Quando a crise aperta é comum ouvirmos gritar pelo Estado. Basta ligarmos a televisão ou lermos os jornais. Qualquer que seja o sector de actividade. Uma fábrica, um restaurante até o futebol. Temos exemplos para todos os níveis e sectores de actividade. Todos clamam pelo Estado. Com autoridade. Mais, com obrigatoriedade, quase, e muitas vezes é, exigência.
Pode ser um caso de desemprego, pode ser a falência de uma empresa, pode ser por razões de doença.
É ao Estado que se pede. Sem fazer contas, sem olhar a meios. O Estado deve ajudar. Mas quem é o Estado? Como se financia o Estado? E como pode o Estado ajudar quando é chamado a intervir?
O Estado somos nós. Todos. Sem excepção. Quer dizer, com excepção de quem foge às suas responsabilidades, sobretudo as fiscais.
No entanto, só há Estado se existir economia. Se existir iniciativa privada e consumo. Se existir emprego. Se existirem empresas. Tudo ligado. Tudo interligado, esta é uma relação inseparável.
É na dicotomia: Estado vs Iniciativa Privada que estão as grandes clivagens ideológicas no panorama político e partidário.
Esta pandemia veio exigir mais do Estado. Por isso, quem defende mais intervenção estatal sentiu-se estribado na crise para apontar o dedo a quem defende um maior enfoque na iniciativa privada. Errado. Totalmente errado. O Estado, que absorve muito do que produzimos, está no meio das nossas vidas diárias, nos pontos mais comezinhos. Do pão ao café, da compra ou renda de casa ao vencimento. O Estado existe para suprir as falhas de mercado. Mas também para apoiar quem realmente precisa.
Vemos hoje, em contexto de crise de saúde pública, a exigência de pagar layoffs. Esta era uma ideia lá longe. Existia, mas não era uma prática comum. Hoje, estamos, enquanto Estado, a pagar 300 milhões de euros mês em layoffs. A pagar boa parte dos vencimentos de pessoas que não podem trabalhar. Para ajudar as pessoas e para dar um apoio (precioso) a muitas e muitas empresas com solvabilidade, mas com a tesouraria a bater no fundo.
É o Estado a dizer presente. Claro que não poderíamos enfrentar uma pandemia desta dimensão sem Estado. A ideia de que o mercado conseguiria dar resposta a tantos e tantos desafios, sobretudo a uma crise económica e social tão profunda, caiu por terra, fazem dessa mesma ideia de um mundo sem Estado, um mundo impossível de se organizar para combater a doença que invadiu as nossas vidas. É, pois, importante encontrar o tal meio termo, o equilíbrio. Encontrar o bom senso. Não acredito num Estado em tudo. Não pode ser e está mais do que provado que não funciona e não nos traz, contribuintes e cidadãos, mais-valias. Como se percebe até na questão do sector da saúde. Bem visível nos números disponíveis hoje em dia. Não existe Serviço Nacional de Saúde. Existe, isso sim, um Sistema Nacional de Saúde. Esqueçam a ideia de que o SNS chega e sobra para cuidar de todos os portugueses. Não chega. E não chega, porque apesar de ter extraordinários profissionais de saúde, não é gerido com a precisão e qualidade que a gestão privada impõe. Bem sei que os universos abrangidos e a diversidade de doenças não é igual, contudo a diferença na alocação de recursos, ao nível das unidades hospitalares, e a eficiência e rapidez de decisão do sector privado são óbvios pontos fortes, que muito teriam ajudado a um melhor planeamento na gestão da crise pandémica que estamos a sofrer.
Portanto, perante o desafio que temos pela frente, nunca fez tanto sentido lutar por uma resposta social democrata. Uma resposta que inclua. Que tenha a sensibilidade para apoiar quem realmente precisa e de retirar os apoios a quem consegue ludibriar o Estado. Também acontece. E é preciso afirmar que quem recebe apoio do Estado de forma indevida está a retirar recursos que fazem falta. Se me é permitida a ousadia, depois de ter sido Centeno, gostava de ter visto como seria a gestão do Ministério da Saúde com o mais pragmático Adalberto Campos Fernandes ao invés da muito ideológica Marta Temido, beneficiária de protecção política extra no Governo e à Esquerda.
Mas quero voltar ao ponto essencial. O Estado somos nós, os cidadãos e contribuintes. Nós com os nossos impostos confiamos, em quem elegemos, para fazer a melhor administração dos nossos recursos. Recursos que não esticam, que são escassos e que por isso devem ser bem usados. Por isso, os apoios devem ser dados, mas não despejados sem critério ou vigilância, neste tempo que vivemos. A Comissão Europeia já deu luz verde a que os Estados-membros gastem. Esqueçam o défice. Gastem. Mas atenção, muita atenção. Gastar não significa desperdiçar, distribuir como se os recursos caíssem do céu. Não significa arranjar esquemas para gastar, sobretudo com a “desculpa” das sobras. As vacinas que sobram são disso exemplo. Há pobreza hoje em dia. São muitos os portugueses a passar mal. Desesperados. Sem esperança. Com medo. São muitos os sectores completamente devastados, sem perspectivas de ter amanhã, mesmo depois do confinamento terminar. Sectores que, num país que vive essencialmente do turismo, estão a rebentar com a míngua de vendas. Não pode existir qualquer esquema, qualquer desvio, em benefício dos suspeitos do costume, no uso dos recursos do Estado. É uma exigência que todos nós, contribuintes, fazemos. Chega de brincarem com o nosso dinheiro, ele está muito escasso.
O Estado serve para dar a mão a quem precisa, não para que se encostem.
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