&conomia à 2ª

Plano? Acabar com a burguesia

A passada semana foi, mais uma vez, fértil em casos, mas parca em soluções. Ou seja, tudo na mesma, com muita parra e pouca uva.

O país trancado em casa, a burguesia em teletrabalho, o Governo a culpar a burguesia porque ousou sair de casa no Natal, quando não foram capazes de dizer que afinal sair de casa no Natal não seria uma brilhante ideia. Tudo isto podia ser cómico, não fosse trágico. Todos os que morreram e aqueles que ainda sofrem nas unidades de cuidados intensivos deveriam colocar certos discursos políticos em perspectiva, porém isso não seria a política à portuguesa, aquela que temos, não a que merecemos.

No meio disto, correu furiosamente pelo Whatsapp um suposto plano para o desconfinamento. Era só suposto, fake news. Plano que é bom, esse nem vê-lo. Aliás, até o Primeiro-Ministro fez uma comunicação ao país para dizer que vai comunicar ao país daqui a quinze dias o plano. Previsibilidade e gradualismo terão de esperar mais um pouco pelo “arguto espírito de planeamento” do actual Governo.

No meio deste drama, soluções à la carte. Ataque cerrado a uma classe média que está confinada, em casa, obrigada a cumprir o seu dever geral de recolhimento, mas a trabalhar ou pelo menos tentando desesperadamente fazê-lo. Muitos com filhos. Muitos em puro stress, muitos com a saúde mental a rebentar. Claro que isto não se pode comparar às dificuldades de quem tem negócios fechados e de quem está desempregado. E este ponto de solidariedade é importante. Mas o ponto é o oposto. O caminho é o oposto. Existe, hoje em dia, muita falta de sensibilidade social. Sobretudo de quem olha para a economia apenas como um exercício matemático, uma singela folha de Excel. Não é. A economia tem uma forte componente social. Tem que ter. Não há modelo económico que resista a uma pandemia. Ficou provado à saciedade. Mas sobretudo não há economia, ou uma democracia digna desse nome, sem uma classe média pujante, que paga impostos, sem esmagar ou expropriar os ricos, que consome, mas, sobretudo, retira da pobreza quem não tem trabalho. Esta é, de uma forma muito simplista, a força motriz da economia.

Já chega desta conversa dos bons e dos maus, de maniqueísmos e de moralismos bacocos. Do apontar o dedo ao vizinho. A inveja é um mal nacional que corrói o sentimento de comunidade nacional, de pertença e de solidariedade. Há um provérbio que resume bem este insidioso sentimento “Nunca o invejoso medrou nem ao pé dele quem morou”.

Para quando olharmos para todos com respeito? O Estado não chega para tudo. Mas o Estado só tem meios se existir classe média, com o mínimo de “buracos” e escapatórias na legislação fiscal para os mais ricos e ardilosos indivíduos ou empresas (fechar todos é difícil como prova a falta de consenso europeu para a tributação de rendimentos de capitais), a contribuir a cada ordenado e a cada compra.

Não, não podemos taxar ainda mais quem trabalha ou procurar retirar os dividendos de quem não os perdeu. Podemos isso sim, gerir melhor e sobretudo, apoiar, nesta fase, quem precisa. Sem perder de vista aqueles que se eximem a pagar os impostos devidos, pois não são apenas os apoios mal atribuídos que pesam no Orçamento de Estado, do lado da despesa, é também a receita perdida graças à criatividade de fiscalistas, gestores e administradores. É tempo de abrir os cordões à bolsa. Mais do que salivar por impostos e taxas, olhem para a Bazuca da Europa com noção e realismo. Olhem para o que a nossa economia precisa. Bom investimento, diversificação sectorial e mais valor acrescentado com mais conhecimento e menos betão. Precisamos de projectos produtivos, não precisamos de novas entradas na lista de elefantes brancos e de malparado. É preciso que os fundos cheguem a mais gente e não a quem tem bons contactos, aos que se mexem nos corredores pouco iluminados do poder. Não ataquem a classe média. Não carreguem mais peso em quem leva este país às costas. É que as costas dos actuais já não aguentam com muito mais carga inútil.

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