Da Terra à Mesa

Para a Flor de Sal de Castro Marim, o tempo é o melhor tempero

Salinas em Castro Marim
Salinas em Castro Marim
Ricardo Bernardo
Pureza, delicadeza e sabor. A Flor de Sal de Castro Marim, extraída das salinas da Reserva Natural do Sapal de Castro Marim e Vila Real de Santo António, no Algarve, é um produto DOP colhido manualmente, rico em sais minerais e característico desta região graças ao clima e à especificidade dos solos. O da Salmarim está nas bocas do mundo e nas cozinhas de cada vez mais chefs e gastrónomos. “Da terra à mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante.

Corria o ano de 2007 e Jorge Raiado, formado em História de Arte, passava férias com a família nas salinas de Castro Marim, propriedade do sogro. “De ficar a ver para começar a ajudar, passou pouco tempo”, recorda. No ano seguinte, voltou para uma segunda temporada, apenas com o objetivo de "recolher e vender”. Rapidamente, criou a Salmarim e abraçou um projeto artesanal e sazonal que elevou a importância da flor de sal de Castro Marim, produto com Denominação de Origem Protegida (DOP), a nível nacional e internacional.

Regulamentado pela União Europeia, a denominação DOP identifica e protejo um determinado produto originário de um local ou região específicos, cuja qualidade ou características se devam essencial ou exclusivamente a um meio geográfico específico (incluindo os seus fatores naturais e humanos), e cujas fases de produção tenham todas lugar na área geográfica delimitada, como é o caso da Flor de Sal de Castro Marim. Uma forma de garantir a manutenção da biodiversidade, respeitar as particularidades de cada local e apoiar a sustentabilidade da cultura tanto a nível económico, social como ambiental.

Salinas de Castro Marim
Ricardo Bernardo

Com cinco hectares e meio de “salinas milenares que se pensa terem sido exploradas muito antes dos árabes e dos romanos, na Idade do Ferro, pelos fenícios”, como é descrito na página da empresa, e também, por tal, “provavelmente, as mais antigas de Castro Marim”, Jorge investiga e explora “um terço” de forma constante para produzir sempre flor de sal com melhor qualidade. “Não só a recolha e processamento é o mais limpa possível, como a sua produção é feita por métodos artesanais que garantem que não existem elementos poluentes ou adicionados ao longo do processo”, lê-se.

Reconhecida desde 2007 como Produto Artesanal pela Kiwa Sativa e com o certificado Nature & Progrés, a Salmarim tem ganho prémios ao longo dos anos, nomeadamente ao nível do design das embalagens, outra das imagens de marca do projeto. Os saleiros de cortiça, que preservam as características do terroir de Castro Marim, são o exemplo mais conhecido. “Quando começámos com as embalagens de cortiça, todos diziam que não iam funcionar…”

Salmarim
Ricardo Bernardo

Uma joia rara

A época da flor de sal, explica Jorge Raiado, é “quando deixa de chover e temos dias mais longos, mais quentes, menos húmidos e menos nublados”. Ao contrário do sal tradicional, que pode ser produzido em dias enevoados, a flor de sal precisa de dias limpos para dar de si.

“A flor de sal é um coalho”, lança. “Quando fervemos o leite, há um aquecimento. A água do leite evapora-se e fica só aquela nata. No caso do sal, apesar de não termos que ferver, acontece a evaporação da água, mas os sais e os minerais não conseguem evaporar e ficam a flutuar à tona.” Geralmente, os cristais começam a formar-se a meio da tarde e o importante é que estejam a boiar – “temos uma janela de horas para apanhar”. Isto porque, a flor de sal da Salmarim deve ser “leve, volumosa” e, mais importante, “capaz de se desfazer nos dedos”, quando se esfrega entre o polegar e o indicador. De acordo com o Caderno de Especificações, “apresenta-se sob a forma de pequenos cristais, que se podem confundir numa primeira apreciação com sal moídor”. No entanto, são “mais leves, dispostos em pequenas lâminas frágeis, formadas durante a cristalização dos sais”, flutuam e partem-se com o manusear.

Flor de Sal
Ricardo Bernardo

Apesar de estar muito dependente da natureza, Jorge tem “uma vaga ideia” de quando começa e quando termina a sua época de produção. “Este ano comecei a produzir em junho. Atrasei o máximo que pude para perceber se íamos ter ventos fortes como no ano passado”, altura em que a produção ficou "aquém" das suas necessidades.

Salmarim
Ricardo Bernardo

Ingrediente obrigatório na cozinha

Com “pouco mais de 20 anos em Portugal e de 50 em França”, a flor de sal “é um produto que só começou a ser valorizado recentemente”, admite. Hoje, a da Salmarim é presença obrigatória nas cozinhas de grandes ícones da gastronomia em Portugal, como Alexandre Silva, Hans Neuner, José Avillez, Rui Paula, Henrique Mouro, Renato Cunha e Noélia Jerónimo, entre outros. Mas também em restaurantes de cunho mais tradicional e nas cozinhas de casa.

À venda online ou em lojas especializadas, muito ligadas ao turismo – “o turista paga de uma forma diferente”, confessa –, a Salmarim (Salina do Moinho das Meias, Castro Marim. Tel. 966922437) tem disponíveis versões aromatizadas como a flor de sal piri-piri, a flor de sal com alcaparras e limão, a flor de sal mediterrânica e a flor de sal aromatizada com orégãos e salsa. Para breve está previsto o lançamento de outros produtos.

Ricardo Bernardo

Em Portugal, para além de Castro Marim, a flor de sal conta com certificação DOP em mais duas regiões: Tavira, também no Algarve, e Rio Maior, com a particularidade de ser extraída de uma mina de salgema. Com qualidade reconhecida registam-se ainda a flor de sal produzida em Aveiro e na Figueira da Foz. A Flor de Sal de Castro Marim pode ser aromatizada com recurso a fumagem natural, misturas de especiarias e/ou ervas aromáticas e com vinho licoroso, sendo depois acondicionados em recipientes destinados à venda ao consumidor final.

Flor de sal

Usar a flor de sal

Rica em minerais úteis e fonte natural de ferro, zinco, magnésio, iodo, flúor, sódio, cálcio, potássio e cobre, a flor de sal é uma alternativa mais saudável ao sal refinado, por não sofrer qualquer processamento ou refinação posterior à recolha. Alternativa ao sal refinado, ainda assim, o consumo diário não deve exceder 1 colher de chá, ou seja, o equivalente a cerca de 4 a 6 g. Pode ser usada como tempero nos alimentos, mas não deve ser levada ao fogo que retira a textura crocante. É excelente para temperar saladas ou adicionar aos alimentos no final da confeção. Por ter um sabor mais concentrado permite usar uma quantidade pequena.

Ricardo Bernardo

“Da terra à mesa” é um projeto Boa Cama Boa Mesa que dá a conhecer os produtos portugueses a partir de histórias inspiradoras e de sucesso, desde a produção até ao consumidor, em casa ou no restaurante.

A sustentabilidade social, ambiental e económica na agricultura e nas zonas rurais são linhas orientadoras da PAC - Política Agrícola Comum que, em Portugal, tem como objetivos principais valorizar a pequena e média agricultura, apostar na sustentabilidade do desenvolvimento rural, promover o investimento e o rejuvenescimento no setor agrícola a a transição climática no período 2023-2027.

Tem dúvidas, sugestões ou críticas? Envie-me um e-mail: clubeexpresso@expresso.impresa.pt

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