“Vitalina Varela”, de Pedro Costa, na competição do Festival de Locarno em ano muito favorável ao cinema português
Vitalina Varela no filme homónimo de Pedro Costa
A terceira-longa-metragem de João Nicolau, “Technoboss”, está igualmente no concurso assim como “O Fim do Mundo”, do lusodescendente Basil da Cunha, que apesar de ser um filme suíço, teve produção executiva contratada em Portugal e foi rodado na Reboleira, Amadora, com atores e técnicos portugueses. “Prazer, Camaradas!”, documentário de José Filipe Costa, passa fora de competição. O festival vai correr entre 7 e 17 de agosto
Locarno anunciou esta manhã que “Vitalina Varela”, de Pedro Costa (uma produção da OPTEC), e “Technoboss”, de João Nicolau (produzido pela O Som e a Fúria), vão estar na competição pelo Leopardo de Ouro da 72.ª edição do festival de cinema, em agosto.
Michael Spencer em “O Fim do Mundo”, de Basil da Cunha
Além destes, também “O Fim do Mundo”, do lusodescendente (nascido na Suíça) Basil da Cunha, entra no concurso. É um filme helvético (sem participação financeira portuguesa) mas teve produção executiva contratada em Portugal (Terratreme) e foi rodado na Reboleira, Amadora, onde o cineasta trabalha há quase uma década, com atores e técnicos portugueses. Junta-se àqueles o documentário “Prazer, Camaradas!” (produzido pela Uma Pedra no Sapato, de Filipa Reis e João Miller Guerra), fora de concurso. Na secção Cineastas do Presente (a “competição B” de Locarno), “L'Ile aux oiseaux”, de Maya Kosa e Sérgio da Costa está a concurso. Trata-se, tal como o caso de Basil da Cunha, de um filme helvético desta dupla luso-suíça e não representa Portugal oficialmente. Na competição Pardino d'Oro, encontra-se “Vulcão: O Que Sonha um Lago?”, realizado pela cineasta romena radicada em Paris Diana Vidrascu. Esta curta-metragem tem coprodução portuguesa.
“Prazer, Camaradas!”, de José Filipe Costa
Contas feitas, nunca antes se registou na história do cinema português uma presença tão forte na secção maior de um grande festival internacional de cinema (Locarno é comummente considerado o 'quarto grande', depois de Berlim, Cannes e Veneza). Para Pedro Costa, esta será a quarta presença na competição, depois de “No Quarto da Vanda”, em 2000 (Menção Especial), “Caça ao Coelho Com Pau”, em 2007 (curta-metragem que integrou o filme coletivo “Memories”, com dois outros filmes de Harun Farocki e de Eugène Green – Prémio Especial do Júri) e de “Cavalo Dinheiro”, em 2014 (Melhor Realização).
Miguel Lobo Antunes (à direita) em “Technoboss”, de João Nicolau
Os prémios valem o que valem, têm uma relativa importância, mas mesmo sem Ursos, Palmas e Leões de Ouro no seu historial de longas-metragens (exceto o Leão e a Palma, dourados e honorários, que distinguiram Manoel de Oliveira), foi em Locarno que o cinema português chegou ao ouro pela última e, até agora, única vez, quando “O Bobo”, de José Álvaro de Morais, venceu a edição de 1987. Em 2007, “Memories” chegou ao palmarés e, a partir de 2010, os ventos do Ticino voltaram a sorrir. Nesse ano, Gabriel Abrantes e Daniel Schmidt venceram o Pardino d'Oro de curta-metragem com “A History Of Mutual Respect” (numa altura em que João Salaviza já conquistara essa categoria em Cannes). Em 2013, Joaquim Pinto trouxe de Locarno o Prémio Especial do Júri, o segundo mais importante, por “E Agora? Lembra-me”. Pedro Costa, como se referiu acima, ganhou Melhor Realização em 2014, por “Cavalo Dinheiro” e, dois anos volvidos, João Pedro Rodrigues venceu o mesmo prémio, por “O Ornitólogo”. Em 2016, Locarno seleccionou 13 (treze!) produções ou co-produções portuguesas. Em 2017, o cinema português chegou quatro vezes ao palmarés, incluindo um novo Pardino d'Oro para “António e Catarina”, curta de Cristina Hanes. Contudo, nunca até hoje teve Portugal mais do que um só representante por edição na Competição Internacional.
O concurso mais importante de Locarno 2019 reúne 17 longas-metragens. Para além dos filmes dos três realizadores portugueses, apresentam-se “A Febre”, da brasileira Maya Da-Rin, “Echo”, do islandês Rúnar Rúnarsson, “Cat in the Wall”, dos búlgaros Mina Mileva e Vesela Kazakova, “Das freiwillige Jahr”, do alemão Ulrich Köhler, (correalizado com Henner Winckler), “Douze Mille”, da francesa Nadège Trebal, “During Revolution”, da síria Maya Khoury, “The Science of Fictions”, do indonésio Yosep Anggi Noen, “Hogar”, da italiana Maura Delpero, “Longa Noite”, do espanhol (e galego) Eloy Enciso, “Terminal Sud”, do francês Rabah Ameur-Zaïmeche, “Les Enfants d'Isadora”, do igualmente francês Damien Manivel, “Pa-Go”, do sul coreano Park Jung-bum, “The Last Black Man in San Francisco”, do americano Joe Talbot, e por fim “A Girl Missing”, do japonês Koji Fukada.
A realizadora francesa Catherine Breillat presidirá ao júri da Competição Internacional composto ainda pela cineasta alemã Angela Schanelec, o ator argentino Nahuel Pérez Biscayart, a produtora holandesa Ilse Hughan e o jornalista e académico italiano Emiliano Morreale. O filme de inauguração será “Magari”, primeira longa-metragem da produtora italiana Ginevra Elkann, e o de encerramento “To the Ends of the Earth”, nova obra do japonês Kiyoshi Kurosawa (que por diversas vezes competiu em Locarno).
A retrospetiva do ano, Black Light, incide num extenso panorama (47 títulos) de filmes realizados por artistas negros, ou que refletiram sobre a condição dos negros e o racismo ao longo de toda a história do cinema - e aqui se encontram quer obras de Spike Lee (“She's Gotta Have It” e “Do the Right Thing”), Sidney Poitier (“Stir Crazy”), Ousmane Sembène (“La noire de...”) ou Julie Dash (“Daughters of the Dust”), quer de Jean Grémillon (“Daïnah la métisse”), Marcel Camus (“Orfeu Negro”), Jim Jarmusch (“Ghost Dog”) ou Quentin Tarantino (“Jackie Brown”). O novo filme de Tarantino, “Once Upon a Time... in Hollywood” (estreia-se em Portugal a 15 de agosto) vai também passar na Piazza Grande, que junta até 10 mil pessoas nas sessões em que fica a rebentar pelas costuras, assim como “Parasite”, de Bong Joon-ho, Palma de Ouro em Cannes.
Locarno vai ainda homenagear com prémios honorários o realizador americano John Waters (Leopardo de Honra), o realizador suiço Fredi M. Murer (Leopardo de Ouro à Carreira), a atriz americana Hilary Swank (Prémio Leopard Club) e o ator sul-coreano Song Kang-ho (Prémio de Excelência), que entrou em vários filmes de Bong Joon-ho, incluíndo “Parasite”.
Na próxima edição da Revista E, sábado, o Expresso publica uma entrevista à diretora do Festival de Locarno, a francesa Lili Hinstin, e o seu comentário aos filmes portugueses selecionados.