Efervescente, autóctone e único: conheça o melão Casca de Carvalho
De sabor singular e apimentado, também conhecido por melão champanhe, graças ao gás carbónico que concentra no seu interior, o melão Casca de Carvalho é um presente de verão que só se encontra entre o Minho e o Douro Litoral. “Só dá onde há vinho verde”, afirma Fátima Pinheiro que, com o marido, Augusto Martins, e o filho, André Martins produz este fruto no concelho de Vila Nova de Famalicão. “Da terra à mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante.
É na Estrada Nacional 206, junto ao fontanário, na União das Freguesias de Gondifelos, Cavalões e Outiz, em Vila Nova de Famalicão, que Fátima e André Martins vendem, entre junho e setembro – no princípio de julho estão “espetaculares” – os melhores exemplares de melão Casca de Carvalho, produzido há quase 30 anos. Faça chuva ou faça sol, de segunda-feira a domingo, de manhã cedo até ao final do dia, já que este fruto deve ser consumido, de preferência, no dia da apanha. “Os meus pais começaram com um terreno pequeno, e na altura tinham outro trabalho, mas as coisas foram correndo bem”, conta André, 28 anos, já ambientado ao negócio da família. No entanto, reconhece que “antigamente os tempos eram mais certos e havia mais facilidade em ter bons melões”. Por exemplo, “ano passado foi um ano em que se produziu tudo, mas este ano, desde que veio o calor, descontrolou a maturação.”
Cultivado apenas entre o Minho e o Douro Litoral, devido às condições climatéricas da região, com um micro-clima favorável ao seu desenvolvimento, o melão Casca de Carvalho, completamente diferente de todos os outros, encontra-se, no verão, a sua época, nos concelhos de Lousada, Paredes, Felgueiras e Barcelos, entre outros. “Este melão não gosta de temperaturas superiores aos 28 graus”, explica a vendedora.
Com o objetivo de fornecer alimentos de qualidade equilibrando o respeito pelo meio ambiente, a dinâmica das zonas rurais e suas comunidades e também a promoção de uma maior biodiversidade, o programa de apoios da Política Agrícola Comum (PAC) aposta na manutenção de produtos agrícolas endógenos, em linha com a sustentabilidade social, económica e ambiental, considerando as particularidades das diversas regiões do país.
"Tem de bater cheiinho", explica Fátima Pinheiro sobre a melhor forma de escolher o fruto
Com diferentes cores e texturas, apura-se pelo toque Mas afinal, que características tem este produto tão especial? “Tem que ser rijinho, ter doçura e ser picante. Aqui na nossa zona, em Famalicão, Barcelos, Santo Tirso, é verdinho por dentro, mas em Vila Verde é avermelhado”, conta Fátima. “Eu vendo em Vila Verde e os clientes de lá querem melões dos vermelhinhos. O melão vermelho quando é bom, é muito bom. O verde o que promete, regra geral, cumpre”, acrescenta André. Segundo Hortense Fernandes, autora da dissertação de mestrado em Engenharia Agrónoma “Melão ‘Casca de Carvalho’ Técnicas Culturais e Análise Qualitativa”, apresentada na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro em 2013, existem três variedades: o Fino (tipo Soutelo), cultivado nos concelhos de Amares, Braga e Vila Verde, de “casca fina de cor creme e reticulado fino”; o Robusto (tipo Barcelos), típico dos concelhos de Barcelos, Vila Nova de Famalicão, Santo Tirso e Trofa, com “casca grossa de cor acinzentada e reticulado grosso, polpa verde” e, de todos, o “mais apimentado”; e o Ponderado (tipo Vale Sousa), produzido em Lousada, Paredes, Penafiel e Felgueiras, um melão com “reticulado fino e médio e casca de média espessura, em que o reticulado tem que fazer pelo menos um cordão linear. A polpa desde ecótipo é alaranjada”.
De cor variável e sumarento, faz um par imbatível com o vinho verde da região, e pode ser consumido como entrada ou como sobremesa. Mas não só: para o chef famalicense Álvaro Costa, é uma ótima matéria-prima para usar em sopas frias, ceviches, pickles ou mousses. “O equilíbrio entre o salino, o picante e a maturação meia doce conferem-lhe uma amplitude gastronómica delicada e explosiva ao mesmo tempo”, diz.
Notados pelo paladar, os melões Casca de Carvalho produzidos por esta família têm, além da picância, uma doçura singular, assegura Fátima. “O nosso melão é doce e apimentado. Há pessoas que o identificam como sendo nosso só pelo sabor.” Mas é pelo toque, pela forma como cantam, que são avaliados. “Às vezes, chegam aqui produtores de Vale do Sousa, e eu reconheço a região pela forma de tocar o melão”, garante. “Comigo, é este dedo que sabe, por isso é que tenho calo. Tem de bater cheiinho.”
Melão Casca de Carvalho
Uma cultura de alto risco Segundo o site da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural, esta é uma “cultura de alto risco, o que leva muitos agricultores a dela se desinteressarem”. Há, de facto, muitas perdas. É um melão que apodrece, que nem sempre sai bom. “Se vierem dias muito quentes e, de repente, virarem para frios, o melão sofre declives na qualidade. Como é muito cheio, absorve a humidade nas noites orvalhosas e racha. Se racharem em verde não têm qualquer tipo de aproveitamento”, elucida André, uma vez que o melão é colhido maduro, todas as manhãs, com um toque de navalha.
José Rocha, Grão Mestre da Confraria do Melão Casca de Carvalho, fundada em 2007 no âmbito da Feira Agrícola do Vale do Sousa (AGRIVAL), acrescenta ainda que “cerca de 70% dos melões não são bons para comer em fresco” por não terem a picância, a cor ou o sabor que deveriam. “A nossa experiência diz-nos que a percentagem de bons melões é muito baixa.”
Além disso, a busca por terras para semear é “muito ruim”, admite Fátima Pinheiro. Todos os anos, procuram terrenos para alugar e produzir o melão Casca de Carvalho. “Não se pode repetir a terra. Para as outras culturas fica muito boa, mas para o melão não. É uma planta muito sensível”, elabora André. E fazê-lo “é um risco muito grande”, dizem.
Conseguido o terreno, é tempo de começar a trabalhar, apesar da escassez de pessoal também se fazer notar cada vez mais. “O início da colocação de sementes começa em janeiro. Corrigimos o pH da terra, ao aplicar calcário, depois estrumamos e adubamos. A plantação começa em março, para ter os primeiros melões em meados de junho. É um processo lento, nessa altura, com pouca luz e pouco sol. A última plantação é feita em junho e em agosto já estão prontos. Em meados de setembro acabam”, descreve André no final de mais uma época de trabalho.
Durante a época, todos os dias está à venda na EN206
Pouco doce e apimentado
O melão Casca de Carvalho está inscrito na lista de Produtos Tradicionais Portugueses, a exemplo de outras variações como o o melão de Campo Maior e Elvas, da Amareleja, da Vilariça e do mais famoso entre os portugueses, o melão de Almeirim.
“Extremamente apreciado como aperitivo ou refrescante após as refeições”, o melão Casca de Carvalho é um fruto pouco doce, apimentado e com libertação de gás carbónico. A casca apresenta-se com o aspeto da casca de carvalho (reticulada e fendilhada), razão para o nome pelo qual é conhecido. É extremamente apreciado como aperitivo ou refrescante após as refeições.
“Da terra à mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante.
A sustentabilidade social, ambiental e económica na agricultura e nas zonas rurais são linhas orientadoras da PAC - Política Agrícola Comim que, em Portugal, tem como objetivos principais valorizar a pequena e média agricultura, apostar na sustentabilidade do desenvolvimento rural, promover o investimento e o rejuvenescimento no setor agrícola a transição climática no período 2023-2027.
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