, a central anarcossindicalista. A historiografia oficial contabiliza 32 mortos, mas o autor contou 33 campas no cemitério do Tarrafal, incluindo a de Artur Oliveira, um "rachado", designação dada aos traidores. O outro morto foi um guarda prisional angolano, vítima de tétano. A maioria, porém, sucumbiu à biliosa, ao paludismo e à perniciosa.

Após a vitória dos Aliados na Segunda Guerra Mundial, a pressão internacional obrigou Salazar a encerrar o campo em 1954. Viria a ser reaberto por diploma de 1961. A respetiva portaria foi assinada pelo então ministro do Ultramar, Adriano Moreira, e recebeu a designação oficial de Campo de Trabalho de Chão Bom, com capacidade para 500 reclusos. Foi a guerra colonial que ditou a abertura deste e de outros campos: Missombo e São Nicolau, em Angola, Machava e Madalane, em Moçambique, e ilha das Galinhas, na Guiné.

Dois mortos da Guiné e um de Angola

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