Figuras da cultura e da política reagem à morte de António-Pedro Vasconcelos: “intervencionista” e “figura marcante do cinema português”

Jornalista
“Uma grande perda para o cinema e para a cultura portuguesa”, “o mentor do cinema novo” e um “intervencionista” que marcou o espaço cívico e político. Estas são algumas das reações de personalidades da cultura e da política à morte de António-Pedro Vasconcelos.
O realizador faleceu esta noite, aos 84 anos, e será recordado como “uma das figuras mais marcantes na história do cinema português”, descreve Rui Machado, subdiretor da Cinemateca, ao Expresso. “António-Pedro representa, como muitos outros realizadores da sua geração, um cinema novo que se produziu a partir dos anos 60”.
A sua obra cinematográfica ficou marcada por êxitos como “Perdido Por Cem” (1973), “Adeus até ao Meu Regresso” (1974), “Oxalá” (1981), “O Lugar do Morto” (1984), “Aqui Del´Rei” (1992), “Jaime” (1999), “Os Imortais” (2003), “Call Girl” (2007) ou ainda, mais recentemente, “Km 224” (2022).
“Foi o grande mentor do cinema novo e foi, sem dúvida, alguém que sempre teve uma enorme preocupação em chegar ao grande público”, comenta também o produtor de cinema e amigo de longa data, Paulo Branco. Ao Expresso, diz que António-Pedro conseguiu “chegar a um público que não era cinéfilo, mas que gostava muito dos filmes dele” — e esse é um dos seus grandes legados.
O presidente da Academia Portuguesa de Cinema, Paulo Trancoso, lamentou igualmente a partida de “uma figura marcante da nossa vida, do pós-25 de Abril especialmente, e que marcou muito a área da cultura, do cinema e da escrita”. “É uma referência, para muitos de nós, que infelizmente nos deixa”, disse à agência Lusa.
O realizador destacou-se ainda pela intervenção social e pública que foi tendo ao longo dos anos: “envolveu-se generosamente e com grandes convicções em várias matérias”, acrescenta Rui Machado. “Marcou a vida social portuguesa. Perdeu-se um grande intervencionista na verdadeira aceção da palavra”, resume.
Já Marcelo Rebelo de Sousa recordou-o como “homem culto, frontal, interventivo e intempestivo”, que “gostava de literatura, da clareza e acutilância da prosa de Stendhal, dos grandes mestres do cinema clássico americano, e envolveu-se em campanhas políticas e em combates cívicos, ligados por exemplo à RTP e à TAP”.
“Também professor, cronista e ensaísta, esteve ligado ao decisivo Centro Português de Cinema e à Associação Portuguesa de Realizadores. Em tudo o que fez, foi figura destacada no nosso espaço público do último meio século”, lê-se numa nota publicada no site da Presidência da República.
António-Pedro foi também comentador desportivo durante vários anos, assumindo a sua paixão pelo Benfica. Como tal, o clube prestou homenagem: “Um homem da cultura e de benfiquismo devotado e sem limites”. Numa nota de pesar publicada na sua página oficial, o Benfica elogiou “o posicionamento independente, crítico e apaixonado” do realizador em defesa “do prestígio, da reputação” do clube.
Além do Presidente da República, mais personalidades políticas reagiram ao falecimento do realizador, produtor, crítico e professor “a poucos dias de completar 85 anos de uma vida maravilhosa”, como revelou a família em comunicado emitido esta quinta-feira.
João Soares, ex-presidente da Câmara de Lisboa, que avançou a notícia no Facebook, descreveu António-Pedro como “um homem de esquerda, desde quase sempre próximo do PS”. “Teve um papel muito importante na campanha presidencial do meu pai em 1986. Foi amigo e apoiante sem falhas de Mário Soares”.
Por sua vez, o ministro da Cultura Pedro Adão e Silva considerou que “foi além de tudo e antes de tudo um cidadão empenhado e inconformado, comprometido desde sempre com os rumos da democracia, designadamente na defesa do serviço público de rádio e televisão”.
Para o secretário-geral do PS, trata-se de uma figura incontornável da cultura portuguesa que sempre partilhou “valores fundadores” do partido. “O exercício da cidadania do qual nunca abdicou revelam-nos alguém que sempre travou os combates certos”, escreveu Pedro Nuno Santos na rede social X (antigo Twitter).
A Associação 25 de Abril tampouco ficou indiferente à notícia da morte de António-Pedro Vasconcelos, um “civil de Abril”, recordando a sua “permanente e intensa intervenção cívica”. Segundo o presidente da associação, Vasco Lourenço, o produtor deixa por cumprir “o seu maior projeto de cineasta”: a série “Conspiração” que “estava a realizar para integrar as Comemorações dos 50 Anos do 25 de Abril”.
O incontornável realizador português nasceu a 10 de março de 1939. Faleceu em Lisboa, vítima de uma pneumonia. Faria neste domingo 85 anos.
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