Chegados ao Hospital da Luz, os médicos enviados pela Alemanha para acorrer ao estado crítico dos hospitais portugueses já estão a trabalhar. E com doentes igualmente críticos. Esta segunda-feira foi transferido um desses doentes , vindo da região de Lisboa e Vale do Tejo (LVT).
Disso deu conta João Gouveia, coordenador da comissão de acompanhamento da resposta nacional em medicina intensiva para a covid-19. Em conferência de imprensa, o médico agradeceu “toda a ajuda” que tem sido oferecida, embora garantindo que a ideia não é recorrer a toda. A prioridade por agora é “expandir a medicina intensiva, conseguir que desça finalmente a curva, ter um RT [rácio de transmissibilidade] mais baixo, e diminuir a pressão da medicina intensiva.”
João Gouveia admite que não é fácil porque Portugal tem falta de recursos. “Estamos muito perto do total da expansão da medicina intensiva. Já expandimos em 200 camas, há mais algumas, mas a capacidade já é diminuta”, confirmou. Não tanto por falta de espaço mas de recursos humanos: “Temos falta de recursos de intensivistas e principalmente de enfermagem”, detalhou o coordenador.
Para o Hospital da Luz, onde está a equipa de médicos militares enviados pela Alemanha, vão doentes críticos de hospitais mais pressionados pelo crescimento de casos. João Gouveia deu os exemplos que se conhecem: Fernando Fonseca (comummente chamado Amadora-Sintra), Hospital de Cascais, Beatriz Ângelo (Loures) e Garcia de Orta (Almada).
É preciso que sejam doentes que, apesar da situação crítica — de outra forma não precisariam de cuidados intensivos —, “tenham estabilidade suficiente para aguentar o transporte”, como explicou João Gouveia.
À distância, na unidade de cuidados intensivos do Hospital da Luz, uma das médicas alemãs confirmou-o: os pacientes “estão estáveis mas severamente doentes”, com “pneumonias graves” e a precisar de ventilação “durante semanas”. Referindo-se sempre aos colegas de medicina intensiva portugueses como “amigos”, a médica alemã garantiu que “a comunicação está perfeita”, o que é “útil” e congratulou-se pelo facto de “alguns amigos portugueses falarem alemão”.
Na sala destinada à conferência, o coordenador da equipa alemã, Jens-Peter Evers, também reservou palavras elogiosas para Portugal. Avançou que o objetivo é que a equipa que coordena fique no país por três semanas, embora imagine que esse prazos possa ser estendido. E disse que está certo de que Portugal não fez “nada de errado” para chegar a este ponto de saturação — a questão é mesmo tratar-se de “um vírus novo” — e que esta não é altura de olhar para os números. “Todas as vidas contam, não temos de estar aqui a discutir números, mas resultados.”
Respirar em “meados de abril”
Há um adágio muito utilizado pelas autoridades de saúde portuguesas na primeira vaga da pandemia que está a ser recuperado: “planear para o pior e esperar o melhor”. João Gouveia voltou a ele, considerando essa forma de olhar para a pandemia um “ato de inteligência”.
Instado a estimar a data em que Portugal pode finalmente começar a respirar de alívio, o coordenador primeiro riu-se. “Se acertasse no Totoloto…”. Depois lá respondeu, sem data, mas com objetivos. “Sinceramente: quando tivermos menos de 3 mil casos diários às quartas e às quintas, duas ou três semanas de seguida, um RT inferior a 0,7 e menos de 270 internados em medicina intensiva [covid-19], porque isso quer dizer que consigo dar resposta a covid e a não covid.”
João Gouveia mostrou confiança, ainda que moderada. Há semanas tinha apontado para finais de abril o regresso a uma vida com menos restrições no país e agora admite que pode ter-se enganado: “os números estão a descer mais depressa”, disse, acrescentando que “ainda não há certezas”. A data aproximada que João Gouveia conseguiu dar foi “meados de abril”.
Quanto a enviar doentes portugueses para o estrangeiro, o coordenador da comissão de acompanhamento da resposta nacional em medicina intensiva para a covid-19 também não conseguiu ser taxativo. “Gostava de dizer que não vamos precisar e estou convencido de que não vamos precisar.” Salientou antes o “esforço gigantesco de todo o sistema português”, tanto do sector público e privado — “e saliento público e privado” —, tanto na medicina geral quanto na que melhor conhece, a intensiva.
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