O Governo veio, agora, abordar a possibilidade de conceder apoio a 100% aos pais que estão com os filhos em casa, em regime de teletrabalho e telescola.
Acho que este tema tem impacto na vida real de milhares de famílias. É bom fazer uma pequena introdução antes de ir ao tema principal.
Este tema não está ao mesmo nível do ritmo de vida difícil que muitos profissionais de saúde enfrentam, apesar da descida do número de contágios as Unidades de Cuidados Intensivos ainda estão sob pressão. Se há algo que esta pandemia nos veio demonstrar é que, esses profissionais de saúde precisam de ser mais valorizados, não chega bater palmas, para lá de termos todos cuidados para evitar a transmissão do vírus, há que recompensar quem passa longos dias e más noites a cuidar dos que mais precisam de cuidados de saúde. Também não está ao nível de muitos outros sectores de actividade que não podem parar sob pena de o país não avançar.
Feita esta referência, que considero justa e imprescindível, devo dizer que o Governo esteve bem neste ponto. É um exercício tremendamente difícil conciliar trabalho, mesmo que em teletrabalho, com os filhos em casa. E é difícil, sobretudo pelas crianças. Os adultos, com todo o respeito, são adultos. Sofrem, obviamente. Passam por dificuldades. No entanto, os impactos destes tempos são brutais nas nossas crianças. Essa era uma discussão que gostaria de ver ter algum tempo de antena. Como vamos dar resposta a este tempo perdido? Não tenho outra qualificação para este ano. Foi mais um ano escolar perdido. E o impacto na educação das nossas crianças, na sua capacidade de aprendizagem, mas também na vertente de socialização é de natureza imprevisível. Não, a telescola não substitui a escola, o diálogo e a experiência da comunidade escolar. Pode, a espaços, ajudar. Não é um modelo de futuro. Lamento. Uma coisa é o teletrabalho. Outra, bem diferente, é a telescola. As crianças precisam de aprender, precisam de copiar, ver exemplos dos amigos, conhecer outras crianças, ter os docentes como farol do conhecimento e como exemplos. Quantos de nós não foram influenciados no seu trajecto de vida por professores marcantes, por aqueles que nos incutiram o gosto de aprender, mas também a exigência e o rigor?
A discussão que deveríamos estar a ter deveria ser como vamos compensar as crianças que estão privadas de todo um percurso escolar normal. Seja em forma de calendários, seja em forma de futuras formações complementares. Acho que é perceptível para todos que as aulas online são como meros remendos. Que a avaliação, em casa, não será, certamente, a mais justa. O ensino precisa de rigor, de mérito. Passagens administrativas não são soluções. Por isso, os próximos calendários lectivos devem ser muito bem pensados, encurtados no Inverno e alargados no Estio, ajustando-se aos ciclos de contágio da pandemia.
Tudo isto já foi dito, sobretudo por pessoas bem mais qualificadas que eu. No entanto, conciliar reuniões por Zoom ou Teams, passar horas em frente a um computador com as crianças seja em modo telescola, seja sem escola, é fazer perigar a atenção, o devido acompanhamento e a diversão aos nossos filhos.
Chega, por isso, tarde, o apoio do Governo. Mas, mais vale tarde do que nunca. Espero, obviamente, que este apoio a 100% para pais, mesmo que em regime alternado, mesmo que seja apenas um (acho justo), não seja uma mera manobra de gestão de percepção pública em que vem anunciado, mas que na próxima semana, logo desaparece qual balão ao vento, com o começo do desconfinamento. Se for esse o caso, então que esta medida fique para futuros confinamentos. Então que se passe a medida efectiva e não apenas simbólica ou mero marketing político.
O rendimento dos pais não pode afectar as entidades empregadoras, que já de si enfrentam enormes dificuldades comerciais, financeiras e de futuro. Como tal não pode afectar também, talvez de forma irremediável, a vida das crianças. Sem escolas, as crianças precisam de atenção, precisam de acompanhamento. Devemos isso aos nossos filhos.
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