Coronavírus

Covid-19. Um Modelo Económico da Pandemia, por Sérgio Rebelo

Covid-19. Um Modelo Económico da Pandemia, por Sérgio Rebelo

Sérgio Rebelo, o académico português professor nos Estados Unidos, explica as relações entre as políticas alternativas de resposta à pandemia do coronavírus e os impactos na economia

Sérgio Rebelo

A minha bisavó Elisa teve onze filhos. Só três chegaram à idade adulta, um deles a minha avó Augusta. Os outros morreram em 1918 durante a “pneumónica.”

Tenho-me lembrado destes meus antepassados nas últimas semanas. Com os meus colegas Martin Eichenbaum (Northwestern University) e Mathias Trabandt (Freie Universität Berlin) tenho passado o tempo todo a trabalhar num modelo dos efeitos económicos do COVID-19. O artigo "The Macroeconomics of Epidemics", sobre o nosso trabalho, pode ser encontrado aqui.

Os modelos epidemiológicos têm sido muito úteis para construir vários possíveis cenários. O que falta nesses modelos é a interação entre a epidemia e a economia.

Por um lado, decisões económicas como trabalhar ou ir às compras influenciam a propagação do vírus. Por outro lado, a possibilidade de contrair a doença leva as pessoas a deixarem de frequentar restaurantes, cinemas e outros estabelecimentos. Este modelo é uma primeira tentativa de incluir estes efeitos económicos. O modelo serve para estudar a política ótima de isolamento social.

A intervenção do Estado é necessária numa epidemia devido ao que os economistas chamam uma “externalidade.” Cada um de nós é uma parte tão pequena da economia como um todo que achamos que não influenciamos o número total de infeções no nosso país.

Por isso, podemos não resistir à tentação de irmos às compras, apesar de termos alguns sintomas que podem prenunciar estarmos infetados. Como todos pensamos da mesma maneira, acaba por haver demasiada interação social que resulta num surto de infeções.

A linha azul na figura em anexo mostra o que acontece sem intervenção estatal num cenário desfavorável em que acaba por não se conseguirem desenvolver vacinas ou tratamentos. O consumo cai porque as pessoas reduzem as suas atividades económicas para diminuir a probabilidade de contrair o vírus. Mesmo assim, o pico das infeções chega a perto de 5 por cento da população e a percentagem de mortes a 0,4 por cento da população.

A linha a preto tracejada mostra a politica ótima de isolamento social. Esta política leva em consideração vários aspetos, incluindo limites à capacidade do sistema de saúde publica, e a possibilidade de se descobrirem tratamentos ou vacinas. Começa-se por introduzir medidas de isolamento social, intensificam-se essas medidas até a infeção chegar ao pico. Relaxam-se as medidas quando o número de pessoas infetadas cai. Esta intervenção piora a recessão económica. Mas consegue-se assim reduzir e adiar o pico das infeções e sobretudo reduzir o número de mortes de 0,4 para 0,26 por cento.

A linha vermelha mostra o que acontece se, tal como tem sido discutido em vários países, desistirmos das politicas de isolamento social. Vemos que o consumo recupera assim que as medidas de isolamento social são eliminadas. Mas as infeções disparam, levando as pessoas a reduzir as suas interações económicas, o que resulta numa nova recessão. O número de mortes em percentagem da população sobe para perto de 0,4 por cento, o mesmo número obtido sem intervenção estatal.

As politicas de isolamento social implementadas até agora e consideradas no modelo são muito rudimentares. Temos claramente que evoluir para políticas mais sofisticadas que permitam, por exemplo, às pessoas que adquirirem imunidade ao vírus possam trabalhar e que dessa forma possamos preservar o mais possível a saúde das pessoas e da economia.

Professor de Finanças Internacionais na Kellogg School of Management na Northwestern University, Estados Unidos

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