Coronavírus

A história do médico que saiu dos cuidados intensivos e morreu com um AVC. Ou a prova de que ainda sabemos pouco sobre o vírus

A história do médico que saiu dos cuidados intensivos e morreu com um AVC. Ou a prova de que ainda sabemos pouco sobre o vírus
DOUGLAS MAGNO/Getty Images

A história é contada pelo “The Guardian” para chamar a atenção para as consequências de uma infeção de que ainda pouco se sabe. Rudresh Pathak, médico de 65 anos que trabalhava em Inglaterra, esteve um número de dias recorde nos cuidados intensivos, recuperou, mas depois teve um AVC que se pensa estar associado à infeção pelo vírus da covid-19

Tudo parecia estar a correr bem. Rudresh Pathak, médico de 65 anos que trabalhava num hospital em Lincolnshire, em Inglaterra, e tinha sido infetado com o vírus da covid-19, saía finalmente dos cuidados intensivos. Fora um dos pacientes no Reino Unido que mais tempo estivera ligado a um ventilador, mas isso já era passado. No dia 26 de junho, porém, a família recebeu a pior notícia: o médico teve um acidente vascular cerebral (AVC) e morreu.

A história é contada pelo “The Guardian” para, de certa forma, chamar a atenção para as consequências de uma infeção de que ainda pouco se sabe. O jornal faz referência, aliás, a um estudo publicado no mês passado que associa o vírus a complicações no cérebro, incluindo AVC e psicoses. Segundo o estudo, realizado por cientistas da Universidade de Liverpool e publicado na revista “Lancet Psychiatry”, de um total de 125 pacientes analisados (a maioria com mais de 60 anos) 77 tiveram um acidente vascular cerebral.

Em 57 destes casos, o acidente vascular cerebral deu-se devido a coágulos sanguíneos, conhecidos como acidentes isquémicos, em nove dos casos por causa de hemorragias cerebrais e, no caso de um paciente, devido a inflamação dos vasos sanguíneos do cérebro. “Tem havido cada vez mais relatos de uma associação entre a infeção da covid-19 e possíveis complicações neurológicas e psiquiátricas, mas até agora só a partir de estudos com dez ou menos pacientes. A nossa é a primeira investigação nacional de complicações neurológicas associadas à covid-19, mas é importante assinalar que se centra em casos tão graves que exigiram hospitalização”, afirmou o autor do estudo, Benedict Michael, sublinhando a importância de “mais investigação”.

Do total de pacientes analisados, concluiu-se também que 39 (metade dos quais com menos de 60 anos) manifestaram confusão mental ou mudanças de comportamentos associadas a uma alteração do seu estado mental. Sete destes sofriam de encefalite, uma inflamação do cérebro. As alterações psiquiátricas, como psicose, demência, depressão e ansiedade foram registadas em 23 dos doentes nos quais, disseram os investigadores, não havia antecedentes deste tipo de perturbações.

Comentando o caso do médico Rudresh Pathak, David Werring, professor no University College London, explicou ao “Guardian” que se sabe, desde há muito tempo, que as infeções são um fator de risco para os acidentes vasculares cerebrais, mas que há “evidências de que pessoas infetadas com covid-19 e vítimas de um AVC têm mais probabilidade de ter múltiplos bloqueios nas artérias do cérebro e morrer”.

Uma explicação possível é a de que haja uma minoria de pessoas infetadas com o vírus que desenvolvem uma “resposta inflamatória profunda associada a uma coagulação do sangue generalizada”. E pessoas que sejam gravemente afetadas pelo vírus podem não apenas ter coágulos no cérebro como noutras partes do corpo, como as pernas (trombose) e os pulmões (embolia pulmonar). “Entre 1% a 5% das pessoas com covid-19 pode ter um AVC”, disse ainda o médico, “percentagem que parece ser maior do que a de outros vírus, como o vírus da gripe, em que está abaixo de 1%”.

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