Da Terra à Mesa

Da semente à vagem, a alfarroba é o ouro do Algarve

Alfarroba
Alfarroba

Muito versátil, usada para rações de animais, alimentos e cosméticos, a alfarroba é um fruto produzido no Algarve com um valor de mercado cada vez mais elevado. João Currito, CEO da Carob World, mostra a região ao mundo através de tabletes, cremes de barrar, farinha e xarope. Mas, esta viagem ainda agora está a começar. “Da terra à mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante.

Pão de alfarroba, bolachas de alfarroba, bola de Berlim de alfarroba, torta de alfarroba, creme de alfarroba, tabletes de alfarroba, farinha de alfarroba, xarope de alfarroba… com muitas utilizações, o fruto adocicado nascido nas alfarrobeiras algarvias voltou a ganhar o estatuto de tesouro nesta região. De acordo com a Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural, “o fruto é uma vagem (acastanhada, quase preta, quando madura) em forma de silíqua, comprimida, coriácea, indeiscente, de 10 a 30 cm de comprimento”. A mesma fonte afirma que a sua origem se situa, provavelmente, “nas zonas costeiras do Médio Oriente, de onde se estendeu para o Ocidente''. Na Península terá sido introduzida pelos Árabes”.

Alfarroba

De elevado valor nutritivo, é apanhada no verão e utilizada da semente à vagem. João Currito, algarvio e CEO da Carob World, marca que desenvolve produtos à base deste fruto, explica que “da semente, que vale cerca de 10% do peso do fruto”, faz-se a goma, que é vendida para a indústria alimentar e farmacêutica; a vagem, “que é a cadeia de valor onde estamos, ainda vai, maioritariamente, para fazer rações para animais”.

E com os anos tem valorizado. “Há sete ou oito anos, quando comecei, uma arroba [15 kg] de alfarroba andava na casa dos €5. Agora está nos 30. As alfarrobeiras não precisam de manutenção. São árvores de sequeiro, que resistem muito bem à falta de água. ” E os roubos constantes não têm facilitado a vida aos produtores. “Aquilo que havia antes, mas em surdina, nos últimos anos começou a ser um problema”, conta.

Apanha de alfarroba
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Bem-vindos ao mundo da alfarroba
“Portugal é um dos maiores produtores mundiais de alfarroba”, um produto do Algarve “historicamente negligenciado”, diz, por ter sido alimento “de porcos e de pobres”. Entre 2013 e 2014, numa viagem de trabalho, cruzou-se com “uma espécie de bombom” de alfarroba e imediatamente teve a ideia de aplicar a matéria-prima a outras finalidades. Depois de alguma pesquisa, concluiu que não existia “nada do género” e que estava a trabalhar em inovação. “Do Tejo para cima, a percentagem de pessoas que já ouviu falar de alfarroba é muito pequena.”

Olhar para cada país, região, localidade, avaliando e apoiando as suas necessidades específicas na produção alimentar é uma das diretrizes da Política Agrícola Comum, com especial foco no quadriénio 2023-2027. A inovação na agricultura e na transformação, constitui um dos grandes objetivos do novo plano que apoia a produção agrícola a partir do próximo ano, incentivando a adoção de novas tecnologias quer na produção, quer na transformação dos produtos.

Alfarroba

“Fizemos o projecto de investigação com a Universidade do Algarve, passámos pela fase de industrialização, tentámos ir ao mercado arranjar financiamento, o que falhou redondamente porque não há investidores para suportar startups industriais que exijam capital intensivo – estamos a falar de um projeto com um milhão e meio de investimento.” A 25 de Abril de 2019, depois de todo o processo de criação e desenvolvimento da marca, os produtos da Carob World foram oficialmente lançados na loja online. “Foi o dia da revolução da alfarroba”, brinca.

Hoje, a Carob World (Tel. 289112327) está também presente nos aeroportos, algumas áreas de serviço e lojas gourmet e de produtos regionais espalhadas pelo país, já que o posicionamento é também focado no mercado internacional. “Já fizemos as primeiras exportações para uma dúzia de países”, como Estados Unidos da América, Coreia do Sul, Japão e Austrália, entre outros.

A proteção de alimentos endógenos e tradicionais, a inovação e a sustentabilidade integram o Plano Estratégico da PAC - Política Agrícola Comum para 2023-2027 que apoia diversos projetos em Portugal.

João Currito CEO da Carob World

Uma matéria-prima, múltiplos produtos

As tabletes e os cremes para barrar (alfarroba e amêndoa e alfarroba, amêndoa e leite) foram os primeiros produtos a ser comercializados pela Carob World, pouco antes da farinha de alfarroba. “Já havia no mercado e as pessoas pediam”, explica. “No ano passado, lançámos o xarope de alfarroba”, focado nos mercados árabes, onde têm o costume de utilizar produtos do género para “adoçar o chá ou fazer bolos”. Completamente “alinhado com as tendências nutricionais”, está, de forma gradual, a ocupar o seu lugar no mercado.

No futuro, a missão como empresa é muito clara: “se for produto de alfarroba, estamos interessados em fazer”, afirma. “A alfarroba é um produto muito flexível e o objetivo é criar um portfólio de produtos de qualidade e levá-lo para o mundo”.

Alfarroba na alta-cozinha

Árvore amiga do ambiente, ajudando no resgate de carbono e, cada vez mais, símbolo de sustentabilidade e emblema do barrocal algarvio, é da alfarrobeira que se colhe o fruto entre agosto e setembro. O uso da farinha popularizou a alfarroba, fruto muito rico em açúcar, proteína e galactomananos, com destaque para o pão e os doces algarvios. As características também atrairam diversos chefs de cozinha, como Rui Silvestre. O responsável pelo restaurante Vistas - Rui Silvestre, em Castro Marim, premiado com um Garfo de Ouro e uma Estrela Michelin, usa o fruto nos menus degustação. “A nossa sobremesa do menu Fauna e Flora é quase um tributo à alfarroba, um produto que foi trazido pelos árabes e isso tem muito a ver com a nossa cozinha. Apresentamos uma base de tarte de alfarroba, com mousse de cevada, chocolate, cacau e gelado de cardamomo, a especiaria que liga à nossa diáspora. Finalizamos o prato já na mesa com molho de chocolate quente", explica Rui Silvestre.

Chef Rui Silvestre
Ricardo Bernardo

“Da terra à mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante.

A sustentabilidade social, ambiental e económica na agricultura e nas zonas rurais são linhas orientadoras da PAC que, em Portugal, tem como objetivos principais valorizar a pequena e média agricultura, apostar na sustentabilidade do desenvolvimento rural, promover o investimento e o rejuvenescimento no setor agrícola a a transição climática no período 2023-2027.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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