Ele é mais mecânico do que marinheiro, sai do porão de um navio mercante que atraca uns dias em Lisboa, mete-se por Alfama, ouve o ‘Zumba na Caneca’, arranja um quarto de pensão, claro que desce à noite ao Cais do Sodré. E já o filme vai avançado quando sabemos que ele se chama Paul.
Antes disso, conhece Rosa, atrás daquele balcão do British Bar em que os ponteiros do relógio giram ao contrário. Mas quem gira ao contrário talvez seja o mundo, enquanto Paul perde o norte e deixa o seu barco partir. Não confessará frustrações e tristezas, percorrendo antes becos e ruelas de uma cidade branca que, como ele sentirá na carne, é muito mais hostil do que ele imagina.
Hesita entre a mulher suíça que ficou em Basileia e a quem envia filmes em Super 8 pelo correio e a nova namorada portuguesa que não sabe se é melhor ficar ou partir — é Teresa Madruga, não tinha ainda 30 anos quando Alain Tanner a filmou, estávamos em 1982.
“A Cidade Branca” não é o melhor filme de Tanner, continua uns furos abaixo de “La Salamandre” ou de “Jonas qui Aura 25 Ans en l’an 2000”. Bruno Ganz, que não sabia ser mau, também não mostra aqui o seu melhor. E quanto aos prodigiosos anos 80 de Paulo Branco, não chega a entrar sequer na lista das suas 10 melhores produções dessa década. No entanto, o filme que consagrou o cineasta suíço foi também o que ‘fixou’ Lisboa na Europa.
Fixou-a com uma melancolia genuína que não é de cartão postal, até porque Paul nunca encontra a harmonia. Note-se que Paul e Rosa dão-se mal com a resignação, não obedecem, vivem um amor a prazo, estão de passagem. Mas Lisboa fica, à medida que eles passam por ela. Volta agora aos ecrãs, em cópia digital restaurada.
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